Tom Marcum posa com os filhos Jared (esq) e Gabriel, e com a mulher, April, em sua casa em Ray City, na Geórgia |
April e Tom Marcum namoraram na escola e se casaram logo após a formatura. Durante anos, segundo ela, Tom foi um marido apaixonado, que deixava bilhetes de amor no computador ou em sua bolsa. Hoje, a coisa mais próxima de recados que eles trocam são os lembretes que ela coloca em seu celular para que ele tome seu remédio quatro vezes ao dia.
Ele normalmente os ignora e ela acaba tendo que obrigá-lo a tomar as pílulas.
Desde que Tom Marcum voltou de duas missões no Iraque, em 2008, com uma lesão cerebral e estresse pós-traumático, sua esposa deixou o emprego de professora para cuidar dele. Ela viu as economias de uma vida chegarem ao fim e teve de se ajustar a uma relação inteiramente nova com seu marido, que enfrenta uma série de problemas debilitantes incluindo a perda de memória e dificuldades de controle dos impulsos e da raiva.
"A maior perda é a perda do homem com quem me casei", disse Abril Marcum, descrevendo o seu marido agora como uma pessoa desconectada nos melhores dias, violenta nos piores. "Seu corpo está aqui, mas sua mente não está. Vejo lampejos, mas ele já não é quem costumava ser.”
Ela entrou para uma crescente comunidade de cônjuges, pais e parceiros que enfrentam problemas com entes queridos que retornam da guerra diferentes e não conseguem mais cuidar de si mesmos. Trabalhos, hobbies, amigos, até mesmo as obrigações dos pais com filhos pequenos caem no esquecimento. Famílias gastam suas poupanças e pais mais velhos mergulham em fundos de aposentadoria. Mesmo enquanto sofrem com as lesões de um membro da família, eles lutam para se ajustar à nova rotina e a relacionamentos reconfigurados.
A nova vida custa caro. Muitos dizem se sentir ansiosos, deprimidos ou exaustos. Eles ganham peso e enfrentam problemas de saúde. Em suas visitas agora frequentes à farmácia, eles têm cada vez mais que comprar remédios para si mesmos também.
Embora tenham o conforto do retorno de seus entes queridos, eles questionam se podem suportar a potencial tensão de anos ou mesmo décadas de cuidados.
"Fiz as malas, liguei para meus pais e disse que estava voltando para casa", disse Andrea Sawyer, cujo marido tentou o suicídio depois que voltou do Iraque com estresse pós-traumático. "Mas não vou. Nunca cheguei a sair da casa."
Aqueles que cuidam dos gravemente feridos precisam ajudar seus cônjuges ou filhos adultos nas funções diárias mais básicas. Outros, como April Marcum, atuam como monitores de segurança, mantendo os entes queridos fora de perigo. Eles os levam a intermináveis consultas médicas e administram complicados regimes de medicação.
Um dos aspectos mais frustrantes da nova vida, segundo eles, é a burocracia que enfrentam no Departamento de Defesa e no Departamento de Assuntos de Veteranos, principalmente os problemas com o agendamento de consultas médicas.
Uma variedade de serviços de assistência são oferecidos aos gravemente feridos. Mas muitos membros da família não querem que seus entes queridos sejam colocados em asilos e buscam apoio para serviços de saúde em casa, algo muitas vezes insatisfatório ou indisponível.
Apesar do jeito alegre de April Marcum, ela começou a tomar antidepressivos e um medicamento antiansiedade. Ela desenvolveu hipertensão, toma esteróides para uma doença brônquica que pode ser relacionada a estresse e usa aparelho para aliviar um problema na mandíbula. "Vi todos os meus sonhos desaparecerem", disse ela.
Ao longo dos últimos anos, organizações de defesa como o Projeto Guerreiro Ferido pressionaram o Congresso a aprovar uma lei que prevê compensação financeira direta e outros benefícios para as pessoas da família responsáveis por cuidar de membros do serviço militar. Até meados de setembro a agência havia aprovado 1.222 pedidos de veteranos, com uma média de salários mensais de US$ 1,6 mil a US$1,8 mil. Esses familiares também podem receber seguro de saúde e aconselhamento.
"Sabemos que isso não substitui a renda perdida", disse Deborah Amdur, que supervisiona o apoio dos familiares para a agência. "Mas é um reconhecimento do sacrifício que está sendo feito.”
