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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Der Spiegel: Massacre abre debate sobre a cultura das armas nos Estados Unidos


A América está chorando, rezando e discutindo leis de armas mais fortes depois do tiroteio na escola em Newtown, Connecticut, na sexta-feira (14). Mas esse último massacre aterrorizante provavelmente não mudará nada. A propriedade de armas é um elemento importante, embora mal orientado, da identidade nacional do país.

Nancy Lanza amava seu quintal - e suas armas. "As armas eram seu hobby", disse ao "Washington Post" o paisagista de Lanza, Dan Holmes. "Ela me disse que gostava da concentração do tiro."

A mulher de 52 anos era bem conhecida na comunidade de Newtown, Connecticut. Ela era frequentadora do bar local Miyagi Place e participava de "noites de senhoras" para jogar dados com amigas. Mas raramente falava sobre seu filho de 20 anos, um rapaz silencioso, que muitas vezes ela levava para a raia de tiro. Ela possuía três armas - duas pistolas e um rifle semiautomático de alta potência feito pela Bushmaster, um fabricante favorito dos militares.

Foi com suas próprias armas que Lanza, a boa vizinha, se tornou ao mesmo tempo a primeira vítima do massacre em Newtown na sexta-feira e, no sentido mais cínico, uma cúmplice inadvertida do perpetrador. Esta triste combinação reflete a desesperança do novo e inútil debate sobre a mania das armas nos EUA.

Segundo a investigação inicial, o filho de Lanza, Adam, atirou nela antes de ir para a escola elementar Sandy Hook com o Bushmaster AR-15 da mãe para depois matar mais 26 pessoas - entre elas 20 crianças pequenas - antes de se matar. No sábado (15) à noite o legista divulgou os nomes das vítimas. Quando o governador de Connecticut, Dannel Malloy, informou aos pais, alguns deles teriam desmaiado de dor.
Identidade nacional ultrapassada

A América está lamentando, chorando e rezando. As pessoas falam em destino, tragédia e no demônio. Mas esse não foi um desastre natural descontrolado que caiu sobre os EUA, como aconteceu tantas vezes antes. É mais uma vez o resultado inevitável de uma cultura nacional que não é abraçada apenas pela margem facilmente rejeitada. Também é abraçada por pessoas boas e inofensivas como a senhora Lanza, que tinha em seu armário um rifle de assalto de grau militar.

Mais uma vez, os EUA estão discutindo as leis de armas, mesmo que a discussão provavelmente seja curta e inconclusiva. Mas a verdadeira coisa que deve mudar (embora dificilmente mude) é o engano de que o mito formador da América, a "liberdade", permite que as armas sejam tão generalizadas quanto os telefones celulares.

"Eu passei a perceber que na essência esse é o modo como nós, americanos, queremos que as coisas sejam", escreve Gregory Gibson, cujo filho Galen foi morto em um tiroteio em 1992, em um triste ensaio para "The New York Times".

Por quê? Porque as armas são há muito tempo uma parte da identidade nacional americana. Isso pode ter sido apropriado no tempo em que as potências coloniais, a fronteira e o mito do Estado central maligno ameaçavam as pessoas. Desde então, porém, tornou-se fatalmente contraproducente, não importa a garantia da Segunda Emenda do "direito de manter e portar armas".

Hoje a arma parece uma relíquia de uma era que em breve terá desaparecido. Mas quanto mais depressa ela se desintegra, mais desesperadamente as pessoas buscam as relíquias. É provavelmente o que o então candidato presidencial Barack Obama quis dizer em 2008 quando descreveu os temores existenciais de eleitores principalmente brancos da classe trabalhadora, que segundo ele "se agarram às armas ou à religião ou à antipatia por pessoas que não são iguais a eles, ou o sentimento anti-imigrante ou sentimento anticomércio como uma maneira de explicar suas frustrações".  

Um slogan vazio
Foi uma formulação infeliz e mal compreendida, embora uma que ainda é bastante adequada. A América continua mergulhada em uma profunda rebelião que perturbou muitos. O "sonho americano" dos primeiros tempos do país é hoje apenas um slogan vazio, do qual se abusa com proeminência durante as campanhas eleitorais. A inquietação sentida por muitos foi exposta pela recessão que destruiu a ilusão de que a prosperidade estava ao alcance de todos. E foi revelada pela reeleição de Obama, o resultado de uma nova América em que a maioria logo estará em minoria.

A autoafirmação através da força armada: essa é a fantasia cada vez mais atraente defendida por ambos os lados - tanto entre perpetradores como entre aqueles que se consideram potenciais vítimas. Depois de cada tiroteio, um coro de vozes invoca de maneira confiável o argumento de que o crime poderia ser evitado se todo mundo tivesse permissão para portar uma arma.

Não, não mais estrita, mas leis mais brandas teriam evitado o massacre de Newtown, dizem os republicanos. Elas podem significar a "diferença entre a vida e a morte para os observadores inocentes", disse o porta-voz do presidente da Câmara dos Deputados de Michigan, Jase Bolger, sobre uma lei recém-aprovada no estado que tornaria mais fácil levar armas escondidas para as escolas.

