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sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A arriscada construção do exército afegão

Oficial do Exército Americano instrui soldado do Exército Afegão

Neste finzinho de verão, o coronel A. Qudooz Ghani gosta de tomar seu chá diante do vasto canteiro de obras na base de Pol-e-Charkhi, na saída de Cabul. Sob seu olhar, a escola de blindados do Exército Nacional do Afeganistão (ENA) emerge de uma superfície poeirenta, um terreno no qual escombros militares enferrujavam desde a ocupação soviética. Em março de 2012, estabelecimentos de treinamento receberão 900 homens. Para eles, os americanos desembolsaram US$ 650 milhões (R$ 1,4 bilhão). Eles produzirão especialmente 500 veículos.

O coronel Qudooz estreou como chefe de pelotão. Esse pashtun combateu com os russos contra os mujahedins, e passou quatro anos na União Soviética. Esse elegante oficial, de bigode grisalho bem aparado, deixou o palácio presidencial de Hamid Karzai, cuja segurança ele garantia, para se dedicar à formação de novos oficiais do ENA. Ele comemora: “O que não era possível para nós vinte anos atrás, agora está se tornando possível. Estamos tentando construir um exército completo”.

O plano foi escrito pela Otan. A coalizão anunciou que em 2014 ela terá transferido a segurança do país aos afegãos. Um exército de 195 mil homens deve estar pronto até o verão de 2012. Dez anos após o início de sua intervenção no país, os americanos estão assumindo a maior parte desse esforço, inclusive os soldos. Na escola dos blindados, os instrutores, franceses e romenos – especialistas em tanques russos T-62 - , têm quatorze semanas para treinar um primeiro batalhão. Haverá sete deles. “É um programa do volume do exército francês, que precisaríamos de vinte anos para concluir em nossos padrões”, observa o tenente-coronel Stéphane T., adjunto do coronel Qudooz.

Paris, empenhada há vários anos nessa missão, chegou a começar a formar suboficiais em suas bases nos Emirados Árabes Unidos: 900 afegãos sairão delas em 2012. “O Afeganistão sabe o que a França viveu na Revolução, quando pegaram os primeiros que vieram para criar os marechais do Império. O problema é o ritmo”, observa o coronel Philipp Lejeune, chefe da missão de formação francesa.

Com as outras forças de segurança – comandos, serviços de inteligência, milícias, polícias nacionais e locais-, o Afeganistão e seus 30 milhões de habitantes logo contarão com 350 mil homens armados. Metade deles terão sido instruídos em três anos. Nunca nenhum exército no mundo teve um apoio tão considerável como esse. O exagero do esforço se mede pela pergunta que todos aqui levantam: com o tempo, quem assumirá o custo, sabendo que o país só cobre um terço de suas despesas civis e militares?

Nessa corrida, a Otan primeiramente se livrou dos talebans de batalhões de infantaria que sofreram cortes em poucas semanas. “Até aqui, tivemos a quantidade. Começamos a ter a qualidade”, explica um oficial francês. A partir de meados de 2012, a formação de aplicação dos oficiais afegãos se estenderá de quatro meses para doze.

Os capitães franceses que a controlam no local estão de acordo: esse novo exército é corajoso, combativo, reativo. Está progredindo, inegavelmente, e começa a planejar sozinho suas operações. Em Kapisa, a leste de Cabul, o ENA “aguentou bem” durante duros combates do verão contra os insurgentes. “Estamos fazendo grandes progressos, as coisas estão se acelerando”, acredita o coronel Adbullah Faqir Zaak, que observa os cadetes em exercício no Kaboul Military Training Center. “Porque temos energia para seguir adiante”. Mas esse oficial reconhece que ainda faltam muitos meios para a ambição demonstrada. Ele queria que os ocidentais permanecessem o maior tempo possível: “No dia em que os franceses nos deixarem, estaremos em perigo”.

Dificuldades imensas permanecem. Com exceção das unidades de elite, que os especialistas ocidentais consideram de bom nível, as forças afegãs sofrem de graves lacunas: analfabetismo, salários insuficientes, instrutores intermediários deficientes, deserções, tensões étnicas. As infiltrações talebans são um grande temor. “Nosso principal problema consiste em identificar as pessoas boas, em ter confiança em nossos recrutas”, confirma o coronel Qudooz.

O ENA ainda não tem apoio. O coronel Abdullah quer “armas pesadas, seria bom para o moral”. O exército não dispõe de nenhum dos meios que lhe permitiriam se manter a longo prazo: nem engenheiros, nem artilharia, nem aviação (a frota de helicópteros deverá estar pronta em 2016). Nem mesmo a logística, corroída pela corrupção: “Os afegãos têm material americano mas, em seis meses, não vimos chegar um único galão de combustível para fazê-lo funcionar”, conta um oficial francês.

A fragilidade da liderança política de Cabul pesa no futuro do jovem ENA. O presidente Karzai não se apropriou dessa nova ferramenta militar, constatam os especialistas. Depois de 2014, é grande o risco de ver o exército se romper e, por falta de coordenação, as diversas forças afegãs se fragmentarem. Permanece uma incógnita: será que os Estados Unidos manterão, como no Iraque, as funções de apoio às forças do país? Os contornos da parceria estratégica de longo prazo atualmente negociada com o país serão determinantes.

Para a pergunta sobre qual inimigo o novo exército combaterá nos próximos anos, o coronel Abdullah responde, varrendo o céu de Cabul com o olhar: “Há muitos inimigos no Afeganistão”.

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