Quase todos os dias, e às vezes duas vezes por dia, um avião teleguiado desarmado dos EUA decola de um aeródromo militar isolado em Niamey, iniciando uma missão de vigilância de dez horas ou mais para rastrear combatentes afiliados à Al Qaeda e outros militantes no vizinho Mali.
Os dois MQ-9 Reapers que ficam baseados aqui transmitem vídeo e dados de outros sensores para analistas norte-americanos que trabalham com comandantes franceses, que dizem que a inteligência aérea tem sido fundamental para o seu sucesso durante os últimos quatro meses para expulsar jihadistas de um grande refúgio no deserto do norte do Mali.
A base dos teleguiados, estabelecida em fevereiro e administrada por uma equipe de cerca de 120 membros da Força Aérea, é a mais recente indicação da prioridade que a África se tornou para os EUA num momento em que o país está diminuindo sua presença no Afeganistão e o presidente Barack Obama estabeleceu como meta abandonar a guerra global contra o terrorismo em prol de um esforço mais direcionado. Isso faz parte de um novo modelo de combate ao terrorismo, uma estratégia concebida para ajudar as forças locais – e, neste caso, um aliado europeu – a lutar contra os militantes para que as tropas dos EUA não precisem fazê-lo.
Mas essa abordagem tem limitações num continente tão grande quanto a África, onde a escassez de recursos é crônica e os parceiros regionais são fracos. E a introdução dos aviões teleguiados, mesmo os desarmados, corre o risco de criar o mesmo tipo de reação que minou os esforços dos EUA no Paquistão e provocou indignação em muitas partes do mundo.
O aumento no número de ameaças potenciais na região ficou claro para Obama durante sua visita à África, na semana passada.
"Precisamos, na África, e não apenas no Senegal, mas em toda a África, de ter capacidade militar para resolver este problema, mas precisamos de treinamento, precisamos de materiais, precisamos de inteligência", disse o presidente do Senegal, Macky Sall, após uma reunião com Obama em Dakar para discutir os temores de uma crescente ameaça islâmica violenta no deserto do Saara, de acordo com a Reuters.
Os militares dos EUA, no entanto, têm só uma base permanente na África, no Djibuti, a mais de 4.830 quilômetros do Mali, bem como uma constelação de pequenas pistas de pouso, em locais que incluem a Etiópia e Burkina Faso, para missões de vigilância de aviões teleguiados ou aviões de turbinas projetados para se parecer com aeronaves civis. O desafio dos EUA, que têm pouca experiência na África, é um difícil.
"Na África, os EUA estão diante de um ambiente cada vez mais complexo em termos de segurança e, portanto, mais perigoso", disse Michael R. Shurkin, ex-analista da Agência Central de Inteligência, que agora está na Rand Corporation. "Respostas eficazes, além disso, exigem um conhecimento excelente sobre as populações locais e suas políticas, o tipo de entendimento que frequentemente escapa ao governo e aos militares dos EUA".
E as ameaças que o Níger enfrenta são típicas daquelas que preocupam Sall. O governo do presidente Mahamadou Issoufou está lutando para conter um fluxo de insurgentes através das fronteiras pouco seguras do Níger com o Mali, a Nigéria e a Líbia. Em 23 de maio, terroristas usando carros-bombas suicidas atacaram um complexo militar do Níger em Agadez e uma empresa francesa de urânio em Arlit, ambos no norte do país.
Para os especialistas em África, a possibilidade de que os teleguiados ainda causarão uma reação negativa continua sendo real, especialmente se os radicais islâmicos levantarem a questão.
"A preocupação seria a de que grande parte da reação se daria através de canais que não podemos perceber facilmente, como as mesquitas salafistas", disse Alexis Arieff, analista da África para o Serviço de Pesquisa do Congresso em Washington.
Os EUA reconheceram o envio de teleguiados em fevereiro – inicialmente de uma única aeronave Predator e depois de Reapers mais rápidos e equipados – mas, desde então, não divulgaram praticamente nenhuma outra informação sobre as suas missões, presumivelmente para evitar chamar mais atenção pública. O Pentágono negou um pedido para entrevistar as tripulações da Força Aérea, especialistas em logística e manutenção, e pessoal de segurança enviados para o campo aéreo militar em frente ao aeroporto comercial na capital do Níger.
As autoridades francesas, norte-americanas e do Níger têm influência sobre as missões diárias dos teleguiados, disse um funcionário do Pentágono, mas é evidente que a prioridade tem sido apoiar a campanha francesa no Mali. Os EUA já fizeram mais de 200 missões em apoio aos franceses, com a possibilidade expandir suas operações para apoiar uma força da ONU composta em grande parte por tropas africanas que assumiram o controle da missão de paz no Mali em 1 º de julho.
Em alguns dos combates mais ferozes entre as forças lideradas pelos francesas e os combatentes islâmicos no início de março, os aviões sobrevoaram a região montanhosa acidentada do Mali, dando às forças aliadas informações de alvos para ataques aéreos. Autoridades francesas e africanas disseram que talvez 700 pessoas, de um total de cerca de 2 mil insurgentes, foram mortos nos combates.
Apesar das vantagens, J. Peter Pham, diretor do Centro para a África do Conselho do Atlântico em Washington, disse que os franceses não têm usado totalmente a informação dos teleguiados. As forças francesas, temendo ataques de mísseis terra-ar roubados dos arsenais líbios, reduziram as missões de helicópteros ao Mali, e em vez disso empregam caças-bombardeiros, que voam mais alto porém são menos precisos, para os ataques aéreos, disse Pham. Mas uma autoridade francesa disse que a França não tem realizado ataques aéreos há semanas e minimizou a ameaça de mísseis. O funcionário disse que as informações de inteligência ainda estão sendo usadas para apoiar as operações terrestres.
As missões norte-americanas não são livres de incidentes. Em 9 de abril, um dos teleguiados caiu numa parte remota do norte do Mali, presumivelmente por causa de uma falha mecânica. "Foi perda total", disse um oficial da Força Aérea sobre os destroços.
Funcionários do Pentágono dizem que as missões de teleguiados continuarão mesmo enquanto a França reduz a sua força no Mali de 3.500 para cerca de mil soldados até o final do ano, "porque vemos uma necessidade contínua de coleta de informações naquela região", disse Amanda Dory, vice-secretária assistente de defesa para a África.
A França ficou tão impressionada com os Reapers que pretende comprar pelo menos duas das aeronaves dos EUA. "Eles foram absolutamente necessários para nós, porque não temos aviões teleguiados suficientes para proteger nossas tropas e ter uma visibilidade permanente sobre o que está acontecendo em solo", disse um funcionário francês de Defesa em Paris.
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