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quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Um presidente normal em breve poderá governar a França

Nicolas Sarkozy

Aparentemente, os franceses se cansaram das travessuras do presidente Nicolas Sarkozy. As pesquisas indicam que François Hollande, o socialista da vida toda, tem chances de derrotar o candidato que está no governo. Isso marcaria uma mudança significativa para a França – do exibicionismo para a normalidade constante.

O candidato estava aprisionado em um paradoxo, mas não pareceu notar. Vestindo as cores azuis clássicas da república francesa para celebrar a ocasião, François Hollande assinou o “Pacto de Igualdade do Homem e da Mulher” em uma sala na Assembleia Nacional em Paris, na última terça-feira (04/10).

Ao assinar o documento, ele estava prometendo lutar por representação igual dos gêneros nos cargos públicos. Mas Hollande, que foi por muito tempo presidente do Partido Socialista francês, está atualmente fazendo o seu melhor para derrotar duas rivais pela honra de concorrer contra o presidente Nicolas Sarkozy nas eleições presidenciais de abril de 2012.

A votação decisiva para Hollande ocorrerá neste domingo (9), quando os franceses votarão nas primárias – abertas a todos os eleitores – para determinar o candidato socialista que desafiará o presidente. As pesquisas de opinião mostram que Hollande, 57, é o franco favorito, à frente de Martine Aubry, 61, e Ségolène Royal, 58, assim como três outros candidatos do sexo masculino.

Hollande, que tem sido fiel servidor do partido desde os tempos gloriosos do ex-presidente François Mitterrand, tem muitas chances de levar a esquerda de volta ao cargo máximo do país, após 17 anos e três derrotas consecutivas. De acordo com recente pesquisa, 48% dos franceses têm mais confiança em Hollande do que em Sarkozy para resolver a atual crise econômica e financeira do país, enquanto 28% têm mais confiança em Sarkozy. Os resultados da pesquisa são impressionantes, já que Hollande nunca teve um cargo ministerial na França.


“Trauma”
De fato, o atual índice de popularidade de Sarkozy está tão baixo que a direita está em pânico. Nas eleições da semana passada eles perderam o controle do Senado – um corpo que os conservadores na França controlaram desde que a Quinta República veio ao mundo, em 1958. Foi “mais do que uma derrota – foi um trauma”, concluiu Hollande. O Senado, a segunda câmera parlamentar da França, é mais representativo das cidades pequenas e das províncias na França rural. Como regra, é um bastião do conservadorismo, um lugar onde sobrevive a versão mais nostálgica da França, com todos seus clichês. A eleição para o Senado mostrou que, se as áreas tradicionalmente conservadoras rurais estão abandonando Sarkozy, ele pode estar em grande dificuldade.

Colegas do partido sugeriram cautelosamente que o presidente deveria se recusar a concorrer novamente e abrir caminho para candidatos potencialmente mais promissores, como o primeiro-ministro, François Fillon, ou o ministro de Relações Exteriores, Alain Juppé. Contrariando suas características, Sarkozy nada respondeu. Aparentemente quer concentrar suas atenções na crise do euro. Ele também vai receber os líderes do G-20 em uma reunião em Cannes, no início de novembro. Nesta ocasião, sua mulher, Carla Bruni, terá tido seu primeiro filho- o que pode gerar alguma simpatia para Sarkozy, como o primeiro a ter um filho no Palácio do Elysée.

Hollande, de sua parte, não acredita que Sarkozy se retirará da disputa. Ele sabe que ele e Sarkozy sabem superar momentos difíceis. E ele está tentando transmitir aos seus colegas socialistas em júbilo que suas esperanças de vitória no ano que vem não podem depender totalmente da autodestruição de Sarkozy.

As próprias primárias do partido, de fato, são mais desafiadoras do que sugerem as pesquisas. Aubry e Royal, as duas mulheres que Hollande precisa derrotar, são rivais de primeira classe. E as duas têm contas a acertar com Hollande. Royal como sua ex-mulher e Aubry como rival de longa data dentro do partido. As duas acumularam experiência de governo sob presidentes anteriores, como Mitterrand e Lionel Jospin; Hollande não tem esse tipo de experiência. As duas demonstraram que possuem instintos assassinos quando assumiram seus cargos; Hollande não. As duas são políticas com objetivos e profundamente motivadas; Hollande não parece se incomodar em tomar uma rota menos direta para alcançar seus propósitos.

