Kenneth Pollack |
Der Spiegel: Washington está incrédulo diante da conspiração de assassinato contra o embaixador saudita nos EUA, alegadamente pelo Irã. Até as autoridades norte-americanas disseram que parece um filme de Hollywood. Esse cenário faz sentido para o senhor?
Pollack:Parece impressionante, até surreal. Diante da gravidade das acusações e do absurdo da história, é importante manter certo grau de ceticismo. Devemos ter em mente que o governo iraniano recebe a culpa por muitas coisas, nem todas verdadeiras, e o governo dos EUA faz muitas acusações, e nem todas se provam corretas.
Der Spiegel: O presidente Barack Obama não parece ter a menor dúvida. Pelo contrário, ele parece determinado em seus esforços para punir o Irã por meio de duras sanções. Ele também disse que todas as opções estão na mesa, o que é uma ameaça militar indireta.
Pollack: Este é o governo Obama, e não o governo Bush, e eles compreenderam que o mundo todo seria cauteloso após a ausência de armas de destruição em massa no Iraque. Eles estão fazendo isso de uma perspectiva da lei, portanto não são acusações de inteligência. São agentes da polícia americana dizendo: “Temos evidências”, e as evidências parecem ser bastante impressionantes.
Der Spiegel: Ainda assim, uma série de questões continua sem resposta. O governo norte-americano sabe mais do que o resto do mundo?
Pollack:Provavelmente. Não vimos os telegramas e certamente não sei o que as autoridades têm em termos de telefonemas. Apenas estão dizendo que têm essas coisas e, novamente, não duvido que tenham. Elas não fazem esse tipo de afirmativa se não tiverem evidências que se sustentem na justiça.
Der Spiegel: Teerã refutou as acusações, chamando-as de campanha de difamação. Enquanto isso, especialistas ocidentais disseram que o Irã nunca tinha planejado um ataque em solo americano e certamente nunca tinha trabalhado com figuras tão duvidosas quanto as deste caso, como traficantes mexicanos e um vendedor de carros usados texano.
Pollack:Mas sempre há uma primeira vez. Com relação à falta de capricho, os iranianos tendem a ser muito, muito profissionais, mas também podem ser muito amadores. Se esta era a primeira vez que estavam operando em solo americano, provavelmente não teriam os recursos ou uma boa rede de contatos para fazer da forma que gostariam.
Der Spiegel: Mas o governo iraniano aprovaria uma operação tão atrapalhada?
Pollack:Assumindo que esta operação veio do governo iraniano, não sabemos quem no governo de fato teria dado a autorização. Sabemos que operações terroristas iranianas algumas vezes são autorizadas, e outras, não. No caso dos assassinatos do restaurante Mykonos, em 1992 em Berlim (quando três líderes da oposição curda iraniana e um tradutor foram mortos), ficou claro que o governo havia dado autorização. Mas em 2009, de acordo com as informações disponíveis, a Guarda Revolucionária prendeu os marinheiros britânicos por conta própria. Esta também seria uma operação na qual qualquer ocidental perguntaria: “Por que não obtiveram aprovação dos níveis mais altos para fazer isso?”
Der Spiegel: Autorizado ou não, qual seria o interesse para o Irã do assassinato do embaixador da Arábia Saudita?
Pollack:Podemos especular que seria uma mensagem tanto aos EUA quanto à Arábia Saudita, dizendo: “Se vocês continuarem nos perseguindo, vamos persegui-los também”. Lembre-se, a perspectiva iraniana é que os EUA, a Arábia Saudita, Israel e, até certo ponto, a UE, estão travando um tipo de guerra contra eles. (O Líder Supremo Iraniano Aiatolá Ali) Khamenei sempre chama de “guerra não declarada”. Há, contudo, o ângulo das sanções. Há alguém matando os cientistas nucleares iranianos. Alguém levou o vírus Stuxnet (para as instalações nucleares iranianas). Acho que os iranianos assumem que os EUA, de alguma forma estavam envolvidos. Provavelmente assumem que os sauditas também, mesmo que indiretamente. Então, pode ser alguém no regime iraniano esteja tentando enviar uma mensagem aos EUA e à Arábia Saudita, ou seja, que haverá consequências, um preço a ser pago por perseguir o Irã dessa forma.
Der Spiegel: Será que o Irã sentiu-se encorajado a atacar, diante do estado debilitado interno dos EUA?
Pollack:O Irã tem um dos sistemas políticos mais fragmentados da Terra. Suspeito que diferentes líderes iranianos têm opiniões divergentes. Certamente acredito que há uma série de líderes iranianos, em particular na Guarda Revolucionária, que acreditam que estão travando uma forma de guerra com os EUA, com a Arábia Saudita e com Israel, e eu acredito que querem nos fazer recuar. Também tenho certeza que estão preocupados com a Síria e tenho certeza que estão preocupados com algumas coisas na Primavera Árabe. Mas o que também vejo neles é uma sensação de triunfo. Eles leem a Primavera Árabe como antiamericana e eles veem como benéfica a eles.
Der Spiegel: Em sua resposta as acusações, o Líder Supremo do Irã, Khamenei, acusou os EUA de tentarem distrair a atenção do público de seus próprios problemas, da crise econômica em particular.
Pollack:Pode ser que os iranianos estejam vendo o governo Obama focado nas questões internas e observando como está saindo do Iraque e Afeganistão rapidamente. Claramente não há um ambiente para outra guerra no Oriente Médio aqui nos EUA. Pode ser que a liderança iraniana esteja pensando: “Os americanos não parecem estar em posição de retaliarem contra nós, e isso nos dá mais liberdade de ação”.
Der Spiegel: Ainda assim, alguns suspeitam do momento das acusações do governo Obama, dizendo que talvez ele queira usar o episódio para se mostrar forte em política externa contra os oponentes republicanos inexperientes.
Pollack: Isso não faz o menor sentido. A verdade é que os republicanos vão usar isso para fazer Obama parecer fraco, porque ele não vai retaliar militarmente, mesmo quando os iranianos tentaram montar uma tentativa de assassinato terrorista em solo americano.
Der Spiegel: O presidente fez campanha por duras sanções. Mas a Rússia e a China provavelmente vão bloquear tais medidas no Conselho de Segurança da ONU. Mais sanções não são apenas ameaças vazias?
Pollack: Se o governo puder provar à comunidade internacional que o Irã realmente está por trás disso, então certamente acho que isso ajudará a convencer os países relutantes. Quais seriam essas sanções ainda é uma questão em aberto, pois há muita fadiga em relação a isso. Sanções às exportações de petróleo iranianas podem se tornar muito dolorosas para a população do país, e isso deve ser evitado. Eu preferiria ver essas medidas repressivas aplicadas à área de investimento no Irã.
Der Spiegel: A Arábia Saudita ameaçou retaliar por causa do complô. O príncipe Turki Al-Faisal disse que “alguém no Irã terá que pagar”. O senhor teme uma nova crise na região?
Pollack:Certamente não vai ajudar a situação no Oriente Médio. Suspeito que os sauditas entendem isso tudo como uma escalação da atitude contra eles e não acho que os sauditas questionam que o governo iraniano estava por trás do episódio. Acho que haverá um aumento dos esforços sauditas contra o Irã. Eles sem dúvida vão colocar mais dinheiro em grupos anti-Irã que apoiam na região, possivelmente dentro do Iraque. O Oriente Médio já está em convulsão, e a última coisa que precisamos é de dois dos Estados mais importantes da região se atracando mais do que já estão, mas acho que este incidente vai empurrar as coisas nessa direção.
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