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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Der Spiegel: Após ataque de Israel, palestinos sofrem as sequelas


Hussam Ashi, motorista que vive na Faixa de Gaza, admite que mentiu. Ele não conseguiu contar a seu filho de seis anos de idade, Hatim, que havia uma guerra acontecendo, ou que foguetes estavam apontados para eles. Ele evitou as explicações que necessariamente seguem essas sentenças, explicações carregadas das experiências de pelo menos três gerações.

Em vez disso, ele disse ao filho que havia uma festa do lado de fora, o que explicava os fogos de artifício e o barulho – uma festa de oito dias. Durante esses oito dias, Hatim às vezes confortava seu pai quando este voltava do trabalho parecendo deprimido. "Papa", ele dizia, “não fique triste. Estamos em festa."

A guerra acabou, deixando mais de 160 mortos e 1.200 feridos, mas um odor carbonizado ainda paira no ar. Aviões teleguiados circulam no céu como insetos presos numa sala, incapazes de encontrar a saída. Os rastros dos foguetes desapareceram do céu, mas ainda assim, esta faixa de areia ainda continua selada, dia e noite, por um muro de 52 quilômetros equipado com estações de armas operadas por controle remoto e câmeras de vigilância.

Os botes de pesca estão indo para o mar novamente, mas não estão autorizados a atravessar uma linha de três milhas náuticas a partir da costa, que é guardada por navios de guerra da marinha israelense. Os mortos de guerras anteriores estão enterrados na terra seca ali embaixo. Aqui em Gaza, ar, água e terra são barreiras, não possibilidades. Não há aeroportos, estações de trem ou portos através dos quais alguém que queira fugir possa deixar a Faixa de Gaza. Mesmo em tempos de paz, Gaza parece uma prisão.

A lei da vingança
"Não passamos de cobaias", diz o ministro da Saúde de Gaza, Mufeed Mkhallalati, um dos poucos representantes do governo do Hamas a fazer aparições públicas durante a guerra. Toda noite, vestindo um casaco branco de médico, ele ficava parado em frente ao Hospital Al-Shifa, onde os israelenses acreditavam que o Hamas tinha um de seus centros de comando, enquanto os mortos eram retirados dali.

"Nós somos cobaias, e os israelenses estão testando suas armas conosco", diz o ministro. "Eu fui cirurgião por três anos, e venho de Gaza, mas eu nunca tinha visto nada parecido com isso."

Ele está falando das queimaduras de terceiro grau, de cadáveres que parecem múmias, amputações depois de explosões e corpos que foram levados para o hospital em pedaços do tamanho de punhos.

Mkhallalati diz que é um médico e não quer falar muito sobre isso, mas acrescenta que a lei da vingança existe no mundo todo, e é uma boa lei. "Estamos certos de que os israelenses vão ter um fim pior do que o nosso destino", disse. "É assim que o mundo funciona." Ele não mencionou as centenas de foguetes que o Hamas disparou contra o sul de Israel.

Os pesadelos continuam
Carreatas agora passam pelas ruas, que estavam abandonadas até recentemente, crianças entregam doces e cantam músicas de vitória, e palestinos disparam para o ar para comemorar, às vezes, inadvertidamente, fazendo ainda mais vítimas. O sapato respingado de sangue e o casaco rasgado de um dos seis supostos espiões israelenses, que foram mortos a tiros em plena luz do dia, ainda estão na Rua Nasser, no centro da Cidade de Gaza. A estação de rádio do Hamas mais tarde afirma que os homens levavam "equipamento e câmeras de alta tecnologia" para identificar alvos para os ataques de foguetes israelenses.

Membros do Hamas supostamente questionaram os “traidores” palestinos que trabalhavam para os israelenses antes de eles serem executados. Então, prenderam os pés de um dos seis homens com uma corrente, amarraram o corpo a uma moto e arrastaram-no pelo asfalto – para dissuadir aqueles que desejassem fazer o mesmo.

É uma forma arcaica de profanar os cadáveres, não muito diferente da descrição da Ilíada de Homero de quando Aquiles arrasta o corpo de Heitor com sua carruagem em torno de um túmulo. Os líderes do Hamas e a polícia fizeram questão de condenar o ato, e disseram que haverá uma investigação, mas muitos na cidade concordam com as execuções.

Embora a luta tenha parado, os mortos e os pesadelos permanecem. Os pais nos campos de refugiados dizem que seus filhos acordam gritando à noite, depois de sonhar com israelenses invadindo suas casas, destruindo tudo e matando seus irmãos, ou com ficar trancado durante os ataques e não conseguir fugir.

