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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Condoleezza Rice ameaçou se demitir por causa de Guantánamo, revela biografia

A ex-secretária de Estado dos EUA admite em suas memórias o erro que cometeu ao não prestar atenção imediata ao furacão Katrina. Revela detalhes de seus encontros com Gaddafi e Mubarak       

Condoleezza Rice

Pode ser que as memórias de Condoleezza Rice sejam na realidade as melhores que foram escritas até o momento sobre os anos da presidência de George W. Bush. Em mais de 700 páginas, a conselheira do 43º presidente dos EUA e depois secretária de Estado faz uma séria revisão da política externa de Bush e da estratégia de sua administração depois dos ataques terroristas de 11 de Setembro que moldaram seu mandato. No livro não há lugar para trechos autobiográficos da infância, adolescência ou juventude, com sonhos a realizar; tudo isso foi retratado por Rice, 56 anos, em um volume anterior. Suas memórias são pura política, gabinetes de Washington com muita tensão e confrontos entre seus companheiros de ministério.

"No Higher Honor. A Memoir of My Years in Washington" [Não há honra maior. Uma memória de meus anos em Washington] foi escrito com paixão mas sem raiva, sem buscar vingança ou necessidade de vilipendiar ninguém. É verdade que Rice deixa claro que entre ela e o ex-vice-presidente Dick Cheney - talvez o número 2 com maior poder na história da Casa Branca - e Donald Rumsfeld, secretário da Defesa, houve mais de um confronto, que se sentiu desautorizada e inclusive chegou a ameaçar - se é que se pode fazer isso - Bush de apresentar sua demissão - "Se algo assim voltar a acontecer, ou Gonzales [Al Gonzales, conselheiro jurídico de Bush e cérebro de Guantánamo] ou eu teremos de nos demitir", disse Rice a Bush quando soube que se havia decidido instaurar as famosas comissões militares.

Inteligente, altiva e refinada, Rice considera - e assim o escreve - que todos os problemas que pôde ter com seus colegas de gabinete foram puramente profissionais, nunca "pessoais", o que dá uma ingenuidade ao livro que raramente se viu em volumes anteriores de seus companheiros no poder.

Com publicação prevista para 1º de novembro, vários meios de comunicação americanos tiveram acesso ao livro e o dissecaram. Também extraíram algumas das opiniões que a secretária de Estado teve sobre mandatários estrangeiros e líderes políticos. Por exemplo, Rice escreve que o presidente do Sudão, Omar Hasan Al Bashir, parecia que "estava drogado"; que sentiu que precisava de "uma ducha" depois de apertar a mão do presidente do Líbano Emile Lahoud; ou lembra como Hosni Mubarak se opunha às reformas em seu país dizendo que os egípcios realmente precisavam era de "mão firme" e em nenhum caso "interferências estrangeiras".

A relação mais estranha Rice viveu com o recém-falecido presidente da Líbia, Muammar Gaddafi - relação unidirecional, é claro. Gaddafi sentia um fascínio mórbido pela secretária de Estado, que deixou fixado na composição de um vídeo com imagens da chefe da diplomacia americana e uma canção com o título "Flor Negra na Casa Branca". "Era muito estranho, mas nunca foi grosseiro", afirma Rice.

Também tem alguns lamentos, embora poucos. Rice considera um erro que os EUA não tenham ratificado o acordo climático de Kioto - "foi como demos um tiro no pé; e ter tirado uns dias livres quando o furacão Katrina - e a incompetência do governo - devastavam Nova Orleans. Rice viajou para Nova York no final de agosto de 2005 e se hospedou no Palace. Antes de sair para jantar e ver uma obra de teatro, ligou para o então secretário da Segurança Interna, Mike Chertoff, e lhe perguntou se havia algo que ela poderia fazer para ajudar na Luisiana. Ele disse que a chamaria se fosse necessário, e por isso Rice desligou, vestiu-se e foi ver um musical na Broadway.

"Na manhã seguinte fui fazer compras na loja Ferragamo", escreve Rice em suas memórias. Mas quando a secretária percebeu a magnitude da tragédia no sul dos EUA soube que havia se equivocado ao abandonar Washington. Chamou Bush e lhe comunicou que voltaria imediatamente. "Teria me dado bofetadas por ter estado tão cega", lembra Rice. "Eu era não só a secretária de Estado, como a pessoa de cor de mais alto cargo no governo e uma assessora chave do presidente." A grande maioria dos mais de 1.800 mortos por causa do Katrina era afro-americana. "Em quê estaria pensando?", Rice se recrimina.

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