Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina discursa na Assembléia Geral da ONU |
Abbas não ignorava que a totalidade de seus objetivos era inalcançável; que não haveria ingresso pleno porque os EUA interporiam seu veto no conselho, se esse organismo aprovasse o pedido, mas queria fazer um último gesto de desafio diante do mundo. Arafat tinha dito que a via para a independência passava por demonstrar aos EUA que era de seu interesse a criação do Estado palestino, mas, à margem de se os palestinos fizeram ou não o necessário para demonstrar que é assim, o gesto de Abbas declara estrondosamente que essa estratégia fracassou.
O presidente da AP proclamava que os EUA de Barack Obama, o presidente com maior disposição emocional para a reivindicação palestina, embora não por isso menos incapaz que seus antecessores de transformar sentimentos em realidades, haviam deixado de ser mediadores no conflito, e apenas pela ameaça de veto tinham demonstrado suas verdadeiras cores: as de um aliado implacável de Israel, ao qual pouco importam os direitos nacionais palestinos. Washington não é mais mediador, mas parte do conflito.
Mas, se era essa sua intenção, parece improvável que Abbas possa encerrar comodamente sua carreira. O conselho não tem por que se reunir de imediato e, em um prazo que pode ser indefinido, as pressões de Washington serão novamente insuportáveis para que se resigne a retomar negociações com Israel. É muito verdade que os acordos de Oslo estabelecem como única via para a paz as negociações bilaterais, mas assim como são precisos dois para dançar o tango ocorre o mesmo com a paz. E neste caso sempre há três, mas nunca dois. Três porque a AP nunca está só, mas ladeada pelo Hamas, que rumina sua impotência em Gaza, e com sua negativa a aceitar formalmente a existência de Israel mina a diplomacia de Abbas e dá razão ao governo de Jerusalém, quando este acusa o líder palestino de não ser dono nem de sua casa; e só um porque quando Israel e a AP se veem face a face a negativa sionista a congelar a colonização dos territórios esvazia de sentido a negociação. A alternativa ao veto de Washington seria apresentar um dossiê de ingresso na Assembleia Geral e esperar desta um prêmio de consolação: o ingresso como Estado, mas só a título de observador, sem voto, o que transforma o soco em um sopro.
Israel tem um futuro complicado. Turquia, hostil; e Egito, em irritação crescente, criam uma sensação de estrangulamento diplomático; e a primavera árabe, se algum dia chegar ao verão, criará problemas inéditos ao Estado sionista, como que os principais Estados árabes apoiem a causa palestina, mas então de uma realidade democrática. Israel já enfrentou, no entanto, piores temporais e não se sente especialmente encurralado, e se a ruptura da AP com os EUA se consumar será com um canto de júbilo nos dentes. Diante da Assembleia da ONU, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não hesitou em repetir o conhecido mantra de que Israel havia mais que cumprido a Resolução 242 da ONU com a retirada de Gaza em 2005.
A repisada - e ressabiada - argumentação se baseia em que o texto aprovado pelo Conselho em sua versão inglesa é gramaticalmente ambíguo ao pedir a retirada dos territórios, mas há uma versão francesa igualmente oficial que não deixa lugar a dúvidas. Se os autores da resolução quisessem permitir a Israel uma retirada à la carte, assim o teriam expressado; e por acréscimo lorde Caradon, redator do texto, afastou qualquer equívoco dizendo publicamente que eram todos, todos mesmo.
É possível que esteja começando uma nova etapa do conflito. Mas não que permita ao presidente palestino aposentar-se dizendo "dever cumprido".
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