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segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Serviço de inteligência da Alemanha Ocidental protegeu fugitivo nazista

O coronel Walter Rauff durante
sua prisão na Itália, em 1945
A caçada ao assassino de massas levou os investigadores literalmente até o fim do mundo; a Punta Arenas, no Chile, uma das cidades mais ao sul do planeta. Mas quando Walter Rauff foi preso pela política local em 5 de dezembro de 1962, o ex-coronel da SS já havia sido alertado. Seu empregador, o Serviço de Inteligência Federal da Alemanha (BND), havia o instruído para destruir todos os documentos e instrumentos de espionagem que pudessem revelar que ele era um agente.


O BND assumiu uma parte das tarifas legais de Rauff, como se ele fosse um velho amigo. Em troca, o ex-nazista deixou claro que nunca “revelaria” sua relação com o serviço.

“Nunca” é uma palavra forte, e há jornalistas que afirmam que Rauff os contou sobre seu trabalho como agente nos anos 50. Entretanto, não havia provas claras até hoje – pelo menos até o final da semana passada, quando o BND divulgou mais de uma dúzia de documentos relacionados a Rauff. Eles fazem parte de cerca de 900 páginas de documentos que logo estarão disponíveis ao público nos Arquivos Federais da Alemanha na cidade de Koblenz, no oeste do país.

A divulgação faz parte de uma nova abordagem política que o presidente do BND, Ernst Uhrlau, está pondo em prática para entrar em termos com o passado da agência. A ligação entre o BND e Rauff é um capítulo particularmente obscuro dessa história.

Preparando Rauff para sua prisão
Em 1961, um mandato foi emitido para a prisão do ex-funcionário, nascido numa família de classe média em Köthen, perto da cidade de Dessau, no leste da Alemanha, por acusações de assassinar mais de 90 mil pessoas. Mas isso não impediu o BND de treinar Rauff em sua sede em Pullach, perto de Munique, no início de 1962 e de, alguns meses depois, prepará-lo para a prisão no Chile.

Rauff trabalhou no Escritório Central de Segurança do Reich, o nervo central do terror da SS, onde ele liderava o grupo que desenvolveu o chamado vagão de gás em 1941. No fim das contas, ele esteve encarregado de mais de 20 câmaras de gás móveis, que eram caminhões equipados com um corpo em formato de caixa que tinha cerca de seis metros de comprimento e 1,70 metro de altura. Uma mangueira da grossura de um braço lançava a fumaça do escapamento do motor para o interior do veículo, através de uma abertura escondida no piso, para sufocar as vítimas.

O mecanismo foi usado pela primeira vez para matar prisioneiros do campo de concentração de Sachenhausen no outono de 1941. Nos meses seguintes, a SS matou mais presos com as câmaras de gás móveis na cidade de Riga, na Látvia, no campo de concentração de Chelmno na Polônia e no campo de Poltava na Ucrânia. De acordo com o historiador Mathias Beer, Rauff coordenou as ações. Mais tarde, na Itália, ele cometeu mais crimes como comandante de uma unidade de aliados.

O BND sabia da história de Rauff quando o recrutou em 1958. De acordo com um memorando posterior, a agência sabia com quem estava lidando “desde o início”, porque “Rauff não fez segredo sobre seu passado”. Entretanto, o BND supostamente ignorava o envolvimento do oficial da SS em assassinatos.

A entrada de Rauff no BND ocorreu no mesmo momento em que o Pullah estava expandindo sua rede de agentes no mundo todo, e o homem de família amável era visto como um especialista em inteligência bastante viajado. Depois do fim da guerra, ele escapou de uma prisão aliada na Itália e foi para a Síria. De acordo com registros da CIA, ele tentou construir um serviço de inteligência sírio baseado no modelo da Gestapo. Depois ele fugiu para o Equador e eventualmente se estabeleceu no Chile.

Um velho conhecido nazista
Quando o BND o abordou na América do Sul, Rauff concordou em cooperar imediatamente. Sua disposição para trabalhar com a agência provavelmente tinha algo a ver com o fato de que o agente do BND que o recrutou era um velho conhecido do Escritório Central de Segurança do Reich (RSHA).

O homem era Rudolf Oebsger-Röder, que tinha um doutorado em jornalismo e já havia sido um oficial fanático da SS. Depois da guerra, ele passou alguns anos trabalhando como jornalista para o “Deutsche Soldaten Zeitung” e até para a “Spiegel”. Ele também trabalhou como informante, ajudando a sede do BND em Pullach a identificar possíveis agentes.

Oebsger-Röder era encarregado de um escritório de campo do BND em 1958. Rauff foi provavelmente um dos primeiros agentes que ele recrutou em seu novo cargo. Ele recebeu o nome de Enrico Gomez e, a partir daí, viajou por toda a região para a agência. Ele recebeu um salário alto de mais de 70 mil marcos alemães enquanto trabalhou como agente.

Mas o BND aparentemente não estava muito satisfeito com os resultados. O principal trabalho de Rauff era obter informações sobre a Cuba de Fidel Castro, mas como observou um funcionário do BND, a Alemanha não conseguiu “abrir pontos de acesso na direção de Cuba”. Em fevereiro de 1962, seu salário mensal foi até cortado pela metade por causa de seu “fraco desempenho”.

Nesse ponto, investigadores da Alemanha Ocidental já estavam atrás de Rauff. Um pedido de extradição levou à sua prisão no final daquele ano.

Recrutamento “absolutamente inescrupuloso”
De acordo com os registros do BND que estão sendo divulgados ao público, Rauff acreditava seriamente que era inocente, o que pode explicar por que ele não fugiu, embora ele soubesse que estava prestes a ser preso. Ou talvez ele tivesse meramente feito sua lição de casa, porque no Chile o crime de assassinato prescreve depois de 15 anos. Em outras palavras, Rauff não poderia ser extraditado por seus crimes nazistas, e então deixou a prisão na capital Santiago como um homem livre depois de alguns meses.

Se a informação dos registros divulgados pelo BND estiver completa, isso marca o fim de uma cooperação entre o serviço de inteligência e Rauff, que o BND não tenta justificar hoje. O recrutamento de Rauff foi “absolutamente inescrupuloso, tanto política quanto moralmente”, conclui Bodo Hechelhammer, diretor do Grupo de Pesquisa História e Força Tarefa do BND. Hechelhammer diz que é lamentável que a agência tenha empregado criminosos nazistas como Rauff.

Rauff morreu em 1984, aos 77 anos, depois de ter vivido o resto de sua vida tranquilamente em Santiago do Chile. Em seu enterro, alguns dos presentes teriam levantado seus braços direitos e gritaram “Heil Hitler”. Alguns até gritaram “Heil Rauff”.

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