Receptivo e sempre sorrindo
Sua imagem de homem receptivo, sempre sorrindo, um tático inteligente ao lado de políticos mais proeminentes, não o protegeu contra inúmeras flechas envenenadas. Aubry, filha do peso pesado político europeu Jacques Delors, chamou-o de “maricas”. Aubry nunca perdoou Hollande por procurar se retratar como herdeiro político do pai dela após a volta de Delors em 1994 de Bruxelas após servir três mandatos como presidente da Comissão Europeia.

Royal, por outro lado, mãe de seus quatro filhos e sua parceira por 30 anos antes de deixá-lo pelo jornalista do “Paris Match” Valérie Trierweiler, se ressente dele por uma dupla traição – no amor e na política. Há cinco anos, em sua posição de líder do partido, ele fez tudo o que pode para dissuadi-la de concorrer à presidência contra Sarkozy. Os rumores são de que ela se ofereceu a não concorrer se ele deixasse sua nova amante – um acordo romântico que nunca se materializou.

Hollande, que é advogado, conheceu Royal quando os dois eram estudantes na universidade de elite ENA. Durante a maior parte do relacionamento, Hollande se viu objeto de escárnio público. Os franceses o chamavam de “senhor Royal” – sua carreira não tinham o menor glamour, enquanto sua mulher se tornou ministra, diretora do conselho regional e mais tarde candidata à presidência.

Hollande teve um cargo na corte francesa, foi assessor do secretário de imprensa do ex-primeiro-ministro Pierre Mauroy e se tornou membro do conselho na cidade francesa de Ussel. Ele foi membro do Parlamento e depois se tornou professor universitário e secretário do partido para questões econômicas. Ele assumiu seu cargo político mais importante, a presidência do Partido Socialista, em 1997. Com esse currículo, não surpreende que poucos o levassem a sério.

Sua baixa estatura (Hollande tem 1,71 m – o que o torna 3 cm mais alto do que Sarkozy) também ajudou a torná-lo objeto de humor. Ele se tornou um personagem cômico em um programa de bonecos do canal de televisão “Canal+”. Após perder 15 kg e deixar de lado sua figura arredondada jovial, o boneco que fazia o papel de Hollande na TV estava constantemente desmaiando de fome.

Por trás da máscara
Mesmo tendo perdido peso, Hollande tornou-se mais centrado. Hoje ele brinca falando que não é fácil de derrubar por causa de seu baixo centro de gravidade. Amigos dizem que ele sofre com as intrigas e zombarias, mas que esconde suas emoções por trás de uma máscara de alegria. Hollande é um político profissional, sem um ego exagerado. Diferentemente de Sarkozy ou do ex-diretor do Fundo Monetário Internacional Dominique Strauss-Kahn, parece haver pouca chance que Hollande possa sucumbir ao escândalo.

De fato, tudo indica que a França pode estar se inclinando para eleger um presidente “normal”. Tal coisa parece quase impossível para um país que há muito mostra uma preferência para líderes mais exuberantes. Ou visionários, como Charles de Gaulle. A mensagem de Hollande, por contraste, é muito simples: o que há de errado como menos brilho? Os sucessores de De Gaulle, de Mitterrand a Jacques Chirac, por fim se enrolaram em uma rede de escândalos, dinheiro, mentiras e nepotismo, que algumas vezes os fizeram parecer mais com chefões da máfia do que com estadistas de visão.

A França tem um temor não dito de seguir os passos da Itália – econômica, cultural e politicamente.

Um político não carismático poderia ajudar a evitar essa ameaça. Royal assumiu ares de pregadora de televisão fundamentalista, buscando uma conexão mística com o povo. Aubry é brusca e cortante. E Sarkozy encarna tudo que o país abomina profundamente: instabilidade, modernidade, globalização e neoliberalismo. Ele pode ser tudo, menos pé no chão.

Um partidário inesperado
Aubry, Royal, Hollande e Sarkozy estão competindo em um espectro da direita à centro-esquerda, no qual todas as nuances diferenciam os candidatos. Hollande, por exemplo, quer tirar a França da armadilha da dívida evitando as falhas na arrecadação de impostos, e assim gerar 50 bilhões de euros em receita adicional. Se tal plano é realista não se sabe; todo grupo afetado sem dúvida defenderia seu viés até o último euro. Além disso, o economista Nicolas Baverez calculou que a França precisa levantar 120 bilhões de euros em quatro anos para embarcar no caminho da reabilitação.