Rosie Babin, 51, era gerente de um escritório de contabilidade quando uma bala atravessou o abdômen de seu filho Alan, em 2003. Ela e o marido correram para o Centro Médico Militar Walter Reed e ficaram ao seu lado quando Alan, então com 22 anos, chegou do Iraque. Ele perdeu 90% de seu estômago e parte de seu pâncreas. Seus rins pararam de funcionar e ele teve um acidente vascular cerebral, que o deixou com danos cerebrais. Ele eventualmente foi submetido a mais de 70 operações e passou dois anos em hospitais, disse sua mãe.
Rosie lutou contra esforços dos militares de colocar seu filho em uma casa de repouso, insistindo que ele fosse colocado em uma clínica de reabilitação, e depois conseguiu cuidar dele em casa.
Mas, desde então, seu médico prescreveu medicação para pressão arterial e pílulas para dormir. Agora, embora profundamente grata pela recuperação notável de seu filho – ele usa uma cadeira de rodas e recuperou um pouco da fala – ela se lembra com tristeza dos dias em que sonhava em viajar e fazer aulas de dança com seu marido. Em vez disso, ela ajuda Alan a entrar e sair da cama, usar o banheiro e tomar banho.
"Senti como se tivesse passado de uma mulher de negócios extremamente ativa a uma vítima da guerra", disse ela. " E eu estava trabalhando furiosamente para não me sentir como uma vítima da guerra".
Uma pesquisa realizada com os responsáveis pelos cuidados de membros do serviço militar após o 11 de Setembro de 2001 está apenas começando, disse Joan M. Griffin, uma pesquisadora do Sistema de Cuidados de Saúde Minneapolis VA que está conduzindo um estudo desse tipo.
O que faz da população de pacientes recebendo cuidados tão diferente, segundo Joan, é a sua relativa juventude. "O VA não recebia uma quantidade significativa de pacientes nessa faixa etária desde o Vietnã", disse ela. Como resultado disso, os cuidadores precisarão "prestar ajuda por muito tempo".
Um estudo anterior descobriu que um em cada cinco membros do serviço militar que voltam ao país tem sintomas de estresse pós-traumático ou depressão.
A pesquisa de Joan mostra que muitos membros da família passam mais de 40 horas por semana cuidando de seus entes queridos. Metade considera que não tem escolha.
"Eles se sentem presos", disse Joan.
Alguns vão embora.
April Marcum, 37, que é casada há 18 anos com Tom, 36, e tem dois filhos, de 11 e 14 anos, nunca cogitou ir embora. "Sou sua mulher e esse é o meu trabalho. Se ele está machucado ou não, preciso garantir que esteja bem", disse ela.
Tom Marcum, que sofreu vários ataques com morteiros no Iraque, um dos quais o deixou inconsciente, foi eventualmente diagnosticado com lesão cerebral e estresse pós-traumático.
"Imagino que minha esposa tenha se sentido como uma mãe solteira por um tempo", disse Tom, que agora é médico aposentado da Força Aérea. "Ela teve que criar dois meninos. E agora, às vezes, ela provavelmente pensa que ela criando um terceiro".
Ela tem encontrado alívio em um retiro de fim de semana para esposas de militares em situação similar e em um grupo privado no Facebook, onde os parentes se reúnem para falar, oferecer apoio emocional e trocar conselhos práticos. Os participantes dizem que comunidades online como esta são muitas vezes mais favoráveis do que suas próprias famílias, que muitas vezes somem diante da mudança.
Pelo menos financeiramente, as coisas estão melhorando para a família Marcum. April foi premiada com o nível mais elevado de cobertura através do programa da agência de veteranos, que lhe ofereceu uma bolsa mensal de US$ 1.837. Terapia física, ocupacional e de fonoaudiologia têm ajudado a melhorar o estado de seu marido, mas ela teme que o progresso já tenha atingido o seu ápice. "Estamos no mesmo local há algum tempo", disse.
Apesar de orgulhosa do serviço de seu marido, April se sente culpada por nenhum deles trabalhar e espera que um dia possa voltar a ter um emprego, enquanto continua a cuidar dele.
Ela imagina a si mesma trabalhando em algum lugar descontraído, como uma loja Hallmark, onde poderia conversar com as pessoas e ajudá-las a escolher cartões e presentes. Seria uma fuga, disse ela, do estresse que vive em casa.
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