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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Mulheres assumem o poder no governo brasileiro


A nova presidente do Brasil, Dilma Rousseff, rapidamente saiu da sombra de seu carismático predecessor, Lula. Após um ano no cargo, ela é mais popular do que qualquer outro presidente nesta altura do mandato. Ela se cercou de mulheres poderosas, que agora estão dando as cartas em Brasília

Presidenta Dilma 
O epicentro do poder brasileiro pode ser encontrado no quarto andar do Palácio do Planalto, em Brasília, capital da nação. Garçons uniformizados elegantemente carregam bandejas de café pelos corredores do palácio presidencial; altas autoridades esperam nas antessalas, e os aparelhos de ar-condicionado trabalham nos escritórios.

A ministra do planejamento, Miriam Belchior, se apressa para um compromisso com a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, com quem ela discute um programa de investimento de bilhões de reais para combater a pobreza. No caminho, é cumprimentada por Ideli Salvatti, que administra as relações do governo com o Congresso. Dois andares abaixo, a secretária de imprensa, Helena Chagas, está falando ao telefone. No escritório da frente, várias mulheres estão revisando os jornais do dia.

Para todo lado que você olha nesse palácio de mármore branco, há ministras, assessoras, especialistas e subsecretárias do sexo feminino. Somente os garçons e os seguranças na entrada são homens. Graças à presidente Dilma Rousseff, tudo na sede do governo está firmemente nas mãos femininas.

Rousseff é a primeira chefe de Estado feminina do maior país da América Latina e nomeou mulheres para muitos dos cargos mais importantes de seu governo. Dez delas são ministras. Seu círculo mais próximo de assessores é composto de mulheres, com a exceção de um. Isso não se deve a quotas. “Diante de um homem e uma mulher com as mesmas qualificações, ela prefere contratar a mulher”, diz Gilberto Carvalho, secretário-geral da presidência.

Mulheres no poder

Mulheres capacitadas não são difíceis de encontrar. As brasileiras têm maior escolaridade e frequentam a universidade em maiores números que os homens. Apesar de o país ter uma boa parcela de machismo, a própria sociedade tem características distintamente matriarcais. Os homens mandam nas ruas, mas as mulheres governam todo o resto.

Um terço de todas as famílias são chefiadas pelas mulheres. Muitas vezes, os homens têm apenas um papel reprodutivo. O auxílio para quem tem filhos, conhecido como “bolsa família”, é tipicamente pago às mulheres, porque são mais responsáveis com o dinheiro. Mesmo assim, as mulheres que trabalham ganham um terço a menos que os homens na mesma posição. Existem quotas na política: por lei, 30% dos candidatos em eleições para o parlamento, governo ou prefeitura devem ser mulheres. Até agora, o que se faz é uma maquiagem.

“Os partidos políticos alegam que não conseguem encontrar mulheres qualificadas”, diz Marta Suplicy, vice-presidente do Senado. “Mas isso é uma desculpa. Eles simplesmente não se esforçam o suficiente”.

Suplicy é do Partido dos Trabalhadores e há muito defende a igualdade entre os sexos. Nos anos 80, ela ficou famosa na televisão lutando pelos direitos dos homossexuais.

Mais tarde, ela foi prefeita de São Paulo, maior cidade e centro econômico do país. “Antes de eu fazer meu discurso de posse, um político que também era amigo meu chegou para mim e disse: ‘Você diz algumas poucas palavras de boas vindas, depois você deixa as questões de orçamento para mim’. Primeiro tive que deixar claro para ele qual de nós tinha sido eleito à prefeitura”, diz Suplicy.

Os oponentes mais ferrenhos das medidas para promover as mulheres estão sentados no Congresso brasileiro. Grupos religiosos e alianças patriarcais bloqueiam todas as tentativas de liberalização, por exemplo, em questões como o aborto. “Por sorte, somos fortes no governo, e temos que agradecer à presidente por isso”, diz Suplicy.

Faxina eficaz

Gilberto Carvalho, secretário-geral universalmente popular, é o único homem influente. Carvalho serviu ao predecessor de Rousseff, Lula da Silva, por oito anos e ninguém conhece melhor do que ele os corredores labirínticos do poder. “Gilbertinho”, como as mulheres de Rousseff o chamam afetuosamente, é uma espécie irmão mais velho delas. Elas o consultam toda vez que se enrolam com as minúcias do aparato de Estado, e vão vê-lo quando a presidente as tritura. “Sou responsável pela parte feminina”, diz Carvalho.

Carvalho lembra-se que os homens frequentemente usavam expressões machistas no palácio presidencial na época de Lula. Ainda assim, isso não impediu Lula de preparar uma mulher para ser sua sucessora. Seus instintos acertaram na mosca. Rousseff hoje governa o reduto tradicionalmente masculino de Brasília com punho de ferro.