Isso não impediu Hollande de anunciar programas caros. Ele quer criar, por exemplo, 60 mil novos empregos públicos nas escolas francesas nos próximos cinco anos. Professores, que entraram em greve em todo o país na última terça-feira para protestar contra o corte de empregos, têm sido o bloco mais forte da esquerda no último século. O ex-ministro da educação Claude Allègre caracteriza a proposta pouco realista de Hollande como “pura demagogia”.

O mesmo provavelmente se aplica ao seu plano de “contratação da nova geração”, sob o qual a empresa que contratar um jovem e mantiver um funcionário mais velho até a aposentadoria poderia economizar em suas contribuições para a previdência social dos dois empregos. Aubry criticou o plano por ser caro e ineficiente.

Hollande também quer reduzir a partilha nuclear da matriz de eletricidade francesa de 75% hoje para 50%. Diferentemente de Aubry, Hollande evitou prometer a eliminação da energia nuclear inteiramente no longo prazo.

As inseguranças de uma nação
Hollande é tão “maleável que ele algumas vezes chega ao oportunismo”, disse o ex-primeiro-ministro Jospin sobre seu antigo companheiro. A indecisão de Hollande se tornou uma estratégia de sobrevivência em seus 30 anos de trabalho dentro do partido. Seu filho mais velho, Thomas, descreveu da seguinte forma a flexibilidade do pai: “Quando você está na sala com ele, você sente que há 10 portas abertas em torno dele e você nunca sabe qual ele vai tomar.”

Ridicularizado e criticado, perspicaz e indefinido. Sofisticado e casca-grossa: o que há neste homem, que o ex-primeiro-ministro Laurent Fabius chamou de “brincalhão”, que permite que ele se conecte com os temores e esperanças, desejos e inseguranças da nação na hora certa?

Hollande personifica uma imagem nostálgica e idealizada da França, de um passado que é invocado em vários filmes franceses, tais como “Amélie”. Os personagens desses filmes são pessoas ordinárias em um ambiente que não foi destruído pelo progresso.

“É uma rejeição da vida moderna, do consumo em massa, da tecnologia e do liberalismo”, diz o historiador Antoine de Baecque. A França tem sido um dos países mais pessimistas do mundo desde meados do século 19, diz o historiador Marc Ferro. “Esses filmes servem de antídoto”.

Hollande pode ser um personagem desses filmes: um gaulês habilidoso que desafia as atribulações apresentadas pelo destino. Não é coincidência que ele foi comparado a Raymond Poulidor, o “eterno segundo lugar” no Tour de France, que se tornou figura popular precisamente porque nunca foi primeiro.

Apoio de Chirac
Sarkozy passou a acreditar que Hollande é seu mais perigoso concorrente e prefere disputar contra Aubry. Ela personifica o lado mais agressivo do socialismo, enquanto Hollande tem um efeito calmante nos eleitores mais velhos e na classe média. As frentes políticas mudaram de constelação. “As eleições presidenciais não são sobre a diferença entre direita e esquerda, mas entre moderno e conservador”, dizem os planejadores de Sarkozy. Eles veem seu candidato no papel de reformista e Hollande no de conservador.

Jacques Chirac nunca apreciou a agitação de seu sucessor e colega de partido Sarkozy. Agora sofrendo com os primeiros estágios de demência, Chirac é amado pelos franceses como um tio rico – e ele deu suas bênçãos a Hollande. Durante uma visita conjunta ao Museu Presidencial Jacques Chirac em Sarran, no centro da França, Chirac estava notavelmente amigável ao socialista, que representou as eleições de um distrito rural aqui no departamento de Corrèze por mais de 20 anos. Como se estivesse aparecendo com seu próprio filho, o ex-presidente subitamente disse: “Votarei nele.”

Hollande, perplexo, já que combateu Chirac desde que entrou na política, assinalou para que ele fosse cauteloso, porque os microfones estavam ligados e as câmeras também. Em vez disso, o ex-presidente voltou-se aos jornalistas e disse: “Posso lhes dizer que vou votar em Hollande”.

Quando Sarkozy ouviu falar do incidente, teria ficado tão furioso que a filha de Chirac Claude fez uma visita a ele no Palácio do Elysée em um esforço para acalmá-lo.

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