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sexta-feira, 5 de julho de 2013

Militares egípcios reafirmam fidelidade aos seus privilégios

Pela maior parte do ano que passou no poder, o presidente Mohammed Morsi e a Irmandade Muçulmana pensaram que tinham domesticado os militares do Egito, destituindo os principais generais e fechando um acordo com os seus sucessores que impedia que as Forças Armadas fossem submetidas à supervisão civil.
O acordo entrou em colapso nesta semana.

Com tanques e soldados nas ruas e em torno do palácio presidencial, o mais alto oficial das Forças Armadas, o general Abdul-Fattah El-Sissi, nem sequer pronunciou o nome de Morsi quando anunciou que o presidente havia sido deposto, e a Constituição, suspensa.
E subitamente, Morsi, assim como seu antecessor imediato, Hosni Mubarak, descobriu o fato duradouro que os militares, acima de tudo, cuidam de si mesmos. Não seguem ideologias, mas são intensamente politizados.

"Os líderes militares do Egito não são ideologicamente comprometidos com uma coisa ou com outra, mas acreditam que têm seu lugar na ordem política", disse Steven A. Cook, especialista em Oriente Médio do Conselho de Relações Exteriores. "Eles se dispõem a fechar acordos com praticamente qualquer pessoa, e este, claramente, não deu certo".

Os militares nunca foram uma força em prol da democracia, apesar de justificarem sua intervenção na política como uma atitude a serviço da vontade do povo. Eles têm um objetivo principal, segundo os analistas: a preservação da estabilidade nacional e da sua esfera intocável de privilégios dentro do Estado egípcio.

Com milhões de pessoas nas ruas se opondo ao presidente, e com a Irmandade sempre tentando consolidar a sua autoridade, os militares decidiram que o tempo da presidência de Morsi tinha terminado.
"Mantivemos a disciplina e temos as armas", disse um oficial na quarta-feira (03/7), falando em condição de anonimato porque não estava autorizado a comentar. "É isso que há no mercado agora. Você vê alguma outra instituição sólida em cena?"

O rosto que representou as Forças Armadas foi o de Sissi, um oficial de aparência despreocupada, com o peito cheio de medalhas, uma boina apertada sobre a testa, quando agarrou o púlpito com as duas mãos e se dirigiu à sua nação, insistindo que o objetivo da ação era o de restaurar a unidade nacional. Ele minimizou o domínio dos militares ao instalar um governante interino.

Mas suas palavras de reconciliação e cura não conseguiram alterar a fria realidade do momento.

Os militares, pela segunda vez em dois anos e meio, estavam derrubando o líder civil da nação –mas, desta vez, o líder havia sido eleito de forma livre e justa. A remoção confirmou o estatuto das Forças Armadas como a instituição mais poderosa do Egito desde o golpe de seis décadas atrás, que derrubou o rei Farouq e levou à ascensão de Gamal Abdel Nasser.

"Havia uma esperança que haveria um consenso nacional para definir um roteiro para o futuro e promover a confiança, a segurança e a estabilidade desta nação, de uma forma que atendesse a suas ambições e aspirações", disse Sissi em seu discurso transmitido pela televisão.

O Egito tem a maior força militar permanente no mundo árabe, estimada em 450 mil soldados. A maioria são recrutas e oficiais de baixo escalão que têm pouca oportunidade de crescimento.

Durante décadas, no entanto, suas dezenas de milhares de oficiais de elite protegeram zelosamente seu posto privilegiado. Eles vivem como uma classe à parte, com seus próprios clubes sociais, hotéis, hospitais, parques e outros benefícios financiados pelo Estado.

Muitos também enriqueceram graças a contratos com o governo e negócios facilitados por suas posições. Trata-se, em alguns aspectos, de uma casta brâmane hereditária, nas quais os filhos seguem as carreiras dos pais e todos vivem dentro de um círculo social fechado.

"É um grupo muito unido", disse Robert Springborg, professor da Escola de Pós-Graduação Naval em Monterey, Califórnia, e especialista nas Forças Armadas egípcias. "Eles tendem a pensar da mesma forma e são uma força a ser reconhecida porque, além da Irmandade, são a única instituição realmente coesa no país".

Por seis décadas antes da revolução de 2011, homens das Forças Armadas governaram o Egito. Na maior parte de suas quase três décadas no poder, Mubarak, que foi comandante da Aeronáutica, em grande parte deixou os militares operarem livremente. Mas depois de 18 dias de uma revolta em massa em 2011 contra seu governo, os militares decidiram que o acordo estava cancelado. A estabilidade foi ameaçada. O ministro da defesa de Mubarak, marechal Mohamed Hussein Tantawi, conhecido como o "poodle de Mubarak", foi derrubado e preso.

Por mais de um ano, os militares governaram o Egito -e aprenderam a lição que, aparentemente, orienta suas decisões atuais. Governar deixou os seus oficiais vulneráveis à indignação pública diante dos problemas econômicos, sociais e políticos. O período foi marcado pelo declínio econômico e pela inquietação nas ruas.

O lema de protesto mais comum tornou-se "Abaixo, abaixo o governo militar!"

Michael Wahid Hanna, pesquisador da Century Foundation, disse que os militares não queriam mais nada além de voltar para o seu quartel.

"Eles não gostam de ser os atores principais, e eles não gostam de ser a polícia", disse ele. "O que eles querem mesmo é que as coisas se acalmem".

Embora muitos militares desconfiassem do perfil islâmico de Morsi -a Irmandade era banida antes da revolução- eles viram sua posse, em junho de 2012, como uma saída bem-vinda da responsabilidade de governar. Morsi também concordou com duas exigências fundamentais: anular a possibilidade de julgamento de oficiais militares por crimes da era Mubarak após a revolução e aprovar uma Constituição que excluísse o orçamento militar de supervisão parlamentar.

Isso, e a noção que a Irmandade pelo menos seria competente e disciplinada em sua administração, pareceu dar aos militares a segurança que o grupo islâmico seria um parceiro digno. Essa visão mudou com a evolução das crises internas. A economia continuou a afundar, e a escassez de combustível e os cortes de energia causaram revolta nas ruas.

Morsi também tomou uma série de medidas que os militares achavam que comprometiam a segurança nacional. Ele participou de um comício em que os clérigos muçulmanos pediam jihad na Síria, aumentando os temores de uma nova geração de egípcios radiciais, voltando para casa de uma guerra estrangeira.

Quando se dirigiu à nação na quarta-feira, Sissi disse que os militares buscaram conversar com o presidente por meses para tentar resolver a crise, mas sua proposta foi recusada repetidamente. Ao nomear um juiz pouco conhecido como líder interino, os militares não deixaram claro qual será sua autoridade ou se ainda vão controlar o país nos bastidores.

Analistas disseram que a oposição era ingênua em festejar o retorno dos militares ao poder, como se fosse um passo na transição pós-revolucionária para a democracia.

"Os liberais e os revolucionários rapidamente pulam na cama com os militares. Mas eles não são seus amigos", disse Cook, do Conselho de Relações Exteriores. "A coisa mais importante do ponto de vista dos militares é preservar seu lugar como fonte do poder e sua influência no sistema".

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