Milhares de pessoas vãos as ruas de Bayda, Líbia, protestar contra o ditador Muamar Al-Khaddafi |
Governos e instituições como o Fundo Monetário Internacional e o Banco de Investimento Europeu foram muito rápidas em oferecer ajuda financeira ao Egito, Tunísia e outros países do Oriente Médio que estão dando passos hesitantes em direção à democracia.
Mas qualquer que seja o motivo por trás das ofertas – benevolência, incentivo à uma governança ao estilo ocidental ou ajuda para a expansão de empresas ocidentais – o modelo tradicional usado pelos credores multilaterais parece cada vez menos apropriado para a região e difícil de implementar, dizem os analistas.
“Há uma contradição potencial no fato de que o modelo econômico de que esses países precisam, e que está em oferta, perdeu a credibilidade”, disse Mark Malloch Brown, ex-vice-secretário geral da ONU. “Os programas econômicos liberais que esses países tenderam a adotar nos últimos anos estavam comprometidos pelos regimes, que enriqueciam a si mesmos e a seus amigos.”
Encontrar um modelo econômico para substituir o pseudo capitalismo é essencial para lidar com outros problemas prementes da região, que incluem o alto desemprego, orçamentos apertados, alta inflação, e falta de investimento.
O FMI estima que Egito, Jordânia, Líbano, Marrocos, Síria e Tunísia todos tenham taxas de desemprego de cerca de 11%, que quase não mudaram ao longo das duas últimas décadas. O desemprego dos jovens em média excede os 40%.
O Egito, Iêmen, Tunísia e Síria devem experimentar recessão este ano à medida que a atividade econômica se contraiu após as revoltas, disse o Instituto Internacional de Finanças recentemente.
Um relatório do FMI em maio disse que as necessidades de financiamento externo de países importadores de petróleo do Oriente Médio e do Norte da África passarão dos US$ 160 bilhões ao longo dos próximos três anos.
Este mês, líderes do Grupo dos 8 países industrializados prometeram US$ 38 bilhões para ajudar a apoiar a transição para a democracia em meio a queixas de que muito pouco do pacote de ajuda de US$ 20 bilhões prometido em maio havia se materializado. Estados árabes ricos como o Catar, Kuwait e Arábia Saudita também ofereceram bilhões, bem como aumentar seus gastos para tentar impedir a inquietação interna.
O FMI disse que poderia fornecer US$ 35 bilhões em empréstimos para a região, e o Banco Mundial anunciou planos em maio para emprestar US$ 6 bilhões ao longo de dois anos para o Egito e a Tunísia.
Ao lado dos estados do Golfo, a Europa pode ter um papel central: ela responde por mais de três quartos da exportação de bens da Tunísia, lucros com o turismo, envio de dinheiro por parte de trabalhadores e investimentos.
Uma ferramenta de apoio seria o Banco Europeu de Investimento (BEI), que tem a missão de apoiar a estabilidade e a construção das nações nos países parceiros da União. No início do verão, os membros da União concordaram que o BEI poderia aumentar os empréstimos para o Oriente Médio num processo que deverá ser ratificado em breve. Isso daria ao banco quase US$ 6 bilhões disponíveis em financiamento para a região até 2013.
O Egito deve receber cerca de metade desses fundos para a região, seguido pelo Marrocos, Tunísia e Jordânia. A União Europeia também está oferecendo à Líbia acesso aos empréstimos do BEI, caso um novo governo busque assistência.
Outro veículo será o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento, estabelecido em 1991 para ajudar países do leste europeu e da ex-União Soviética a fazerem a transição para economias de mercado e governo multipartidário depois do colapso do comunismo.
Em julho, seu comitê aprovou expandir os empréstimos ao Oriente Médio, como parte de um processo que pode incluir um empréstimo de US$ 2,5 bilhões para a região anualmente. Um fundo inicial poderia começar empresando para o Egito na próxima primavera, concentrando-se na agricultura, manufatura, serviços municipais, transporte urbano e bancos. O objetivo seria atrair investidores privados para compartilhar os riscos.