O conto de fadas da autodefesa 
Larry Pratt, diretor do lobby das armas Donos de Armas da América, acusa até as leis relativamente estritas de armas de Connecticut pela tragédia. "Além do atirador, há sangue nas mãos dos membros do Congresso e dos legisladores de Connecticut que aprovaram a proibição de armas em todas as escolas do estado (e da maioria dos outros)", ele escreve no site do grupo. "São eles que tornaram ilegal defender-se com uma arma em uma escola, quando essa é a única maneira eficaz de resistir a um atirador".

Esse velho conto de fadas da autodefesa é popular no lobby pró-armas. Ele também foi estatisticamente refutado. Os civis que atiram de volta geralmente erram. E os autoproclamados defensores da lei e da ordem muitas vezes atingem o alvo errado, como Trayvon Martin, na Flórida. Ou Jordan Davis, 17, que levou um tiro em um posto de gasolina recentemente porque o som em seu carro estava alto demais.

A loucura continua. As estatísticas, muitas vezes citadas novamente desde sexta-feira, são bem conhecidas. Os EUA lideram o mundo em mortes a tiros, com cerca de 30 mil pessoas mortas por armas a cada ano. Mas toda vez que há um grande tiroteio as vendas de armas aumentam. Nos dias que se seguiram ao banho de sangue no cinema em Denver, em julho passado, o número de verificações para compra de armas no Colorado aumentou 41%. Depois do tiroteio de 2011 em Tucson, Arizona, que deixou seis mortos e a congressista Gabby Giffords criticamente ferida, as vendas de armas subiram 60%.

O poder do lobby das armas 
A crença na propriedade de armas está tão profundamente arraigada que nenhum desses dramas provocou qualquer debate real sobre o assunto. Pelo contrário, a opinião pública tende a favorecer as armas. Os que se manifestam a favor de leis mais estritas, mesmo os bem-sucedidos como o prefeito de Nova York, Mike Bloomberg, são considerados desmancha-prazeres, forasteiros ou do contra.
A opção das palavras no debate também revela sua progressão para favorecer a propriedade de armas. O estatístico do "The New York Times" Nate Silver relata que a expressão "controle de armas" está sendo usada com menos frequência na discussão política. Em vez disso, o termo é cada vez mais substituído por "direito às armas".

Essa é uma clara vitória do grupo lobista pró-armas como a NRA (sigla para Associação Nacional dos Rifles). Juntamente com grupos semelhantes menores, a NRA investiu cerca de US$ 3 milhões nas últimas campanhas presidencial e para o Congresso, mais do que aplicaram desde 2000. Cerca de 96% desse dinheiro foram para candidatos republicanos.

A NRA conseguiu sozinha explorar politicamente a situação emocional do país. Isso se tornou mais drasticamente visível em 1994, quando Bill Clinton assinou a Lei Brady, que exige a verificação do registro policial das pessoas para a compra de armas de fogo. A nova lei irritou tanto os republicanos que mais tarde eles se mobilizaram para conquistar a maioria na Câmara de Deputados pela primeira vez em meio século.
Os democratas não esqueceram essa lição. Segundo o "New York Times" de sábado, depois do tiroteio no Arizona em 2011, o Departamento da Justiça dos EUA criou uma lista detalhada de passos para reforçar o controle de armas. Mas essas sugestões foram rapidamente colocadas no gelo quando a campanha eleitoral começou para valer.

Política e emoções são uma combinação insuperável. Mas o massacre de Newtown vai mudar isso? Pessoas como o prefeito Bloomberg esperam que sim. Outras, como o pai enlutado Gregory Gibson, são céticas. "Queremos nossa liberdade e queremos nossas armas de fogo, e se tivermos de suportar um tiroteio ocasional em uma escola, que seja", ele escreve. "Uma terrível vergonha..."

3 comentários:

  1. O número de mortes por armas de fogo nos EUA é aproximadamente 9 mil por ano e não 30 mil e esse número vem diminuindo à cada ano, mesmo com o número de armas em circulação aumentando. O país campeão em mortes por armas de fogo é o desarmado e "pacífico" BRASIL.
    Uma coisa que me chama atenção é por que nenhum jornalista escreve porque que estes ataques sempre acontecem nas gun-free zones que mais parecem um imã de psicopatas.

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    1. Eu não ousaria contestar um dado da Der Spiegel. Mas ainda que fosse 9 mil, eu acho muito para um país com IDH elevadíssimo e por ser a nação mais rica do mundo.

      O Brasil não é campeão em mortes por armas de fogo, onde você viu isso? Veja dos dados da Venezuela, Guatemala, Suazilândia, Colômbia e compare com o Brasil.

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    2. Os dados estão errados. Eu estou de pose de um dado que diz que em 2011, cerca de 12.664 pessoas foram assassinados por algum tipo de armas, das coisas 68% foram assassinados por armas de fogo.

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