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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Após queda de Gaddafi, começa a disputa pelo comando da Líbia

Rebeldes comemoram a tomada da fortaleza de Khaddafi
Combatentes da cidade de Zintan, nas montanhas do oeste, controlam o aeroporto. Os combatentes de Misrata guardam o banco central, o porto e o gabinete do primeiro-ministro, onde suas pichações rebatizaram a praça histórica de “Praça Misrata”. Os berberes da cidade de Yaffran assumiram o controle da praça central da cidade, onde picharam “Revolucionários de Yaffran”.

Uma semana após os rebeldes terem tomado a antiga fortaleza de Muammar Gaddafi, grande parte de seu território permanece dividido em feudos, cada um controlado por brigadas semi-independentes que representam diferentes áreas geográficas. E as pichações que usam para marcar seu território contam a história de uma potencial crise de liderança na capital da Líbia.

As autoridades civis do Conselho Nacional de Transição dos rebeldes – agora preparando um governo provisório que será sediado na capital – ainda não chegaram, citando preocupações de segurança, apesar de pronunciarem a cidade como plenamente segura. Há crescentes indícios de rivalidade entre as várias brigadas sobre quem merece crédito pela libertação da cidade e qual será sua influência. E as tentativas de nomear um líder militar para unir os diversos grupos de combatentes expuseram as divisões dentro da liderança rebelde, que seguem as divisões regionais e também entre secularistas e islamitas.

Um influente membro do conselho disse que tudo isso aponta para a continuidade do “vácuo de poder” na liderança civil da capital líbia. Mas a disputa pelo poder também ilustra o desafio que o novo governo provisório enfrentará ao tentar unir a paisagem política dividida da Líbia.

O país era pouco mais do que uma federação livre de regiões e tribos antes de Gaddafi chegar ao poder. Seu uso de favoritismo e repressão para manter o controle fez pouco para reduzir as divisões regionais, étnicas e religiosas da Líbia. Nem os rebeldes que derrubaram Gaddafi se organizaram em uma força unida. Os rebeldes das montanhas do oeste, da cidade costeira de Misrata e da cidade de Benghazi, no leste, lutaram de modo independente e frequentemente viravam os olhos de modo arrogante em relação uns aos outros.

E agora Trípoli se tornou um primeiro teste da capacidade da revolução de superar essas diferenças porque, diferentemente de outras cidades líbias libertadas por seus próprios moradores, Gaddafi foi expulso de Trípoli por brigadas de outras regiões, e a maioria permanece nas ruas.

Medidas iniciais para unificação das brigadas sob um comando comum expuseram as divisões latentes entre os líderes rebeldes. Algumas delas ficaram aparentes quando a rede de televisão por satélite pan-árabe “Al-Jazeera” noticiou nesta semana que um combatente chamado Abdel Hakim al Hasadi, às vezes conhecido como Abdelhakim Belhaj, tinha sido nomeado comandante do recém-formado Conselho Militar de Trípoli.

Vários liberais entre o conselho de liderança rebelde se queixaram de modo privado que Al Hasadi foi líder do debandado Grupo de Combate Islâmico Líbio, que se rebelou contra Gaddafi nos anos 90.

Alguns disseram temer que era o primeiro passo de uma tentativa de tomada islâmica. Eles notaram que Al Hasadi foi nomeado comandante pelos cinco batalhões da chamada Brigada de Trípoli, e não por autoridades civis. E também se queixam de uma percebida influência do Qatar, que ajudou a treinar e equipar a Brigada de Trípoli e que também financia a “Al Jazeera”.

“Este sujeito é apenas uma criação dos qatarianos e seu dinheiro e eles estão patrocinando o extremismo muçulmano aqui”, disse outro membro do conselho da região oeste. “Os combatentes revolucionários estão extremamente descontentes e surpresos. Ele não é comandante de nada!”