Ela já substituiu sete ministros, seis deles por variados escândalos de corrupção. Os patriarcas dos partidos afetados em sua coalizão de governo bateram no peito e a ameaçaram, mas a presidente recuou-se a ser intimidada. A faxina política claramente foi eficaz. Nenhum de seus predecessores era tão popular após um ano de presidência quanto ela é hoje. Ela não demorou a sair da sombra de Lula, que se tornou um herói nacional. Os dois ainda têm um relacionamento caloroso e, uma vez por mês, Rousseff visita Lula em São Paulo, onde ele está sendo tratado por um câncer na garganta.

Estilo diferente

Contudo, a mulher de ferro do Brasil tem um estilo de liderança muito diferente do seu predecessor jovial. “Lula agia por impulso e instinto”, diz Carvalho. Por outro lado, Rousseff é mais distanciada de sua equipe. Ela odeia lidar com os chefões do partido, governadores e parlamentares.

Lula viajava para cantos diferentes deste país gigantesco a cada semana e raramente passava mais de dois dias na capital. Sua sucessora é encontrada mais em sua mesa de trabalho do que no Airbus do governo. Os dois também são muito diferentes em sua abordagem à política externa. O presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, foi recebido de braços abertos por Lula, mas deliberadamente evitou o Brasil durante sua viagem à América Latina na última semana. Isso em parte ocorreu porque Rousseff criticou o regime em Teerã mesmo antes de assumir o cargo, por causa de seu tratamento medieval das mulheres.

Rousseff mora no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente brasileiro, junto com sua mãe e uma tia. Seu maior confidente é Carlos Araújo, antigo camarada da guerrilha que também é seu ex-marido e pai da sua filha.

O jornal “O Globo” chama a equipe feminina poderosa de “Amazonas do PT”, em uma referência às iniciais do Partido dos Trabalhadores de Rousseff. O grupo compreende a chefe da casa civil, a ministra do planejamento e a ministra de relações institucionais, responsável pelo contato com o parlamento.

Gerente impiedosa

A face mais conhecida do trio é a chefe da casa civil, de origem alemã, Gleisi Hoffmann, cujo primeiro nome incomum resulta de um erro de transcrição de sua certidão de nascimento. Seus pais queriam que ela se chamasse “Grace”, em memória à estrela de Hollywood Grace Kelly. Os homens no Congresso inicialmente zombaram da loura de olhos cor de mel, chamando-a de “Barbie da Dilma”. Mas Hoffmann é uma gerente impiedosa e rapidamente enquadrou os congressistas.

Sua principal tarefa é promover os principais projetos do governo que estão atrasados por questões orçamento ou ameaçam ser adiados pelos obstáculos parlamentares. Hoffmann atualmente está supervisionando o financiamento dos estádios que vão abrigar a Copa do Mundo de 2014, assim como a expansão de portos e projetos de energia.

Quando era jovem, ela queria ser freira. Depois, estudou Marx e Engels e uniu-se aos comunistas. No final dos anos 80, ela entrou para o Partido dos Trabalhadores, de Lula. Mais tarde, foi contratada como diretora de finanças da importante hidrelétrica Itaipu. Funcionários do palácio presidencial lembram-se de quando ela apresentou as finanças da empresa ao então presidente Itamar Franco. “Ah, você entende um pouco de matemática!”, disse o velho surpreso, apesar de depois pedir desculpas pelo deslize.


“As mulheres têm que trabalhar o dobro dos homens para terem o mesmo reconhecimento”, diz Hoffmann. O escritório dela no palácio presidencial tem uma vista ampla para o cerrado. Vê-se m céu espetacularmente nublado sobre o cenário verde e fotos de seus dois filhos na janela.

Calças

Ela raramente chega em casa antes das 22h, quando eles já estão na cama. Uma babá cuida deles. “Isso é típico neste país: as mulheres cuidam das mulheres”, explica Hoffmann. Há cerca de 7,5 milhões de domésticas nas casas do Brasil. “Elas trabalham mais e têm menos direitos do que a maior parte dos trabalhadores”, acrescenta Hoffmann.

A empregada de Gleisi Hoffmann tira folga no final de semana. Então, a chefe da casa civil divide o trabalho com o marido, o ministro das comunicações Paulo Bernardo. Bernardo admite que Gleisi é sua chefe nas reuniões de gabinete, mas ele insiste que não há rivalidade entre eles. “Meus oponentes dizem que nada mudou para mim”, diz ele. “Eles dizem quem usava calças lá em casa sempre foi a Gleisi”.

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