Mortos por um teleguiado
Metade do 1,7 milhão de pessoas em Gaza é de crianças. Segundo fontes palestinas, cerca de 30 crianças morreram nesta guerra de oito dias, de um número de mortos total de mais de 160, metade de civis. Um dos mortos, Zaki Kadada, de 43 anos de idade, era filho de um pescador. Kadada tinha 1,70 metro de altura e nasceu no dia 3 de julho de 1969. Seu grupo sanguíneo era O positivo, e ele tinha olhos castanhos claros e cabelos pretos. Pelo menos é o que sua carteira de identidade dizia – quando foi levado para o hospital, ele estava sem cabeça.

Ele morreu em sua SUV na parte sul da Cidade de Gaza cerca de 3h30 da terça-feira (27), um dia antes do cessar-fogo, depois das orações do meio-dia, depois de uma xícara de chá, e depois de dizer a seus filhos para pararem de brincar e fazer a lição de casa. Ele estava a caminho de um funeral quando foi atingido e morto por um teleguiado. Talvez tenha até sido pelo orgulho da força aérea israelense, o novo teleguiado "Eitan", batizado com uma palavra hebraica que significa "forte". O Eitan pesa mais de quatro toneladas e tem uma envergadura tão grande quanto um Boeing 737.

Quando o levaram para o hospital, naquela tarde fatal da semana passada, a multidão de curiosos era tão densa que os paramédicos tiveram dificuldades para retirar o corpo da ambulância. "Os mártires são os preferidos de Deus", gritavam. Em seguida, colocaram-no no necrotério, atrás da tela de vídeo que o Hamas usa par amostrar vídeos de propaganda glorificando os atos heróicos de seus combatentes.

Quando seu sobrinho Taufik veio para identificar o corpo, só foi capaz de reconhecer o corpo decapitado pelo telefone celular. Ele era um bom homem, um civil e um herói, disse Taufik, e deixou uma esposa, uma mãe, dez irmãos, quatro irmãs, quatro filhas e três filhos: Shaima, 16, Jihan, 15, Muamin, 11, Mohammed , 9, Basan, 7, Hala, 3 e Yussuf, 7 meses.

Hala, que leva o nome do halo de luz em torno da lua, ficou acordada a noite toda perguntando onde estava seu pai, diz um primo. Ele está no paraíso, disse à menina, mas Hala não entendeu.

“Eles nunca vão parar de nos matar”
O corpo não foi lavado com água limpa, sabão ou água de rosas, nem enrolado em três panos, como é de costume. Porque Kadada morreu violentamente, como um mártir, um shahid, será enterrado nas roupas encharcadas de sangue que usava quando morreu. Para os muçulmanos devotos, os corpos dos mártires são perfumados mesmo sem água de rosas, e seu caminho é direto ao paraíso.

Quando questionado sobre a morte de Kadada, um porta-voz do exército israelense disse que foi um ataque com alvo, e que havia suspeitos de terrorismo no carro. Ele ressalta que houve uma segunda explosão depois do ataque, sugerindo que havia armas no carro.

A segunda explosão, se é que houve alguma, foi do tanque de combustível, dizem os familiares da vítima. Além disso, acrescentam, todos no bairro sabem que Kadada não era um terrorista, mas um civil, guarda-costas de um político da Fatah, o movimento moderado que agora tem pouca influência na Faixa de Gaza. Além disso, o homem que ele deveria proteger estava em Ramallah quando o veículo foi atacado.

Kadada foi carregado para seu túmulo no dia seguinte. A família não foi ao cemitério principal, porque é muito próximo da fronteira com Israel, mas para o pequeno, lamacento e lotado Cemitério Sheikh Radwan. Centenas compareceram ao funeral, de cabeças baixas. Não havia mulheres, como é o costume islâmico. Os homens ficam ao redor da sepultura, afofam a terra e levam pedras para o local. "Zaki", diz um homem, "todos os homens aqui te amam!" Então ele derrama água no solo e diz: "Beba".

Um primo faz uma oração, com as palmas das mãos erguidas para o céu, enquanto teleguiados monitoram o espaço acima do cemitério. "Eles nunca vão parar de nos matar", disse ele, "mas esta continua sendo a terra de Deus, um país livre."

Na casa da família, na parte ocidental da cidade, no Mediterrâneo, sua mãe está ao lado de outras mulheres. Sirya Kadada, 80, acaba de perder seu filho, o melhor garoto que alguém podia imaginar, diz ela. Ela chora enquanto pega um telefone celular com uma foto do filho na tela. "Habibi, Habibi", diz ela, "meu querido, meu querido”. Ainda chorando, ela beija a tela. E todos na sala começam a chorar.

Como ela se sente em relação às pessoas que mataram seu filho? Ela para, olha e diz: "Esperamos que Deus se vingue dessas pessoas."

Um comentário:

  1. "Nós somos cobaias, e os israelenses estão testando suas armas conosco", diz o ministro. "Eu fui cirurgião por três anos, e venho de Gaza, mas eu nunca tinha visto nada parecido com isso."==== Qual a novi//? Isso vem acontecendo há mt anos...infeliz/.Sds.

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