Misturada às preocupações ideológicas está uma medida igual de rivalidade provincial a respeito de quem fez mais para libertar Trípoli. Al Hasadi não é apenas um islamita, argumentou o membro do conselho, mas também fez menos do que os rebeldes do oeste na luta pela capital.

“As pessoas no oeste estão dizendo umas às outras, ‘O quê? Aquele garoto? Isso é bobagem! E quanto aos nossos principais comandantes?’” disse o membro do conselho.

Al Hasadi não pôde ser contatado para comentários, em parte por estar participando de reuniões em Doha, Qatar. Mustafa Abdul-Jalil, presidente do Conselho Nacional de Transição, disse que fez questão de levar Al Hasadi junto para a reunião com seus aliados da Otan, em Doha, para mostrar que apesar de seu histórico, ele “não representa perigo para a paz internacional e estabilidade”.

Indícios de outra dissidência apareceram nesta semana, após relatos de que o primeiro-ministro do conselho, Mahmoud Jibril –que, assim como Abdul-Jalil, não está presente em Trípoli– tinha nomeado um ex-general do exército líbio, Albarrani Shkal, como chefe da segurança da capital.

Os combatentes de Misrata, considerada a força mais formidável dos rebeldes, se recusaram a aceitar sua nomeação, argumentando que ele foi cúmplice da repressão cruel de Gaddafi contra sua cidade. Em Misrata, aproximadamente 500 manifestantes tomaram a praça central para cantar que a nomeação trairia “o sangue dos mártires”, informou um correspondente do jornal “The Guardian”, notando que o conselho local da cidade apresentou uma queixa formal à liderança nacional.

Na noite de terça-feira, Jibril voltou atrás em sua decisão, disse Alamin Belhaj, um membro de Trípoli do conselho de transição.

Ambos os conflitos em torno da escolha dos líderes militares lembram a disputa provocada pelo assassinato do principal comandante militar dos rebeldes em Benghazi, o general Abdul Fattah Younes. O assassinato, ainda não desvendado, provocou alegações de alguns líderes rebeldes de que ele foi assassinado por uma brigada de islamitas, que eles disseram ter buscado vingança pelo papel anterior dele como alto assessor de Gaddafi. Ninguém foi acusado no caso.

Os islamitas líbios dizem que apenas querem ter a chance de competir em uma democracia aberta, e argumentam que estão mais bem qualificados do que os liberais para desarmar os combatentes nas ruas.

“Eles confiam mais em nós”, disse Alamin Belhaj, o membro do conselho e líder da Irmandade Muçulmana daqui, argumentando que muitos líbios temem que a revolução será “roubada” pelos liberais do conselho, que são ricos, ocidentalizados e vieram de fora do país.

Todos os lados concordam que a conquista de Trípoli a transformou em um cadinho de rivalidades regionais. Apesar dos primeiros combates terem ocorrido no leste, o ataque final contra Trípoli foi liderado por grupos rebeldes do oeste e finalizado pelos combatentes experientes de Misrata.

Agora os membros de quase toda brigada em Trípoli afirmam que seu grupo exerceu o papel mais heroico na tomada da cidade, ou na invasão da fortaleza de Gaddafi, ou na tomada da praça central.

“Nós temos registrado em vídeo”, disse Mahdi al Harati, o vice-líder do Conselho Militar de Trípoli, defendendo sua alegação de que sua brigada foi a primeira a chegar à praça central.

Mais do que orgulho pode estar em jogo, disse Anwar Fekini, um advogado franco-líbio com laços ancestrais com as montanhas e que é membro do conselho nacional de liderança.

“As pessoas no oeste dizem: ‘Nós pagamos um alto preço, então queremos estar no comando’, e o mesmo diz Misrata”, ele disse, acrescentando que ele argumentou que os líbios devem selecionar seus líderes com base apenas na competência, independente da região.

Alamin Belhaj teve outra ideia. Ele disse que pediu a outros conselhos locais para que retirassem suas brigadas dos limites da cidade, deixando a capital para os moradores de Trípoli.

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