sexta-feira, 24 de maio de 2013
Suspeita de injustiça marca o maior julgamento da história dos Emirados Árabes Unidos
Uma centena de islamitas processados por subversão, dois meses e meio de audiências e quase um blecaute midiático. O maior julgamento da história dos Emirados Árabes Unidos terminou na terça-feira (21) perante o Supremo Tribunal Federal, em Abu Dhabi, sem que nenhum órgão de imprensa ou organização de defesa dos direitos humanos independentes pudessem ter acesso a ele.
Todavia, os elementos que estes últimos conseguiram colher junto às famílias dos acusados admitidas na corte descrevem debates repletos de irregularidades, que trazem o presságio de um veredicto de forte teor político, quando este for emitido no dia 2 de julho. "É um julgamento fundamentalmente injusto, sem precedentes, visando militantes pacifistas que pediam por um mínimo de democracia na gestão dos assuntos públicos do país", se revolta Rachid Mesli, diretor jurídico da ONG suíça Al-Karama, que trabalha com violações dos direitos humanos no mundo árabe.
No total, 94 pessoas foram julgadas, sendo oito à revelia. Advogados, juízes, professores ou ainda estudantes, eles são acusados de terem criado uma "organização secreta" dedicada a derrubar o atual regime árabe, nas mãos da dinastia Al-Nahyan. A maioria deles são membros ou simpatizantes do movimento Al-Islah, o braço local da Irmandade Muçulmana, a começar pelo seu presidente, o xeque Sultan Ben Kayed al-Qassimi, um primo do soberano de Ras al-Khaimah, um dos sete micro-emirados que constituem a federação dos EAU.
Por muito tempo tolerado pelo governo, a ponto de dois de seus dirigentes terem sido ministros nos anos 1980, o Al-Islah agora é visto com grande desconfiança pelas elites de Abu Dhabi. Estas temem que um movimento de protestos semelhante aos do Egito e da Tunísia coloque em xeque a prosperidade do país, o quinto maior exportador de petróleo do mundo. Assim, dezenas de membros do Al-Islah e militantes da sociedade civil foram pegos desde março de 2011, data do lançamento de uma petição que clamava pela instauração de uma monarquia parlamentar.
Muitos deles foram presos secretamente e submetidos a maus tratos. Na abertura do julgamento, vários apareceram em um estado psicológico preocupante, pasmados, entorpecidos e incapazes de acompanhar os debates. A acusação se baseia principalmente nas confissões de três dos 94 supostos conspiradores, que teriam sido obtidas sob tortura, segundo a ONG Al-Karama. Além disso, um deles se retratou já na primeira audiência, alegando inocência assim como todos os outros acusados e pedindo à corte, em uma súplica solene, "que proteja sua vida e a de sua família".
Confissões problemáticas
Além dessas confissões problemáticas, a principal peça de acusação consiste em uma gravação de áudio, de péssima qualidade, apresentada como sendo a de uma reunião da "organização secreta", na qual os magistrados tiveram a maior dificuldade de reconhecer as vozes de alguns acusados. O procurador também trouxe para depor agentes de serviços secretos que exibiram, como elementos de acusação, documentação sobre a Irmandade Muçulmana encontrada nos computadores dos supostos rebeldes. Outras peças que seriam incriminadoras: obras apreendidas nos domicílios dos acusados, assinadas por Hassan al-Banna, o fundador da confraria, e Sayyed Qotb, um teórico do islamismo radical, dois autores que são vendidos livremente nos Emirados.
As organizações de defesa dos direitos humanos não se iludem muito quanto à imparcialidade do tribunal. No mínimo porque alguns dos juízes atribuídos a esse julgamento são estrangeiros, que dependem das autoridades para o renovamento de seus contratos. As ONGs, em compensação, se agarram à esperança de um perdão do xeque Khalifa Ben Zayed al-Nayhan, o presidente dos EAU. Em 2011, ele havia agraciado os cinco iniciadores da petição sacrílega, após eles terem sido condenados a dois e três anos de prisão.
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