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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Ser jornalista na Síria é uma roleta-russa, diz repórter


Dois jornalistas morreram na Síria nesta quarta-feira (22), durante o ataque ao bairro de Baba Amr, na cidade rebelde de Homs. Entre eles, um francês, Rémi Ochlik, foi morto no centro de imprensa, visado por tiros de foguetes desde o início da manhã. Ele é o sétimo jornalista a morrer na Síria desde o início do conflito. Patrick Chauvel, fotojornalista e correspondente de guerra há 40 anos, cobriu os acontecimentos das revoluções árabes. Ele esteva presente na Líbia, em março de 2011, ao mesmo tempo em que Rémi Ochlik. Ele fala sobre os riscos do fotojornalismo e a escalada da violência dos conflitos árabes desde janeiro de 2011.

Marie Colvin perdeu sua vida recentemente devido a um bombardeiro da Força Aérea Síria


Le Monde: Por que tantos jovens fotógrafos estão presentes desde o início para cobrir os acontecimentos das revoluções árabes?
Patrick Chauvel: Tudo começou com a Tunísia. A viagem não era muito cara, então muitos jovens puderam ir com suas próprias economias. Não havia necessidade de credencial, nem ser de ser conhecido, qualquer fotojornalista podia decidir embarcar na aventura. Diferentemente do Afeganistão e do Iraque, não era necessário se identificar, pois os rebeldes líbios eram totalmente desorganizados. Era uma verdadeira oportunidade para esses jovens profissionais se revelarem, como durante o conflito na Iugoslávia, onde novos talentos se destacaram.

Devíamos ser cerca de 50, na Líbia. Foi bom ver todos aqueles jovens chegando. Eles estavam cheios de coragem, com vontade e espírito de aventura. Era formidável vê-los trabalhando e fazendo perguntas sobre a profissão. Eles se questionavam sobre a validade da causa, se a França estava fazendo bem de intervir militarmente. Muitas questões sobre o futuro econômico da profissão, com o desenvolvimento da internet, sobretudo para os jornalistas independentes. Gente boa.

Mas também foram muitos deles que vieram sem preparo, com a inconsequência própria da idade, sem noção de primeiros socorros em caso de ferimento, nem bons reflexos de sobrevivência. Quando tiros partem em todas as direções, de nada serve se esconder atrás de um carro, é como papel. A única saída é correr.

Le Monde: Em que a Síria é diferente dos outros conflitos árabes?
Chauvel: Até então era uma guerra, mas com conflitos não muito violentos. A Síria, em compensação, é um verdadeiro conflito. Na Tunísia, um único fotógrafo foi morto, Lucas Mebrouk Dolega, um jovem francês de 32 anos. Já no Egito foi muito perigoso. Quem se deparasse sozinho com um policial, era levado para uma ruela afastada e espancado. Teve histórias terríveis, como a das duas jornalistas (Caroline Sinz e Mona Eltahawy) que foram estupradas no meio da multidão. Mas nunca se falou em execução sumária.

Na Líbia, foi uma guerra com momentos perigosos. Lá, houve tiros de morteiro, com trajetória totalmente aleatória. Cinco jornalistas foram mortos lá. A Síria é um nível acima ainda. As autoridades sírias não querem que imagens saiam do país, então eles não hesitam em prender jornalistas, em torturá-los, ou até executá-los.

Le Monde: Em que condições os jornalistas trabalham, em especial na Síria?
Chauvel: Não é simples entrar na Síria. É preciso atravessar a fronteira sob arames farpados, com atiradores de elite patrulhando, e depois percorrer quilômetros de moto ou a cavalo, como o jornalista do “New Yorker” que morreu após uma crise de asma, há pouco tempo. Além disso, faz frio, não tem nada, nem mesmo eletricidade, o que complica demais o envio de fotos. Elas precisam passar pela fronteira do jeito que der, como quando ainda havia filme. Ademais, lá o exército sírio não quer a presença da imprensa. Em janeiro, quando Gilles (Jacquier) foi morto, isso desanimou todo mundo.

Há também a questão do dinheiro. Lembro que, quando fui para a Líbia, consegui juntar 1.800 euros de dois jornais diferentes. Minhas 18 horas de táxi para chegar até a zona de combate me custaram 1.700 euros, então quando cheguei ao local eu só tinha 100 euros para sobreviver. Felizmente, uma vez no local há uma solidariedade forte entre jornalistas. Se alguém tem como pagar um carro com um motorista, ele leva os outros consigo.

Mas a gente trabalha sozinho. No front, tentamos ficar sozinhos para não fazer as mesmas imagens que os outros. Estamos lá para trabalhar, é só quando se chega ao hotel que brincamos e conversamos. Eu lembro que uma vez um jovem jornalista me procurou e perguntou “como fazer para permanecer em segurança?”. Eu lhe respondi: “fique em Paris”.

Le Monde: Mas, apesar de tudo, sempre existe a vontade de viajar novamente?
Chauvel: Sim, não é uma profissão, é um modo de vida. Hoje, quando vejo o que esses sírios estão sofrendo, só tenho uma vontade: ir até lá para contar a história deles. É como se eles estivessem se afogando e pedindo por socorro. Não ir para lá é quase como negar auxílio a uma pessoa em perigo.

A morte desses jornalistas (Rémi Ochlik e Marie Colvin) é muito triste. Rémi era um jovem com um grande futuro pela frente, sincero. Mas eles morreram fazendo seu trabalho, ninguém errou. Quando se está em um conflito armado com civis, é uma roleta russa. O importante é continuar enviando jornalistas para a Síria e contar histórias.

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