Um dia após a China ter realizado o primeiro voo público de seu novo caça stealth, um desfecho marcante para uma visita crucial do secretário de Defesa americano, a mídia estatal deste país insistiu que os dois eventos apenas coincidiram.
Mas não houve resposta para a interpretação claramente incomodada do Pentágono para o voo: a de que os militares chineses promoveram o teste sem informar o presidente Hu Jintao, o embaraçando durante seu encontro com o secretário de Defesa, Robert M. Gates, em seu esforço para reparar as relações desgastadas entre as forças armadas dos dois países.
Enquanto Gates concluía sua visita de três dias a Pequim na quarta-feira e voava para o Japão para conversações com importantes autoridades sobre a Coreia do Norte, a agência oficial de notícias “Xinhua” da China citava funcionários não identificados do Ministério da Defesa como tendo dito que o teste do caça stealth J-20 “não visava qualquer país ou objetivos específicos”.
O voo, de um instituto de projetos de aviação na cidade de Chengdu, na região central da China, não estava relacionado à visita de Gates, disse a reportagem.
No site do Ministério da Defesa da China, um ensaio com palavras fortes pedia aos Estados Unidos para que “parassem de apontar dedos para o J-20” e reconhecessem, em vez disso, que seu próprio posicionamento de forças navais e aéreas ao redor da China representava uma maior ameaça à paz entre as duas potências.
Gates disse em uma coletiva de imprensa realizada aqui, na terça-feira, que recebeu garantias de Hu de que o teste não foi planejado para o encontro entre eles. Ao ser perguntado se acreditava nisso, Gates disse apenas: “Eu aceito a palavra do presidente Hu”.
Mas Gates disse na quarta-feira que a liderança civil da China, um grupo que inclui Hu, pareceu surpresa com o teste quando ele perguntou a respeito, levando à pergunta sobre se os líderes militares chineses buscaram de modo independente minar a visita de Gates, que visava estabelecer laços entre as forças armadas chinesas e americanas, que suspeitam umas das outras.
O secretário de Defesa reconheceu que às vezes questiona a extensão do controle civil sobre as forças armadas chinesas, uma preocupação ressaltada pelo teste surpresa de terça-feira. Mas ele também disse que acredita que os líderes políticos e militares chineses estão comprometidos em melhorar as relações.
Mas ele acrescentou um toque de ceticismo, dizendo: “Existem algumas pessoas incomodadas com isso? Possivelmente, mas certamente não me encontrei com elas na minha viagem”.
Gates falou de modo favorável a respeito de sua visita na manhã de quarta-feira ao quartel-general do comando de mísseis estratégicos da China, o Segundo Corpo de Artilharia, que raramente abre suas portas para autoridades americanas. (Donald H. Rumsfeld visitou o centro como secretário de Defesa em 2005.)
“Houve uma discussão sobre estratégia nuclear e a abordagem deles de modo geral ao conflito”, disse Gates, se referindo à política da China de não usar armas nucleares preventivamente. “Eu senti que foi uma conversa bastante abrangente, bastante aberta.”
Ele notou outro exemplo de progresso, dizendo que o comandante das forças de mísseis nucleares da China, o general Jing Zhiyuan, aceitou seu convite para visitar o Comando Estratégico dos Estados Unidos em Nebraska.
Ainda assim, o teste do caça stealth lançou uma sombra sobre a visita.
Alguns especialistas americanos em forças armadas e liderança da China sugeriram que o teste do caça pode não ter sido o tapa em Gates que pode ter parecido, e que Hu não necessariamente saberia dele de qualquer forma.
O desenvolvimento de aeronaves militares na China é realizado por fábricas locais, e decisões sobre assuntos técnicos como voos de teste são tomadas menos por políticos ou oficiais militares, e mais por engenheiros, disse Michael Swaine, um especialista em segurança chinesa e política externa do Fundo Carnegie para a Paz Internacional, em Washington.
“No mínimo, é possível, e alguns argumentariam que é bem possível, que as autoridades da liderança desconheciam que aquele teste de voo ocorreria precisamente naquele dia”, disse Swaine em uma entrevista por telefone.
Outros analistas sugerem que a publicidade extraordinária em torno do caça até então secreto, incluindo seu lançamento em uma pista de decolagem facilmente monitorável e uma série de manobras diante de dignitários visitantes, torna provável que os militares estivessem cientes de que o primeiro voo da aeronave coincidiria com a visita de Gates.
“A China deve estar ciente da sinalização política enviada por estes testes”, disse um segundo especialista em forças armadas chinesas, Abraham M. Denmark, do Centro para a Nova Segurança Americana, em Washington, em uma entrevista por telefone.
Os líderes militares, disse Denmark, “provavelmente tinham a noção política de que a realização do voo durante a visita do secretário Gates à China enviaria uma mensagem bem clara”.
“Não há motivo para não terem adiado até a partida de Gates”, ele disse.
Dito isso, acrescentou Denmark, não seria necessariamente surpreendente se Hu não estivesse ciente do momento preciso do teste.
Manobras navais americanas e outros atos significativos são rigorosamente vetados por especialistas civis no Conselho de Segurança Nacional, para assegurar que uma ação do Pentágono não tenha efeitos indesejados na política externa. Mas não existe um procedimento semelhante na China, e Hu está ocupado demais para monitorar cada teste de armas, disse Denmark.
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