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terça-feira, 2 de julho de 2013

Numa remota ilha francesa, uma busca obsessiva por avião pioneiro

Dois aviadores franceses haviam conseguido, ao que parece, realizar o primeiro voo praticamente inimaginável entre Paris e Nova York, e em 10 de maio de 1927, jornais de toda a França proclamaram "o triunfo das asas francesas" e a " idade de ouro da aviação francesa".

"Nungesser e Coli conseguiram", declarou La Presse, indo tão longe a ponto de detalhar o seu desembarque do mar em New York Harbor e os "gritos que se erguiam dos navios que os cercavam."

Esses primeiros relatos precipitados foram provados falsos. Charles Nungesser, um aristocrata audacioso e ás da pilotagem francesa, e François Coli, um marinheiro caolho e ex-soldado de infantaria, não tinham chegado a Nova York. Seu desajeitado biplano monomotor, L'Oiseau Blanc, o Pássaro Branco, nunca foi encontrado.

Eles desapareceram "como fantasmas da meia-noite", escreveu Charles Lindbergh, o norte-americano que alguns dias depois voou de Nova York a Paris. Acreditava-se que os franceses haviam caído no Canal da Mancha, ou talvez no Atlântico, ou em algum lugar entre Newfoundland e Maine.

Seu desaparecimento, considerado um dos grandes mistérios da aviação, inspirou décadas de formulação de hipóteses.

Um número cada vez maior de provas, entretanto, sugere que os aviadores colidiram com a minúscula Saint-Pierre, uma elevação escarpada de rochas cobertas de líquen, casas quadradas de cores vivas a cerca de 16 quilômetros de Newfoundland. É a teoria defendida por Bernard Decré, um obsessivo e irritável francês septuagenário que dedicou os últimos cinco anos a uma busca em tempo integral pelo Oiseau Blanc.

"Eu sempre me sentava no fundo da sala de aula, desenhando navios e aviões – isso não mudou, na verdade", disse Decré, 73 e aposentado, que de fato continua desenhando e espera "reajustar a história da aviação".

"Nós só queremos reconhecer que eles realizaram uma travessia fantástica", disse ele. Um voo sem paradas de Paris a Newfoundland teria sido o primeiro entre a Europa continental e a América do Norte, e a primeira travessia do Atlântico do leste para o oeste.

Às 5h17 de 8 de maio de 1927, carregado com 3.800 litros de combustível – mal e mal o que a travessia de 5.790 quilômetros supostamente exigia – o Oiseau Blanc, feito de madeira e lona, atravessou lentamente a pista de grama em Le Bourget, próxima a Paris. Sentados lado a lado no cockpit aberto, os aviadores levavam consigo pouco mais do que peixe enlatado, bananas e rum, preocupados com o peso do avião; eles não tinham rádio, e o trem de pouso foi descartado logo após a decolagem.

Em Manhattan, milhares haviam se reunido para aguardar a chegada do avião, informaram os jornais. Um pouso na água havia sido planejado, ao lado da Estátua da Liberdade.

"Eles de fato precisavam do vento a favor durante todo o trajeto para conseguir chegar", diz Decré. "Mas esses caras eram apostadores."

Assim como Lindbergh, os dois aviadores competiam pelo Prêmio Orteig, uma recompensa de US$ 25 mil para o primeiro voo sem paradas de Nova York até Paris ou vice-versa.

Decré acredita que os aviadores franceses foram forçados fora de seu curso por tempestades acima de Newfoundland. Com pouco combustível depois de cerca de 35 horas de voo, os homens tentaram um fatídico pouso no mar de Saint-Pierre, defende ele, em meio a uma densa neblina no final da manhã.

Um marinheiro experiente – ele fundou o Tour de France à la Voile, uma grande regata a vela da França – e ex-executivo das comunicações, Decré começou sua pesquisa em 2007 depois de ler um relato do escritor Clive Cussler sobre sua própria busca pelo avião em Maine. Decré desde então vasculhou arquivos na França, Canadá e Washington e viajou várias vezes a Saint-Pierre, onde uma pequena equipe de técnicos varreu o fundo do mar em busca dos restos do Oiseau Blanc.

