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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Subúrbios populares e expansão do islamismo revelam a questão social na França


Em 2011, a Justiça francesa multou uma mulher muçulmana por vestir uma burca em público


Dissimulada pelo jargão econômico que tem invadido a campanha presidencial desde o início, a questão dos subúrbios populares e da expansão do islamismo na França brotou subitamente com as declarações do ministro do Interior. Segundo ele, "as civilizações, as práticas, as culturas, diante de nossos princípios republicanos, não são todas iguais". E como ilustração deu dois exemplos relacionados ao uso do véu integral ou niqab, defendido pelos salafistas, e às orações de rua na sexta-feira que Marine Le Pen havia comparado à invasão nazista.

A oposição denunciou uma “derrapagem controlada e perfeitamente intencional”, e até uma “conversa fiada para provocar uma espécie de ódio pelos muçulmanos”, em um balé cansativo e combinado onde a histeria de uns responde ao ocultamento de outros: mas na realidade é a questão social reprimida que, disfarçada de islamismo, está voltando para um debate central, o de nosso grande romance nacional, que é própria da eleição presidencial.

Mas, como observa a revista “Esprit” em sua última edição, nenhum candidato soube abordá-la com firmeza. Esse silêncio e essa cegueira sobre as principais questões de nosso dever cidadão são alimentados pelo cálculo milimétrico das estimativas eleitoralistas, no qual entrevistadores e assessores de comunicação – esses sofistas de nossa era – distorcem o discurso político em considerações políticas.

Por que esse debate desgastado passou de repente a ser provocado pela referência ao islamismo na França? Porque a expansão deste e as formas assumidas por certas manifestações dos grupos mais em ruptura com a República e seus valores comumente partilhados questionam a firmeza de nosso laço social e nossa capacidade integradora em um contexto de desemprego em massa nos subúrbios pobres. Eles questionam também a significação da laicidade, ou até desafiam a validade da promessa cívica.

Quando salafistas se estabelecem na sala de orações de uma zona urbana problemática onde metade dos jovens sem escolaridade está sem emprego, em um condomínio degradado onde ressurge a tuberculose, a medicação política não pode se limitar a tratar o sintoma, ela também precisa tratar a causa. Mas para além dessa constatação, uma tentação de recuo que não diz respeito somente a uma religião particularmente (mas não exclusivamente) praticada pelas populações mais pobres surge na França popular de 2012: as exacerbações identitárias fabricam ali comunidades fantasiadas e soldadas em uma rejeição ao outro – muçulmano, judeu, francês “de raiz” – às quais a Web 2.0 permite levar o delírio ao auge.

Ela se alimenta de um mal-estar social e de uma desesperança que também atingem o mundo dos pequenos vilarejos rurais, onde o voto na extrema direita e as conversões ao islamismo mais fundamentalista procedem de uma mesma lógica de ruptura e de uma busca de sentido às quais as dissertações políticas sobre a crise do euro não sabem mais responder.

Eles estão “indignados”. Mas como eles se indignam, para além da injunção que Stéphane Hessel popularizou com seus milhões de exemplares vendidos [do livro “Indignai-vos!”]? Se a promessa cívica não é mantida por um projeto que saiba casar, conduzir, escrever as palavras novas de nosso romance nacional, a balcanização das identidades antagônicas está nas páginas que o discurso diluído dessa campanha eleitoral deixa em branco. Entre nossos grandes relatos fundadores, houve uma integração social que transformou as origens étnicas e de classe, passou pelo compartilhamento da mesa e da cama – e que nós glorificamos em nossa gastronomia e nosso erotismo, que são o melhor de nosso patrimônio e fizeram nossa reputação universal.

Nas comunas cercadas de Seine-Saint-Denis, onde pesquisamos com a equipe do Instituto Montaigne em 2010 e 2011, o trabalho se tornou um luxo raro, onde a interação com a sociedade global depende dos descarregamentos de intermináveis transportes coletivos, foram inventadas fortalezas comunitárias onde a recente exacerbação do halal [costumes permitidos pelo islamismo] mais rígido tem aumentado o número de proibições, mantém as crianças longe das cantinas escolares e proíbe os casamentos mistos.

Esses mecanismos de defesa e de sobrevivência questionam nossa capacidade de fazer uma França se eles persistirem. Mas nada impede que eles sejam combatidos – contanto que se tenha coragem de lançar sobre a França de hoje, sobre as falhas sociais que provocam disparidades, e que a inanidade do debate política traduz como antagonismos manchados dos termos cultura ou civilização, o olhar brutal dos sociólogos que lavram o terreno e pegam os trens de subúrbio e outros.

Tomemos um exemplo: quantos deputados que vieram de meios populares nossa Assembleia Nacional, que representa e simboliza a nação, terá em junho? Quantos parlamentares saídos da periferia, nascidos franceses, educados aqui, e cujas famílias vieram há duas ou três gerações da África do Norte e da África Negra, sobretudo, participaram da reconstrução da França esgotada do pós-guerra e ali deixaram sua saúde?

No fim da guerra da Argélia em 1962, o general De Gaulle havia conduzido uma corajosa política de promoção das elites originadas dos franceses muçulmanos; as circunstâncias eram outras, mas não seria uma boa razão para se lembrar disso, sobretudo para aqueles que se inspiram em seu legado? É bom que nossos partidos políticos comecem a se certificar de que os bairros populares e a periferia sejam representados por seus moradores na próxima legislatura, pois sem isso os lamentos sobre a ascensão dos comunitarismos e o conflito de civilizações continuarão sendo lágrimas de crocodilo.

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