quarta-feira, 24 de julho de 2013
General argentino escolhido por Kirchner tem passado ligado à ditadura
Ainda se lembram no país daquele 24 de março de 2004, quando o presidente Néstor Kirchner ordenou ao tenente general Roberto Bendini que retirasse os retratos dos ditadores Rafael Videla e Reynaldo Bignone, pendurados no Colégio Militar de El Palomar. Naquela manhã, Kirchner declarou de forma solene: "Quero deixar claro que o terrorismo de Estado é uma das formas mais injustificáveis e sangrentas que podem caber a uma sociedade viver".
Sobre essa ideia se desenhou toda uma política de memória e reparo diante das violações dos direitos humanos. Mas o governo se viu agora atacado em seu flanco mais sensível desde 27 de junho passado, quando a presidente Cristina Fernández de Kirchner renovou a cúpula militar e designou para a chefia do exército o general César Gerardo del Corazón de Jesús Milani, acusado de supostos crimes cometidos durante à ditadura.
Pairam sobre Milani duas acusações. Por um lado, o ex-preso político Ramón Alfredo Olivera declarou no relatório da Comissão Provincial de Direitos Humanos da província de La Rioja, elaborado em 1984, que Milani o açoitou durante um interrogatório efetuado na sede judicial em 1977. Acusou-o igualmente de ter invadido seu domicílio para deter seu pai, finalmente desaparecido.
Por outro lado, os familiares do soldado Alberto Ledo, suposto secretário pessoal de Milani, o acusam de ser responsável por seu desaparecimento, ocorrido em 1976 na província de Tucumán, norte do país. A denúncia de Olivera foi arquivada, mas a de Alberto Ledo continua aberta, embora nunca se tenha citado Milani.
O chefe do estado-maior se apresentou por iniciativa própria na quarta-feira, 17 de julho, diante de um tribunal da província de La Rioja e negou todas as acusações. Mas não conseguiu apagar o fogo.
Os grandes aliados do governo na luta contra as violações de direitos humanos não levantaram vozes contra Milani. Nem as Mães, nem as Avós da Praça de Maio, nem o Centro de Estudos Legais e Sociais (Cels), fundação presidida pelo jornalista Horacio Verbitsky, diretor de "Página 12", se opuseram em princípio a sua nomeação.
Mas na manhã de segunda-feira (22), quando o Senado debatia as promoções da nova cúpula militar - passo anterior à votação na Câmara de Deputados no próximo dia 31 -, o Cels apresentou um relatório no qual impugnava a promoção.
O organismo esclareceu que havia continuado suas investigações e pôde reunir informação que vincula Milani a "fatos que serão investigados no âmbito de causas judiciais por crimes de lesa-humanidade".
O Cels não é uma fundação qualquer na Argentina. Nascido em 1979 com o objetivo de denunciar as violações de direitos humanos, seus relatórios são solicitados pelo Congresso argentino e suas conclusões costumam ser levadas muito a sério. A carta que o Cels enviou na segunda-feira fez o bloco de senadores kirchneristas adiar por 24 horas os debates sobre a nomeação de Milani.
Com essa decisão do Senado, o jornalista Jorge Lanata, apresentador e diretor do programa Jornalismo para Todos, voltou a marcar a agenda política do país. Já o fez em abril passado, quando conseguiu que dois arrependidos denunciassem em seu programa a lavagem de dinheiro por parte de Lázaro Báez, empresário amigo de Néstor Kirchner.
No domingo, 14 de julho, voltou a marcar o passo quando dedicou um programa inteiro ao passado de Milani. Além de abordar o tema das duas acusações que pesam sobre o general, o jornalista questionou a forma como o chefe do exército conseguiu seu patrimônio. "As contas de Milani não fecham. O patrimônio de Milani é impossível de justificar. Desde que tinha 19 anos ganha um salário de exército. Nunca teve outra receita. Sua mulher é dona de casa, também não declara renda. Mas Milani tem uma capacidade de poupança invejável...", salientou.
A reportagem indicava que Milani comprou em 2010 uma casa de 1.150 m2 em um exclusivo bairro de Buenos Aires. "Disse que pagou por ela 1,5 milhão de pesos - 200 mil euros -, soma desproporcional à renda do general - 1.943 euros mensais, segundo os números divulgados no programa -, mas uma pechincha se levarmos em conta o valor de mercado da propriedade."
Devido à transmissão do programa, a deputada de oposição Elisa Carrió denunciou Milani por suposto enriquecimento ilícito. "Milani sempre fez parte das Forças Armadas e em 2010 declarou uma fortuna de 1.494.610 pesos, que em 2011 cresceu para 1.785.889, apesar de seu salário ter passado de 14 mil [1.943 euros] em 2010 para 15 mil em 2011", indica a denúncia.
A oposição também criticou Milani quando, ao prestar juramento de seu cargo, expressou a intenção de acompanhar "o projeto nacional", coisa que foi interpretada como o projeto do governo, uma confissão partidária imprópria do comandante em chefe do exército.
O governo, por sua vez, até agora demonstrou um apoio incondicional ao novo chefe do exército. "Esta não é a primeira ascensão de Milani em sua carreira militar. Houve outras três nas quais sua promoção foi aprovada pelo Senado sem que gerasse todo o debate que houve nesta circunstância", indicou na sexta-feira o ministro da Defesa, Agustín Rossi.
"Em 2001 foi promovido a coronel; em 2007 a general de brigada e em 2010 a general de divisão, e em nenhuma dessas instâncias provocou um debate como o que está sendo gerado atualmente", salientou.
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Quem Imaginaria que os argentinos estariam nessa situação heim, Forças armadas totalmente defasadas, fico com ate uma certa do deles pois gostaria que a argentina rivaliza-se com o Brasil para Incentivar as Industrias a produzirem mais armamentos
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