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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Reorganizada, Al Qaeda pensa globalmente, mas age localmente

Um novo alerta emitido na semana passada sobre possíveis e iminentes atentados arquitetados pela Al Qaeda alimentou temores muito além das fronteiras dos Estados Unidos. Mas o movimento criado por Osama bin Laden há muito tempo migrou dos grandes ataques internacionais para as batalhas locais --e com sucesso.

Osama bin Laden não fazia ligações telefônicas. Durante seus anos em Abbottabad, no Paquistão, ele evitava qualquer coisa que pudesse colocar as agências de inteligência em seu rastro e se comunicava apenas por meio de mensageiros. Mas uma reportagem publicada na semana passada por dois jornalistas do site de notícias norte-americano "The Daily Beast" sugere que a atual liderança da Al Qaeda abandonou esse tipo de medidas de precaução.

Parece que o motivo para o fechamento de 21 embaixadas norte-americanas do Iêmen até o Paquistão foi a interceptação de uma conferência telefônica online realizada entre as 20 principais lideranças da organização terrorista. De acordo com o artigo, o líder da Al Qaeda, Ayman al-Zawahiri, aproveitou a oportunidade da teleconferência para nomear Nasir al-Wuhayshi, chefe do braço da organização no Iêmen, como seu segundo líder oficial no comando da rede terrorista. Também participaram da ligação os líderes da Al Qaeda no Iraque, no Norte da África e no Uzbequistão, assim como o Taleban do Paquistão, o grupo nigeriano Boko Haram e um representante do grupo emergente da Al Qaeda na Península do Sinai.

"Essa ligação foi como uma reunião da Legião do Apocalipse", disse um dos três oficiais de inteligência dos EUA entrevistados pelo site "The Daily Beast". Durante a reunião virtual, continua a reportagem, os agentes da Al Qaeda também discutiram os futuros alvos de atentados e mencionaram que uma ou várias equipes já estavam posicionadas para realizar esses ataques.

Que os terroristas mais procurados do mundo tenham se reunido para realizar uma sessão online de instruções precisamente no momento em que o escândalo da NSA eclodiu parece constituir uma ruptura com todas as regras às quais alguém como Al-Zawahiri deve sua sobrevivência após duas décadas sendo procurado pelas agências de inteligência dos EUA.

Mas também provocou certo espanto o anúncio do governo dos EUA relacionado ao fechamento de tantas embaixadas. "É uma loucura", disse a repórteres o ex-assessor de contraterrorismo do Departamento de Estado dos EUA, Will McCants. O governo norte-americano, por sua vez, se recusou a fazer comentários sobre a situação.

A reportagem também apresentou outra inconsistência ao supor que a Al Qaeda continua sendo uma organização dirigida por um poder centralizado e ao supor que Al-Zawahiri é um líder a quem todos obedecem, apesar das tensões internas e das pressões de ser uma rede cujos membros são procurados por agências de inteligência.

Na realidade, esse retrato contradiz a evolução observada nos últimos anos, que inclui uma análise divulgada em 7 de agosto passado pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a Al Qaeda e suas associadas, o 14º relatório desse tipo a ser divulgado. O documento afirma que "as principais lideranças da Al Qaeda, cujo cerne foi dizimado, não testemunharam um renascimento de sua sorte ao longo dos últimos seis meses. Uma liderança sênior degradada que atua na região de fronteira entre o Afeganistão e o Paquistão continua emitindo declarações, mas demonstra pouca habilidade em operações diretas realizadas por meio do comando e do controle centralizados".

Al-Zawahiri, prossegue a reportagem, "tem demonstrado pouca capacidade para unificar ou liderar as organizações afiliadas à Al Qaeda". Na verdade, segundo o texto, as ameaças mais perigosas são personificadas por indivíduos que cometem ataques após se "autorradicalizarem" por influência da propaganda terrorista online, como os dois tchetchenos que detonaram as bombas na Maratona de Boston durante a primavera passada (no hemisfério norte). Um perigo adicional, afirma a reportagem, é que a Al Qaeda tentará tirar vantagem de novos conflitos, como a atual guerra na Síria, que deu à organização terrorista "um impulso significativo".