Ele encontrou registros de arquivo mostrando que 13 pessoas viram ou ouviram o avião em direção ao sul ao longo da costa leste da Newfoundland na manhã de 9 de maio, junto com pelo menos quatro moradores de Saint-Pierre. Um pescador local, que já morreu, costumava dizer que havia ouvido a colisão de um avião e os gritos de socorro, diz Decré. Moradores e marinheiros relataram destroços na área logo após o desaparecimento do Oiseau Blanc, e diz-se que outros pescadores descobriram destroços da aeronave ao longo dos anos.

A busca de Decré é a primeira a se concentrar em Saint-Pierre, que, apesar de sua localização, na verdade pertence à França. Esta é uma distinção de significativa importância durante a Proibição nos Estados Unidos, de 1920 a 1933, quando a ilha se tornou um grande entreposto para contrabandistas de álcool. Comerciantes de Montreal, por exemplo, podiam enviar legalmente bebidas para Saint-Pierre; lanchas então levavam o contrabando para o nordeste dos EUA.

Foi sugerido também que o Oiseau Blanc havia sido derrubado pela Guarda Costeira dos EUA, que teria confundido os aviadores franceses com contrabandistas.

Quer isso seja verdade ou não, a Guarda Costeira pode se mostrar essencial para encontrar o avião. Nos Arquivos Nacionais em Washington, Decré descobriu um telegrama da Guarda Costeira, de agosto de 1927, descrevendo o que pareciam ser destroços da asa de um biplano flutuando pela costa da Virgínia.

"Sugere-se que podem ser os destroços do avião de Nungesser Coli", diz o telegrama.

Esse avistamento estaria de acordo com uma colisão na costa de Saint-Pierre, calcula Decré. Ele suspeita que a Guarda Costeira retirou os destroços da água e que eles estão esquecidos num depósito em algum lugar.

"Temos certeza que eles têm um pedaço da asa", disse ele.

Apesar disso, Decré esteve em Saint-Pierre mais uma vez no mês passado, desta vez equipado com um poderoso magnetômetro e uma unidade de sonar multidirecional. (Com apoio das autoridades locais, do governo francês e especialmente da Safran, a companhia aeroespacial e de defesa, o orçamento de Decré este ano chegou a US$ 200 mil.) Entretanto, as três semanas de buscas em cerca de 55 metros de profundidade não deram em nada.

Ao contrário dos jornais franceses da época, Decré ainda não cantou vitória, mas no mês passado ele organizou uma cerimônia com coroas de flores em homenagem aos aviadores. O neto de Lindbergh, Erik, compareceu. "Antes de meu avô atravessar o Atlântico, as pessoas que pilotavam aviões eram consideradas mambembes ou valentões – eram loucos", disse Lindbergh. Nungesser e Coli podem não ter sucedido em sua travessia, disse ele, mas seu desafio deve ser celebrado.

Ainda assim, Decré quer encontrar os restos mortais e tem intenção de continuar sua busca.

Não há tanta certeza se seus patrocinadores o seguirão. A população local também continua cética. Embora admirem o entusiasmo de Decré, muitos moradores dizem não estar convencidos de que ele encontrará os destroços do avião, mesmo que eles estejam lá.

"É como tentar pegar água com uma rede de pesca", disse Serge Perrin, 56, limpando vieiras no convés de seu barco. "Nós nunca ouvimos ninguém falar do Oiseau Blanc até ele aparecer", acrescentou Perrin, sugerindo que alguns moradores locais talvez tenham inventado as memórias sobre o avião – conscientemente ou não – depois de ler sobre o acidente.

"Há quem acredite nele e quem não – é como o Papai Noel", disse Amandine Pinault, repórter da televisão local. "Em todo caso, é uma bela história."

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