De forma semelhante, o braço de investimentos privado do Banco Mundial, o International Financial Corp., também está se mobilizando. Mas apesar desses esforços, a resposta da região tem sido mista.
Como a África do Sul após o apartheid, o Egito parece desconfiado dos motivos por trás das ofertas.
“O Egito recebeu a oferta de US$ 17,5 bilhões de diferentes promessas e compromissos”, disse Gouda Adbel-Khalek, ministra egípcia da solidariedade e justiça social. “Muito pouco se materializou e boa parte disso é propaganda. Todo mundo está lutando por uma posição e tentando promover seus próprios interesses.”
Parte da questão parece ser o medo de estar associado com credores ou políticas ligadas ao ocidente ou aos regimes anteriores. Na Tunísia, por exemplo, até setembro de 2010, o FMI ainda se vangloriava do “gerenciamento macroeconômico e das reformas estruturais” do regime do presidente Zine al-Abidine Bem Ali. E o fundo pedia políticas impopulares para conter os gastos públicos com salários, alimentação e subsídios aos combustíveis.
Em junho, os governantes de transição do Egito no Conselho Supremo das Forças Armadas cancelaram os planos de emprestar US$ 3 bilhões do FMI bem como empréstimos do Banco Mundial, argumentando que o governo já tinha cortado seu déficit orçamentário. O conselho indiciou que as condições de empréstimo violariam a soberania, e que temia uma revolta popular contra os termos potencialmente restritivos. Há também um medo de passar uma dívida ainda maior para a próxima geração.
Os europeus em particular terão que lidar com cuidado com os novos governos, tendo assinado acordos de parceria com os antigos ditadores e os cortejado. A Europa também está constrita por sua crise fiscal e não está disposta a ganhar confiança abrindo suas fronteiras para imigrantes do norte da África. E diferentemente do caso do leste europeu, Bruxelas não está disposta a oferecer aos países da Primavera Árabe a possibilidade de entrada na UE. Isso deixa a Europa com pouco a oferecer a não ser empréstimos leves e acesso ao mercado.
Enquanto isso, grupos de pressão foram alertados sobre os efeitos colaterais potencialmente negativos da expansão dos credores multilaterais na região.
A CEE BankWatch Network, uma organização não governamental que monitora instituições internacionais na Europa Central e do Leste, argumenta que é prematuro para o Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento financiar o norte da África “quando não está claro, de forma alguma, que tipos de governos se seguirão aos regimes recentemente derrubados.”
Em julho, ele alertou que o BEI e o BERD “operam com ordens políticas vagas” da União Europeia, e que “as instituições políticas da UE exercem controle limitado sobre as atividades bancárias”.
Em junho, duas outras organizações não governamentais, a Counter Balance e a Network for Develpment, levantaram preocupações sobre os danos que a ajuda ocidental poderia causar à transição democrática. Elas argumentaram que instituições de fora vêm promovendo os mesmos modelos econômicos injustos contra os quais os protestos emergiram.
Philippe de Fontaine Vive, vice-presidente do BEI para o sul do Mediterrâneo, disse que os compromissos do banco terão que ser baseados em “fundações sólidas” e nos “seus 40 anos de trabalho na região, bem como os esforços que fizemos para encontrar e discutir com os governos envolvidos.”
Anoush Ehteshami, professor de relações internacionais da Universidade Durham, disse que o investimento estrangeiro será essencial para criar empregos e aumentar o crescimento, mas uma nova abordagem será necessária.
“Apenas dar continuidade ao antigo modelo do FMI não deve ser produtivo no ambiente pós-revolucionário, especialmente com a necessidade inerente de intervenção estatal”, disse ele. “A chave para o Ocidente está em trabalhar em parceria com esses países e outros atores regionais como os estados do Golfo.”
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