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segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Líbia não segue os passos do Iraque

As novas autoridades vão manter altos cargos e oficiais que romperam com o regime. Os rebelados se preparam para realizar eleições em 18 meses
São dias de euforia na Líbia, um país de 6 milhões de habitantes que sofreu um cataclismo. Deposto, isolado política e militarmente, Muammar Gaddafi escolheu, depois de 42 anos de ditadura, seguir os passos de Saddam Hussein, o tirano iraquiano capturado em um úmido buraco cavado em sua província natal de Tikrit. O futuro é promissor, dizem muitos líbios: os líderes rebeldes preparam uma transição democrática para realizar eleições dentro de 18 meses, agora que o dinheiro congelado pela ONU do regime do déspota começa a suprir os cofres do governo rebelde. Mas sobre a Líbia também se agregam nuvens pesadas, próprias de um país com estruturas políticas e sociais raquíticas, ou simplesmente inexistentes.

Nem o Ocidente, nem a Rússia nem a China desejam que se repita neste imenso país o desastre do Iraque. O gás e o excelente petróleo líbio ajudarão muito em um país sem dívidas, e os grandes investimentos de que a Líbia necessita são uma atração apetitosa. Mas se os líbios não começarem a desfrutar de um mínimo de prosperidade, o risco de que a euforia se torne uma depressão violenta - em que lar não há uma arma? - não é desprezível.

As diferenças entre os dois países são notórias. O Iraque foi invadido em 2003 por uma coalizão encabeçada pelos EUA que impôs seus vicerreis, acompanhados por um governo deplorável, que ignorava quase tudo sobre a Mesopotâmia e decidiu desmantelar o exército e o todo-poderoso partido Baath depois de fazer vista grossa para o saque das instituições.

Sete anos depois, este enviado comprovou que os moradores de Bagdá tinham apenas quatro horas de eletricidade por dia; os cidadãos amaldiçoavam uma classe política incapaz de formar governo durante meses e de prestar os serviços básicos, e os atentados terroristas, alimentados pela fratura religiosas, eram e são moeda comum.

Na Líbia foram seus médicos, advogados, desempregados, operários e estudantes que derrubaram - com a imprescindível ajuda da Otan - o déspota fugitivo. Liberais, nacionalistas e islâmicos lutaram juntos. Conseguiram ao menos ser livres para falar. Mas, a partir do instante em que Gaddafi seja detido ou caia morto, tudo são incógnitas.

Há muitos receios. Não faltam cidadãos que desconfiam de dirigentes políticos e comandantes militares que abandonaram o regime no último minuto. A outros, desagrada que alguns ministros passem mais tempo em capitais estrangeiras do que em seu país. Outros veem com maus olhos que exilados proeminentes se transformem em dirigentes. O prudente presidente do Conselho Nacional de Transição (governo rebelde), Mustafah Abdel Yalil, deveria ter em mente a experiência iraquiana quando afirmava dias atrás: "Quem tiver ocupado altos cargos no regime de Gaddafi e não tiver desertado não terá lugar no futuro político do país". Ele promete que não haverá expurgo no estilo aplicado no Iraque com a "des-baathificação". É imprescindível que o governo funcione logo. A polícia já começou a patrulhar Trípoli.

O exército, desprezado por Gaddafi, é farinha de outro saco. Se no Iraque foi posto em debandada e até hoje os novos recrutas e oficiais precisam de assessoria dos EUA, na Líbia a maioria dos militares passou para o lado rebelde nos primeiros dias da revolta. Pode-se contar com eles para refundar as forças armadas.

Colocar nos eixos a vida política também será tarefa árdua. É certo que será fundada - na Líbia não há partidos - uma formação islâmica com um programa muito diferente do de muitos liberais que seguram as rédeas do país. E na reforma constituinte que se anuncia deverá ser elucidado o dilema - que se colocava na Tunísia depois da fuga de Zine el Abidine ben Ali - sobre o sistema presidencialista ou parlamentar. Os iraquianos claramente preferem um dirigente eleito, mas com poder. Na Líbia, parecem optar pela via parlamentar. Mas com uma vantagem: não convivem credos diferentes como no Iraque, onde xiitas e sunitas combateram selvagemente em 2006 e 2007. A Líbia é um país religiosamente homogêneo e, além disso, seus vizinhos (Tunísia e Egito) não vão intervir em seus assuntos internos, como houve ingerências no Iraque. Um diplomata acreditado em Bagdá contava que o primeiro-ministro Nuri al Maliki "despacha em Teerã antes de voltar", quando viaja ao estrangeiro.

Temem-se também as tensões tribais - a tribo obeidat, a que pertencia Abdel Fatah Yunes, o chefe do exército rebelde assassinado recentemente, jura fazer justiça com as próprias mãos se o crime não for resolvido imediatamente -, a rivalidade entre Benghazi e Trípoli (no Iraque, o Curdistão anda por conta própria), a brecha de gerações e a corrupção que possa gerar - em Bagdá foi descomunal - a enorme riqueza do petróleo líbio. O futuro é incerto e as expectativas são altas no país de Abdul Alshnag, que se pergunta: "Por que não somos Dubai?"

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