quarta-feira, 23 de janeiro de 2013
Norte da África é o novo teste para os EUA na luta contra células terroristas
O final sangrento da crise dos reféns na Argélia colocou em foco os grandes desafios que precisam ser enfrentados pelos Estados Unidos e por seus aliados no combate à Al Qaeda no Magreb Islâmico e a outras células terroristas que têm se refugiado no Norte da África.
Os EUA e a França vêm cortejando a Argélia há alguns meses na esperança de garantir seu apoio para os esforços internacionais destinados a expulsar os militantes islâmicos do norte do Mali. Mas o avanço dos militantes no sul, que levou o governo do Mali a solicitar uma intervenção militar francesa, e a tomada de reféns em um complexo de produção de gás no Saara pegaram os Estados Unidos de surpresa e fizeram a Casa Branca renovar suas promessas de que agirão para combater o terrorismo na região.
Ao enfrentar os militantes, os países ocidentais estão confrontando bandos multinacionais que, muitas vezes, são capazes de se mover com relativa liberdade através das porosas fronteiras africanas. E essas células têm muitos alvos convidativos para escolher: toda a região é rica em petróleo, gás, urânio e em outros empreendimentos internacionais, que representam claramente interesses ocidentais e, em alguns casos, são mal defendidos.
Além disso, com os EUA e o Reino Unido determinados em não enviar tropas ao Mali e os franceses esperançosos em evitar o envio de um contingente ilimitado de soldados ao país, as nações ocidentais devem contar, em grande parte, com as forças dos países locais, que nem sempre estão abertos a receber conselhos de estrangeiros.
Rudolph Atallah, ex-funcionário do setor de contraterrorismo do Pentágono, observou que a Al Qaeda no Magreb Islâmico é uma verdadeira rede regional que se ramificou lentamente através das fronteiras africanas. "Para desmantelar essa rede, os Estados Unidos e seus aliados, africanos e europeus, vão precisar de uma estratégia regional bem pensada", disse ele.
Forjar essa estratégia não será nada fácil considerando-se os jogadores que estão em campo.
As forças armadas argelinas são competentes - embora truculentas -, mas não se mostraram ansiosas para cooperar amplamente com os EUA nem com seus vizinhos. O novo governo da Líbia parece disposto a cooperar, mas tem pouca habilidade. O Mali possui capacidade militar restrita, e qualquer solução duradoura precisa ser trabalhada tendo em mente a política interna.
A dura realidade política das operações na África ficou evidente durante a crise dos reféns na Argélia. Ao reconhecerem que a cooperação da Argélia será necessária para a realização de uma campanha contra os militantes do Mali, tanto a França quanto os EUA foram cautelosos e não se queixaram do fato de os argelinos terem realizado sua operação para resgatar os reféns sem consultá-los - os dois países também não se queixaram das táticas empregadas na ação.
"A Argélia tem uma abordagem que, de acordo com meu ponto de vista, é a mais adequada, pois não poderia haver nenhum tipo de negociação", disse no sábado passado o presidente da França, François Hollande.
Tanto a França quanto os EUA querem que a Argélia feche suas fronteiras com o Mali, e a França quer que a Argélia continue permitindo que aviões franceses sobrevoem seu território.
Como revelou a investigação independente sobre o ataque contra a missão dos EUA em Benghazi, a filial da Al Qaeda no norte da África e outras facções de militantes da região representam, cada vez mais, a nova cara dos grupos terroristas, que são violentamente antiamericanos, mas não estão sob o comando e o controle dos líderes da Al Qaeda no Paquistão.
A Al Qaeda no Magreb Islâmico começou como um grupo argelino que lutava contra o governo da Argélia. Expulso do país, o grupo encontrou refúgio no norte do Mali, que também passou a abrigar militantes que deixaram a Líbia após a queda de Muammar Gaddafi.
A estratégia inicial de franceses e norte-americanos era manter a discrição na região enquanto treinavam as tropas africanas que seriam enviadas ao Mali para lutar contra os militantes ligados à Al Qaeda.
Havia sinais crescentes de que a região do Norte de África estava ficando mais perigosa. Um especialista ocidental em segurança, que foi convidado a avaliar a ameaça ao complexo petrolífero da Argélia no ano passado, havia relatado a existência de um risco "elevado" devido aos militantes atuando no Mali.
Ainda assim, o plano dos EUA e da França presumia que a ameaça representada pelos militantes no Mali ganharia corpo lentamente, e que o Ocidente teria tempo para organizar uma resposta militar com a ajuda de aliados africanos. O plano era enviar essas tropas em setembro deste ano.
Mas a ofensiva dos militantes no Mali e o ataque na Argélia demonstrou que esses grupos têm um alcance mais amplo do que o previsto e que eles estão preparados para atacar. A intervenção francesa que se seguiu introduziu uma nova variável nessa equação.
"O cenário mudou totalmente", disse Bruce Hoffman, especialista em terrorismo da Universidade de Georgetown.
O governo Obama, que enviou 100 instrutores para vários países africanos com o intuito de ajudar a preparar as tropas africanas para sua missão ao lado dos franceses no Mali, parece estar avaliando como apoiará ativamente o esforço militar francês.
Com os Estados Unidos ainda lutando para determinar exatamente o que aconteceu na Argélia e para identificar suas vítimas, os norte-americanos ainda não explicitaram como pretendem adaptar sua estratégia para a África.
Especialistas dizem que qualquer estratégia regional deve ajudar os países africanos a proteger melhor suas fronteiras, tanto para restringir a movimentação de facções de militantes quanto para reduzir o tráfico de drogas, que é uma das principais fontes de receita desses grupos.
Concentrar o foco sobre os líderes militantes responsáveis pela maioria dos ataques é essencial, diz Atallah. Mas, segundo ele, uma solução duradoura para o Mali terá que promover a acomodação política entre o governo do Mali e os tuaregues, povo nômade do Norte do país, além de garantir que as forças armadas do Mali não utilizarão uma campanha de contraterrorismo como desculpa para reprimir os tuaregues.
O problema das violações aos direitos humanos continua a ser uma preocupação incômoda relacionada a qualquer intervenção militar apoiada pelo Ocidente. Recentemente, a organização Human Rights Watch informou que grupos militantes do norte do Mali recrutaram várias centenas de crianças para atuar como soldados. A entidade também acrescentou que algumas crianças estavam em postos de controle que haviam sido bombardeados por aviões franceses.
Com a Casa Branca quase que totalmente concentrada nas questões domésticas e com os funcionários norte-americanos que há muito tempo vem se mostrando cautelosos em expandir a pegada militar dos EUA na região, algumas das barreiras para a realização de uma ação podem ser autoimpostas.
Hoffman disse que os Estados Unidos devem considerar aumentar seu apoio à intervenção francesa, fornecendo apoio logístico adicional e, talvez, utilizando "drones" (aviões de ataque guiados por controle remoto) para que os militares franceses possam concluir com mais facilidade suas operações e entregar a missão o mais rápido possível para as tropas africanas.
"Eu não acredito que o envolvimento dos EUA tem que ser amplo", disse ele. "Eu acredito que nós precisamos ser mais proativos".
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