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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Crise no Mali marca a volta da retórica antiterrorista

Soldado francês limpa sua arma perto da cidade de Diabaly, no Mali.

A rajada de fórmulas utilizadas pelas autoridades francesas para evocar a intervenção no Mali e a maciça tomada de reféns na Argélia deu a impressão, por efeito cumulativo, de que Paris se inscreveria em uma retórica próxima da dos "neoconservadores" americanos e do governo Bush, teórico da "guerra ao terrorismo". O governo francês se defende vivamente e, segundo um conselheiro do Eliseu, "estamos muito conscientes" da necessidade de evitar qualquer amálgama.

A palavra "cruzada" foi banida do vocabulário oficial. Também se deram instruções para evitar falar em "guerra contra o islamismo radical". "Há o risco de ser levado a uma posição de conflito de civilização", diz essa fonte diplomática. "Não queremos empregar um vocabulário que supervalorize o significado em termos de audiência desses grupos" combatidos no Mali. Alguns se envolvem na ideologia da Al Qaeda, mas eles decorrem de um fenômeno de "criminalidade transfronteiriça", salienta essa fonte.

A linguagem marcial está lá, entretanto. François Hollande, em 15 de janeiro, declarou à imprensa: "Vocês perguntam o que vamos fazer com os terroristas? Destruí-los, fazê-los prisioneiros se for possível".

O ministro da Defesa, Jean-Yves Le Drian, considera que a tomada de reféns na Argélia foi "um ato de guerra". Para o presidente francês, o ataque das forças argelinas foi "a reação mais adequada". O ministro das Relações Exteriores, Laurent Fabius, estima que "diante do terrorismo é preciso ser implacável".

A França parece ter assumido a frente, no plano internacional, de um discurso antiterrorista renovado, que voltou ao gosto do dia mais de 11 anos depois dos atentados de 11 de Setembro e apenas duas semanas após a retirada das tropas francesas "combatentes" do Afeganistão, cuja missão era privar a Al Qaeda de qualquer santuário. Hoje é preciso fazer a mesma coisa no Sahel.

"A ameaça evoluiu geograficamente", analisa o governo francês. "Primeiramente concentrada na zona Afeganistão-Paquistão, ela migrou para a península Arábica, assim como para a África e o Magreb."

O choque produzido pelo drama de In Amenas, na Argélia, com seu pesado balanço de vítimas de diferentes nacionalidades, parece ter despertado o interesse de Washington e de outras capitais pelos esforços franceses no Mali e pela situação no Sahel. O aliado mais "disposto", no plano da posição antiterrorista, é de longe David Cameron, o primeiro-ministro britânico.

É preciso conduzir "com uma determinação de ferro um combate geracional" contra o islamismo radical, ele declarou na segunda-feira (21) diante do Parlamento em Londres, descrevendo "uma ideologia que é uma distorção extrema da fé muçulmana e que considera o assassinato em massa e o terror não apenas aceitáveis, como necessários". O Reino Unido decidiu fazer da ameaça terrorista a prioridade de sua presidência do G8 em 2013.

Emprestando, como salientou o "Financial Times", o registro lexical de Tony Blair na época Bush, Cameron invocou uma "ameaça existencial" que pesa sobre os países ocidentais, os grupos ligados à Al Qaeda na África do Norte que desejam "destruir nosso modo de vida".

Do lado americano, o vocabulário parece bem mais comedido. A aversão de Barack Obama pela fórmula "guerra ao terrorismo" é conhecida, embora ele tenha a particularidade de utilizar em altas doses os ataques de teleguiados destinados a eliminar jihadistas, do Paquistão ao Iêmen. O presidente americano reeleito não mencionou a Al Qaeda em seu discurso de posse na última segunda-feira. Na véspera, limitou-se a um comunicado que descreveu o ataque na Argélia como "uma lembrança suplementar da ameaça representada pela Al Qaeda e outros grupos violentos de extremistas na África do Norte".

Em Paris, alguns acham que a ajuda americana na intervenção no Mali é um pouco escassa e lenta, mesmo que sejam dados apoios preciosos em termos de informação. Washington anunciou o envio de uma centena de formadores militares junto aos contingentes dos países da África Ocidental levadas a se deslocar - mas omitindo o exército maliense, pois a legislação americana proíbe a ajuda a um governo originário de um golpe.

A ênfase retórica das autoridades francesas pôde fazer pensar, em alguns momentos, no discurso que Nicolas Sarkozy tinha sobre a Al Qaeda. No seio da esquerda francesa, muitos advertiram na época contra uma abordagem puramente "securitária", fazendo muito pouco caso das questões de governança e desenvolvimento.

Mas para mobilizar os espíritos, notadamente na ONU, foi realmente preciso subir na gama semântica. "O Sahel foi um ângulo morto" da ação internacional nos últimos anos, estima o Eliseu. A Rússia, que avalia todo o interesse para sua diplomacia desse importante retorno ao discurso anti-Al Qaeda, propôs aviões de transporte.

Na África, os EUA praticam o que Leon Panetta, o secretário de Defesa de saída, descreveu como uma política de "impressão ligeira": ação das forças especiais, reforço dos exércitos locais, seja na Somália ou no Sahel. Washington parece apreciar ao mesmo tempo as probabilidades de êxito dos franceses no Mali e o perímetro dos interesses americanos nessas regiões da África, antes de se envolver mais. Os EUA e o Reino Unido declararam excluir qualquer envio de soldados em terra.

A crise no Mali e o temor de "metástases" jihadistas na região recolocaram a luta contra o terrorismo no primeiro plano das relações internacionais. Membro da comissão do "Livro branco sobre a defesa francesa", o especialista Bruno Tertrais descreve uma "retórica francesa musculosa, mas controlada". "Não se trata de 'guerra ao terrorismo', mas apenas uma guerra contra terroristas." A Al Qaeda no Magreb Islâmico é "um movimento localizado, ao contrário da Al Qaeda 'central' em seu apogeu", ele salienta.

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