Será que a Turquia está fazendo muito pouco para deter os turistas jihadistas?
Os serviços de inteligência europeus compartilham da mesma opinião. A Síria se transformou no destino favorito dos jihadistas, que chegaram aos milhares ao país devastado pela guerra ao longo dos últimos 12 meses. Esses combatentes são os únicos que estão ajudando os rebeldes contra o maquinário militar do regime de Assad, e essa ajuda tem proporcionado um poder devastador aos rebeldes.

E ninguém parece querer impedi-los. Em voos domésticos para Hatay, no sul da Turquia, os passageiros barbudos provenientes da Arábia Saudita, da Tunísia e das repúblicas da região do Cáucaso da Rússia sentam-se lado a lado. Eles viajam para a Turquia sem nenhum problema e, em seguida, se reúnem com seus camaradas, que os levam para a fronteira mais próxima e para dentro da Síria. Enquanto isso, homens de aparência semelhante fazem fila nos portões de embarque de Hatay, levando pouca bagagem e, muitas vezes, ainda com vestígios da terra vermelha do norte da Síria grudada em seus sapatos.

As autoridades turcas parecem não se preocupar com esses turistas jihadistas. Nos postos de fronteira, os contrabandistas de gente propagandeiam abertamente seus serviços. Isso, de certa forma, é estranho, disse em junho passado um ex-seguidor sírio do "Emir" Asadullah al-Shishani sobre o reduto jihadista de Atmeh, perto da fronteira turca. "Há um mês, uma dezena de tchetchenos voou de volta para casa a partir de Hatay sem nenhum problema, embora eles tenham nos dito que todos eram procurados pela Interpol."

A difusa ideologia de guerra perpétua da Al Qaeda dá à organização a vantagem tática de poder estar presente em vários conflitos simultaneamente. Cada um dos braços da organização se alimenta como parasita de vários oponentes. No Iêmen, eles lutam contra o exército do governo e contra os Estados Unidos; na Síria, contra a ditadura alauíta de Bashar al-Assad e os curdos; no Mali, contra o governo e os tuaregues; no Iraque, principalmente contra o governo xiita do primeiro-ministro Nouri al-Maliki.

A antiga máxima de Bin Laden, que buscava confrontar o "inimigo distante" nos Estados Unidos e na Europa, foi substituída pelo princípio da apropriação de conflitos locais de muitos tipos diferentes.

"Os limites da autoridade de Al-Zawahiri"
Abu Musab al-Zarqawi, o ex-líder iraquiano da Al Qaeda, que já foi morto, reconheceu essa guerra sectária contra os xiitas como uma oportunidade conveniente para fazer com que um conflito já latente servisse a seus próprios objetivos. Na época, Bin Laden tentou impedi-lo, mas hoje a organização terrorista está novamente em ascensão no Iraque, e tem se beneficiado da política do primeiro-ministro iraquiano, que tem retirado sistematicamente os sunitas de cargos importantes em favor dos partidários de sua base de poder xiita.

O "Estado Islâmico do Iraque e da Síria" (ISIS) tornou-se o braço mais poderoso da Al Qaeda, assumindo gradativamente o controle dos combatentes e das bases pertencentes à Frente Al-Nusra, que já serviu de ponto de encontro para os jihadistas da Síria. Aqui, porém, os líderes da Al Qaeda têm pouco a dizer. "As tentativas frustradas de... Al-Zawahiri para mediar conflitos internos entre a Al Qaeda e [a Frente Al-Nusra] apontam para os limites da autoridade de Al-Zawahiri", sugere o relatório da ONU.

A fraca posição de liderança de Al-Zawahiri levou Max Fisher, que escreve para o jornal "Washington Post", a apresentar uma especulação totalmente nova a respeito de por que o líder da Al Qaeda falaria de maneira tão aberta e direta durante a suposta teleconferência. "Para Zawahiri, apenas a aparência de estar dando as ordens para a execução de uma grande operação poderia ajudá-lo com a política interna da Al Qaeda", escreveu ele.

A febril reação de Washington à ligação interceptada --meia dúzia de ataques com drones no Iêmen e um alerta mundial para os norte-americanos em viagem-- deve ter agradado Al-Zawahiri, pois demonstrou que ele havia conseguido alcançar o efeito pretendido. Supondo, bem entendido, que a história da teleconferência seja verdadeira.

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