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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Milicianos temem ações pró-Gaddafi no aniversário da revolução líbia


"Veja isto!" O comerciante Fahmi observa desconcertado a escola para adultos no bairro de Berka, em Benghazi. De um dia para o outro, uma milícia se apoderou do edifício pelo simples procedimento de destruir o muro da entrada. "Fazem o que lhes dá vontade. Mas o que se consideram? Um novo exército?"

Na verdade, são. Derrubada a ditadura de Muammar Gaddafi depois de uma guerra de nove meses e 30 mil mortos, reinam as milícias na Líbia. Entre cem e 300, segundo as fontes. Mais de 125 mil homens armados.

Com uma polícia dizimada e insignificante, e um exército debilitado por Gaddafi - que criou suas próprias forças paramilitares - e depois arrasado pela Otan, essas milícias civis controlam a segurança, mas atuam sem prestar contas e sem limites além dos impostos por seus chefes - ou outras milícias rivais. São a principal garantia para a transição líbia. Mas também a principal ameaça.

Em Benghazi, a cada entardecer os "zowar" (revolucionários), como preferem chamar-se, tomam posições nos cruzamentos e praças da cidade, com seus fuzis Kalashnikov e caminhonetes com metralhadoras antiaéreas. Prestes a se completar o primeiro aniversário da revolta, em 17 de fevereiro próximo, a capital do leste da Líbia, berço da rebelião, está em alerta. E não só pelos quinta-colunistas de Gaddafi. As novas autoridades, desgastadas pelas divisões internas e os permanentes questionamentos a sua legitimidade, temem, sobretudo os protestos dos cidadãos, cada vez mais impacientes diante da falta de resultados.

"Acendemos a luz vermelha. As pessoas têm reivindicações, e há quem possa usar isso para criar problemas", explica Suleiman, ex-químico e hoje dirigente da Brigada 17 de Fevereiro. Já em dezembro passado houve manifestações para exigir mais transparência, e a sede do Conselho Nacional de Transição (CNT), uma espécie de governo interino, foi atacada com granadas.

Em Benghazi, as principais milícias constituíram a União de Forças Revolucionárias, que reúne 12 mil homens distribuídos em cerca de 40 "katibas", ou brigadas, do leste do país. A coalizão prometeu obediência às autoridades e se coordena com o exército e a polícia. Não faltam grupos que andam livremente, como a brigada islâmica Líbia al Hurra. No sábado (11), sem encomendar a ninguém, dinamitaram a estátua de Gamal Abdel Nasser, o líder pan-arábico egípcio admirado por Gaddafi. Apesar de tudo, as armas e os tiroteios desapareceram das ruas.

"Em Benghazi as coisas caminham mais ou menos bem. Mas Trípoli é um desastre", comenta o general Aden ben Omran. As milícias que libertaram a capital, vindas de outras cidades, impuseram a lei da selva. Os choques entre as poderosas brigadas de Misrata e Zintan (que controlam o aeroporto) foram frequentes nos últimos meses. A pilhagem e os roubos cansaram a população, que exige em vão a retirada dos grupos armados.

Os confrontos se sucedem também nas montanhas ocidentais. Em um jogo de equilíbrios políticos, visto com receio de Benghazi, o governo provisório nomeou à frente da Defesa e do Interior chefes milicianos de Zintan e Misrata, respectivamente.
"Desarmar as milícias será um problema. É preciso um plano para integrá-las ao exército e à polícia e submetê-las à disciplina", indica o general Ben Omran. "Mas o governo interino não tem margem de manobra."

Além do mercado negro e dos arsenais de Gaddafi, as milícias encontraram outras vias para se abastecer. "Catar envia armas para grupos de Benghazi e Trípoli, sobretudo os islâmicos. Atua de costas para o CNT", afirma Ben Omran.

As milícias protegem 85% das refinarias e dos campos de petróleo do país, que conta com as maiores reservas da África. Também atuam como polícia, na área política e judiciária. Eles  investigam e detêm, e controlam cerca de 60 centros onde vivem aproximadamente 8.500 prisioneiros, segundo cálculos da ONU. As denúncias de torturas se multiplicam. O próprio Saif al Islam, filho e herdeiro de Gaddafi, está nas mãos do pessoal de Zintan, o que dá a esse grupo um poder inusitado.

Por enquanto, nenhuma milícia está disposta a deixar as armas. Lutaram com empenho contra o regime, enterraram os mortos e querem garantir que não haja recuo. "Protegemos este país e seu governo. Se nos retirarmos, o pessoal de Gaddafi voltará. Há grupos muito ativos no sul, na fronteira com o Níger e a Argélia", explica Abduljawal el Badin, que passou vários anos nas prisões de Gaddafi e hoje dirige os 3 mil homens da Brigada Omar Mokhtar. "Meu fuzil ainda está quente. E voltarei a usá-lo se for necessário", afirma com orgulho.

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