Abdelaziz Buteflika |
"O regime quer impor o silêncio", era o título na capa do jornal "El Watan" na segunda-feira (20). "O mutismo sobre a saúde do presidente revela o desprezo pela população", afirmou o rotativo "Echorouk".
Os principais diários argelinos expressavam o mal-estar e a indignação da opinião pública e de parte da classe política diante da falta de informação oficial sobre o estado de saúde do presidente Abdelaziz Buteflika, 76, que foi internado em urgência há 24 dias no hospital militar Val-de-Grâce, em Paris.
Buteflika sofreu um "acidente isquêmico transitório sem gravidade" e cujas "sequelas não são irreversíveis", declarou seu médico, Rachid Bougherbal, em 28 de abril. Desde então, outros responsáveis argelinos deram notícias apaziguadoras sobre a evolução da saúde do presidente argelino. O primeiro-ministro Adelmalek Sellal afirmou ontem à agência oficial" APS" que o presidente "melhora dia a dia" e que "sua vida nunca esteve em perigo", embora deva manter o repouso absoluto.
Alternativas
Diante da opacidade oficial, os argelinos tentaram se informar por meio da imprensa francesa, que também não consegue averiguar como se encontra o ilustre hóspede. As funções vitais de Buteflika estão muito prejudicadas, afirmou na semana passada o semanário parisiense "Le Point", que mantém estreitas relações com o governo francês.
Por ter ousado romper o tabu, dois jornais argelinos, "Monjournal" e sua versão em árabe, "Djaridati", foram apreendidos no domingo (19) de madrugada em Argel pelo Ministério da Comunicação. Este desmentiu a medida sancionatória, mas a verdade é que os jornais não foram postos à venda.
Hichem Abud, um ex-oficial da segurança militar que fundou os dois diários, disse na televisão France 24 que explicava em duas páginas que a saúde de Buteflika havia se "degradado muito" e que estava em um "estado comatoso". É "um coma que pode durar vários dias ou várias semanas".
A promotoria de Argel imputou no domingo Abud por "atentar contra a segurança do Estado, a união nacional, a estabilidade e o bom funcionamento das instituições".
Fazia quase uma década que na Argélia, onde a imprensa escrita goza de bastante liberdade, um jornal não era sequestrado e seu diretor processado por pôr em risco a segurança do Estado.
As iniciativas do Ministério da Comunicação e da promotoria salientam o nervosismo das autoridades, que resistem a divulgar relatórios médicos e também não permitem que a imprensa informe por sua conta.
"Por que não nos mostram o presidente na televisão?", perguntou-se Hichem Abud, depois de lembrar que, por exemplo, o venezuelano Hugo Chávez foi fotografado com suas filhas três semanas antes de morrer.
Muitos argelinos se fazem a mesma pergunta. Lembram que em 2005, quando Buteflika foi operado de emergência no mesmo hospital francês, a televisão argelina mostrou poucos dias depois imagens do chefe de Estado acompanhado por seu médico.
Pressão
Vários partidos de oposição, entre os quais se destaca o islâmico Movimento para a Sociedade e a Paz, instaram nas últimas horas o Conselho Constitucional a propor ao Parlamento que se aplique o artigo 88 da Constituição, que prevê a destituição do presidente em caso de "doença grave e duradoura" e se "estiver totalmente impossibilitado de exercer suas funções".
A doença presidencial atrapalhou os supostos planos de Buteflika, que chegou à presidência em 1999, de solicitar um quarto mandato como chefe de Estado a partir de abril de 2014. Há inclusive sérias dúvidas de que consiga terminar o atual, que expira dentro de 11 meses. Seja qual for a gravidade de seu estado, a era Buteflika está acabada.
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