Manifestantes protestam em 2010 durante funeral de uma vítima do grupo separatista curdo PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão ), em Kirikkale (Turquia) |
Desde que o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (em curdo Partiya Karkerên Kurdistan, ou PKK) encerrou o seu cessar-fogo em julho, ele voltou a desfechar ataques dentro das fronteiras da Turquia, matando 30 soldados e policiais, bem como 20 civis. Vários ataques abalaram o país, incluindo um que resultou na morte de três pessoas no centro da capital da Turquia, Ancara; um no qual quatro mulheres curdas foram mortas na cidade de Siirt; e o assassinato, na cidade de Batman de uma mulher grávida, cujo filho foi salvo em uma operação de emergência, apenas para morrer dois dias depois.
Markar Esayan, um jornalista que possui contatos próximos no Partido Curdo da Paz e da Democracia (em turco, Bar?? ve Demokrasi Partisi, ou BDP), diz que o povo curdo teme um retorno dos conflitos da década de noventa. Eles estão com medo de mais uma vez se verem na frente de batalha entre o PKK e o exército turco, morrendo no “fogo cruzado”, conforme diz o jornalista. Ele afirma que esse medo é justificado, já que no momento o PKK está fazendo tudo o que pode para “provocar uma reação maciça do governo e do exército turcos”. A situação atual é ainda mais complicada do que era na década de noventa, já que não se sabe onde se situam as linhas demarcatórias do atual conflito.
Enquanto elementos de linha dura do PKK atiçam as labaredas do conflito, outra facção, incluindo o ex-líder desta organização clandestina, Abdullah Öcallan, que se encontra preso, continua interessada em encontrar uma solução política. Situado em um terreno político intermediário entre as duas organizações está o BDP, um partido político legal que conseguiu obter 36 cadeiras no parlamento turco em junho deste ano. O partido boicotou o parlamento, supostamente porque seis dos seus parlamentares, que atualmente encontram-se detidos e aguardando julgamento, foram proibidos por uma ordem judiciária de assumir os seus mandatos. “O BDP encontra-se sob uma pressão enorme por parte do PKK e ele está sendo jogado de um lado para outro como se fosse uma bola de tênis”, diz Esayan.
Indignação com a morte de mulheres curdas
Por ora, as propostas no sentido de procurar encontrar uma solução política têm prevalecido. O BDP decidiu, após bastante hesitação, encerrar o seu boicote e participar do parlamento, em 1º de setembro, quando terminou o recesso parlamentar de verão.
Uma das parlamentares do BDP é Leyla Zana, uma política que mal havia sido eleita para o parlamento no início da década de noventa quando foi novamente expulsa e presa por falar no idioma curdo durante a cerimônia de posse do mandato. Ela só foi libertada em 2004. Nas eleições de junho deste ano, Zana obteve um mandato direto na província de Diyarbakir, no sudeste da Anatólia.
Não há dúvida de que a indignação generalizada da sociedade curda com a morte de quatro mulheres curdas em setembro também foi responsável pela decisão do BDP de encerrar o boicote. O PKK simplesmente deu de ombros e aceitou as mortes como sendo um efeito colateral dos seus ataques contra a polícia e as forças armadas turcas. Pela primeira vez em anos, curdos furiosos organizaram manifestações, portando faixas contra o PKK com a inscrição: “Não em meu nome”.
Mesmo assim, os membros curdos do parlamento turco têm dias difíceis pela frente. O presidente Abdullah Gül manifestou o seu apoio ao receber Selahattin Demirtar, um dos líderes do BDP, no palácio presidencial no mesmo dia em que o BDP anunciou o fim do boicote, e ao dizer que apoia uma solução política no parlamento para as questões curdas. Mas o primeiro voto no parlamento será uma iniciação difícil para os representantes do BDP. Nesta semana, o parlamento turco deverá conceder ao governo autoridade legal para invadir o norte do Iraque a qualquer momento. A medida poderá possibilitar que o governo persiga rebeldes curdos que têm bases no norte do Iraque. Todos os partidos, exceto o BDP, deverão votar a favor dessa medida.
Ataques planejados contra bases do PKK no norte do Iraque
Desde o início de setembro, a Turquia vem se preparando para lançar uma grande ofensiva terrestre após os seus bombardeios aéreos no início deste ano contra bases do PKK no norte do Iraque. Quando participava da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York, no mês passado, o primeiro-ministro turco Recep Tayyp Erdogan reuniu-se com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e com o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad para discutir possíveis ações militares. Enquanto isso, diplomatas turcos em Bagdá e em Irbil, a capital da região curda autônoma no Iraque, estão fazendo pressões por apoio na luta contra o PKK.
Uma invasão destruiria a esperança de uma solução política. Elementos de linha dura do PKK estão desejando exatamente isso, enquanto que indivíduos mais sensatos da mídia têm advertido Erdogan para que não caia nessa armadilha.
Em um discurso a parlamentares do seu Partido da Justiça e do Desenvolvimento (em turco, Adalet ve Kalk?nma Partisi, ou AKP), na semana passada, Erdogan apresentou uma espécie de estratégia dupla. “Nós combateremos o terrorismo até o fim”, declarou o primeiro-ministro aos membros do partido. “Mas nós também negociaremos com aqueles que desejam uma solução política”.
Até o momento, tais negociações não tiveram resultados. Até mesmo aquelas que Erdogan fez com que o seu chefe de inteligência mantivesse com Abdullah Öcalan na prisão e com membros proeminentes do PKK, em Oslo, em 2010, mostraram-se infrutíferas.
Agora tudo depende de como Erdogan vai lidar com os representantes do BDP no parlamento. “O presidente Gül é capaz de pintar o grande quadro relativo à situação”, afirma Yavuz Baydar, um jornalista que apoia o governo. “Mas Erdogan traz na sua mão a chave para uma solução”. Resta saber se o primeiro-ministro abandonará ou não a sua retórica dura contra o BDP e reunir-se-á com representantes curdos importantes.
“A solução para este problema, há muito tempo necessária, depende da modalidade do jogo 'brincando com fogo' que Erdogan escolher”, conclui Baydar.
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