Os protestos contra o presidente egípcio Mohamed Mursi e a Irmandade Muçulmana estão se tornando cada vez mais violentos. Um dos fatores que estão por trás disso é a fundação do Black Bloc [Bloco Negro, em tradução livre], um grupo de ativistas livremente organizado que não tem medo de confrontar o governo.
Eles tem um ar suspeito – cinco jovens egípcios vestindo moletons com capuz, com o rosto escondido, de braços cruzados e com os corpos em posição defensiva. "A mídia nos descreve como bandidos", diz um deles. "Eles dizem que nós estamos matando policiais e fazendo o país pegar fogo, mas estamos apenas nos defendendo. O verdadeiro agressor está sentado no palácio presidencial".
Assim como depois do dia vem a noite, os conflitos grassam violentamente nas ruas adjacentes à Praça Tahrir, no Cairo – da mesma forma que ocorreu diariamente durante a semana passada. As forças de segurança e os opositores do governo se observam furtivamente e, em seguida, as primeiras pedras são lançadas e bombas de gás lacrimogêneo são disparadas.
A violência está aumentando na capital egípcia, como também em Alexandria e nas cidades para as quais o presidente Mohamed Mursi decretou estado de emergência no domingo da semana passada: Ismailia, Suez e Port Said. Mais de 60 pessoas foram mortas desde 24 de janeiro, e centenas ficaram feridas. Os protestos contra Mursi e sua Irmandade Muçulmana tornaram-se mais radicais, e isso se deve, em parte, a novo fenômeno do Black Bloc.
Os cinco jovens são membros desse movimento. Eles sabem que seu surgimento alimentou especulações e que o governo os vê como terroristas e inimigos do Estado. Partidários do regime deposto de Hosni Mubarak supostamente se misturaram aos mascarados, afirmam funcionários do governo. Outros acusam o próprio governo de estar por trás do Black Bloc, usando o grupo como uma ferramenta para desacreditar a oposição. Mas muitos manifestantes dizem que a organização é simplesmente uma resposta à violência exercida pela Irmandade Muçulmana e seus capangas.
Para o presidente Mursi, os manifestantes vestidos de preto apresentam a oportunidade perfeita para dividir a oposição. Ele levantou a questão na semana passada, enquanto visitava Berlim, dizendo que havia uma "grande diferença entre os revolucionários e os manifestantes pacíficos" de um lado e o Black Bloc do outro. Não é verdade que a Alemanha também já teve que lidar frequentemente com desordeiros desse tipo?, ele perguntou. Mursi acrescentou que o sistema legal do Egito irá cuidar do problema.
"Nós não somos criminosos", rebate Gika, de 33 anos, um dos cinco homens mascarados. "Somos cidadãos livres que amam este país". Ele escolheu esse pseudônimo porque o nome pertenceu a um conhecido ativista que foi morto durante confrontos de rua com a polícia, em novembro passado.
Ódio unificado ao governo
Em 25 de janeiro passado, dia que marcou o segundo aniversário da revolução egípcia, o Black Bloc anunciou sua formação na internet. Um vídeo postado no YouTube mostrava imagens de jovens com aparência de militantes no Cairo, atirando coquetéis molotov. Muitos deles usam as máscaras sorridentes de Guy Fawkes, que se tornaram a marca registrada do grupo de hackers Anonymous.
"O Black Bloc está presente em todos os lugares onde são cometidas injustiças contra um povo", diz Gika. "Começamos a usar máscaras para que as forças de segurança não conseguissem nos identificar. E os membros das forças também começaram a usar máscaras desde que nós os filmamos atirando de propósito nos olhos de manifestantes".
Ninguém sabe quantos membros o Black Bloc tem no Cairo e em outras cidades, diz Gika. Ele afirma que viu cerca de 300 homens mascarados na Praça Tahrir, e que um número cada vez maior de egípcios estão vestindo máscaras pretas sobre suas cabeças para demonstrar seu ódio unificado pelo governo e pelos islâmicos. O próprio grupo de Gika, que segundo ele não tem hierarquia nem ninguém para ditar as ordens, coordena suas ações principalmente por meio de mensagens de texto e do Facebook.
Quando questionado sobre o objetivo do grupo, Gika responde: "Nós queremos defender a revolução. Proteger todos os revolucionários dos ataques da Irmandade Muçulmana e de outros bandidos. Apenas 5% dos nossos atos são atos de vingança".
Mas ações como atear fogo a pneus na frente da casa do presidente, na província de Sharkia, ou bloquear linhas de bondes eléctricos em Alexandria são, na verdade, vingança. Um vídeo do YouTube, intitulado "Black Bloc Egypt" mostra a sede da Irmandade Muçulmana em chamas – uma clara ameaça.
Gika está desempregado há dois anos. Ele diz que, como centenas de milhares de outros egípcios, sente que Mursi e a Irmandade Muçulmana traíram a revolução. Ele não está feliz com o desempenho da oposição e a classifica como "muito fraca".
Gika também diz que não vê a estabilidade política como necessária para a recuperação econômica, e ele também não quer esperar até que a Irmandade Muçulmana tome o controle de todo o país. Ele desconfia dos islâmicos da Irmandade e não tem medo de continuar lutando.
"Eu sei que isso pode custar a minha vida", diz ele. "Peço a Deus todos os dias para me preparar para isso".
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