Black Hawks rumam turcos para o Iraque |
Cerca de cem guerrilheiros curdos atacaram de forma simultânea na madrugada de terça-feira (18) oito postos do exército turco na província de Hakkari, sudeste do país. O saldo final da chacina foi de 26 soldados mortos e 18 feridos. O ataque, um dos mais mortíferos lançados pelo Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK na sigla em curdo) desde que se levantou em armas em 1984, é um claro sinal de aviso para os que previam o declínio desse grupo armado.
A ofensiva, lançada da fronteira do Iraque, atingiu os povoados de Cukurca e Yuksekova, que sofreram até o amanhecer ataques com granadas de morteiro. Com as primeiras luzes os guerrilheiros fugiram para território iraquiano, perseguidos por forças do exército turco, que, segundo a imprensa local, acabaram na quarta-feira (19) com a vida de 15 desses guerrilheiros.
O PKK - considerado um grupo terrorista pelos Estados Unidos e a UE - conseguiu um golpe certeiro. Desde as eleições de 12 de junho, seus ataques tinham se multiplicado, mas também seus erros. A escalada de violência na qual morreram cem membros das forças de segurança, também causou diversas baixas civis. Nessa mesma terça-feira (18) uma bomba em uma estrada da província de Bitlis acabou com a vida de seis soldados, mas também com a de três civis, entre eles uma menina de 4 anos. Os danos colaterais foram excessivos, inclusive para uma guerrilha que conta com o apoio de grande parte dos 15 milhões de curdos do país.
Mas muitos deles já demonstram estar contra o grupo. Alguns, segundo a escritora curda Bejan Matur, nasceram em cidades como Istambul e não se sentem representados por guerrilheiros nas montanhas. Um exemplo disso é a campanha "Guerrilheiro: não mate, não morra por mim", iniciada por quatro jovens ativistas curdos na Internet para colher assinaturas a favor do fim da violência.
Não são os únicos que discordam da guerrilha. O Partido da Paz e Democracia (BDP), única formação curda com representação parlamentar - e que muitos consideram o braço político do PKK -, condenou neste verão um ataque contra quatro mulheres. No desta semana, a formação divulgou por meio de um comunicado sua "tristeza pela perda de vidas humanas", mas não houve palavras de condenação.
O Executivo turco não está disposto a buscar a paz sem antes dar uma punição aos violentos ataques. Foi o que reiterou na quarta-feira o primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan em uma entrevista coletiva. "Qualquer apoio implícito ou explícito aos terroristas, qualquer ajuda, tolerância ou indiferença aos ataques desumanos do PKK sentirá o peso do Estado turco", disse Erdogan, que teve de cancelar uma viagem oficial diante da gravidade da situação.
O aumento dos ataques ocorre exatamente quando o BDP aceitou participar dos trabalhos parlamentares, especialmente importantes agora que o Legislativo debate uma nova Constituição. A isto se acrescenta a escalada de detenções nas últimas semanas nas províncias curdas. Entre as centenas de presos há vários funcionários municipais eleitos, suspeitos de pertencer à União de Comunidades Curdas (KCK), uma organização englobada na órbita do PKK.
Justamente nessa semana se iniciava a primeira sessão no Parlamento sobre a nova Constituição, que poderia reconhecer alguns dos direitos que os curdos reivindicam, como o uso de sua língua nas escolas ou organismos oficiais. Segundo Erdogan, os trabalhos continuarão, assim como a incursão armada no norte do Iraque, que busca acabar com os últimos refúgios da guerrilha nas montanhas Kandil.
A comunidade internacional, por sua vez, condenou em bloco o ataque de terça-feira. O secretário da Otan, Anders Fogh Rasmussen, enviou um comunicado poucas horas depois do atentado. "Em nome da Otan, condeno os recentes ataques no sudeste da Turquia que mataram e feriram militares", disse.
O presidente dos EUA, Barack Obama, uniu-se às demonstrações de rejeição e qualificou o assalto de "atroz ataque terrorista". Assim mesmo a UE reiterou seu compromisso na luta contra o terrorismo. Catherine Ashton, coordenadora da Política Externa da UE, declarou que "nada justifica a violência indiscriminada".
No caso do PKK, nem um Curdistão turco autônomo nem o reconhecimento de direitos civis negados durante anos. Muitos curdos, com a esperança em uma nova Constituição, começaram a pensar o mesmo.
Três décadas de conflito
1984. O Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) lança uma guerrilha separatista no sudeste da Turquia.
1992. Cerca de 20 mil soldados turcos penetram em território iraquiano para desmantelar feudos do PKK.
1995. Nova grande ofensiva militar contra as forças curdas no norte do Iraque. Cerca de 35 mil soldados são mobilizados na operação.
1999. Fevereiro. O líder do PKK, Abdullah Ocalan, é detido no Quênia.
1999. Julho. Ocalan é condenado à morte. Mais tarde será prisão perpétua.
2003. Junho. Para se aproximar da UE, o Parlamento turco aprova leis que ampliam os direitos linguísticos curdos.
2004. Junho. A televisão pública turca transmite seu primeiro programa em curdo. Quatro ativistas curdos, entre eles um ex-deputado, são libertados.
2006. Abril. Uma dúzia de pessoas morrem em confrontos entre forças de segurança e manifestantes curdos em protestos no sudeste do país.
2006. Setembro. O PKK declara um cessar-fogo unilateral.
2011. Deterioração das relações. Várias ondas de detenções de ativistas curdos voltam a acender o estopim do conflito armado. Desde julho o PKK matou cerca de 50 militares turcos. Ancara aumenta a pressão militar.
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