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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Espetáculo do julgamento do ex-líder egípcio Mubarak cativa o Oriente Médio

TV do Egito grava Mubarak de maca em julgamento
O julgamento televisionado de Hosni Mubarak transformou o Egito e grande parte do Oriente Médio em uma vasta sala de estar na quarta-feira, com milhões de telespectadores, desde as lojas em Amã e Jerusalém até as cabanas no empobrecido Iêmen, hipnotizados pela transmissão ao vivo de um espetáculo antes impensável, a partir de um tribunal no Cairo.

A visão de Mubarak –o ex-presidente do Egito, 83 anos e enfermo, confinado a uma maca de hospital dentro da jaula dos réus, antes reservada para criminosos comuns– provocou uma variedade de reações, com algumas pessoas sentindo a empolgação de uma retribuição vingativa e outras expressando compaixão por um homem orgulhoso, que antes personificava o arquétipo do autocrata árabe.

Independente de posição política ou religião, muitos compartilharam a sensação de estarem assistindo a um momento histórico, não diferente de há quase seis meses, quando Mubarak foi deposto por uma revolução de 18 dias que alterou a dinâmica política na região.

“Todo mundo, de todas as partes da sociedade, está assistindo, jovens e velhos, pré-democracia e pró-governo”, disse Hussain Abdullam 23 anos, um ativista de direitos humanos do Bahrein, onde a monarquia reprimiu, às vezes violentamente, um movimento democrático inspirado pelos eventos no Egito. “É claro que todas as pessoas que são pró-democracia estão felizes com isso, o que lhes dá um estímulo para continuarem lutando.”

Na Jordânia, um vendedor de loja de roupas em Amã, a capital, que se identificou como Hisham, disse que ele, assim como muitos outros na Jordânia, estava colado diante da televisão no meio do dia, espantado com as quatro horas iniciais do julgamento. “Este é um julgamento pelo qual todos estavam esperando”, ele disse.

Muitos jordanianos –que têm realizado manifestações toda sexta-feira em prol de reformas políticas em seu próprio país– disseram que nunca acreditaram que testemunhariam algo assim. Quando Saddam Hussein, o ditador do Iraque, foi capturado, os jordanianos viram aquilo como resultado da invasão e ocupação americana. Já o julgamento de Mubarak, eles disseram, foi uma exigência do povo egípcio.

Em Bagdá, alguns iraquianos fizeram comparações entre os processos contra os dois ex-líderes.

“Saddam e Mubarak foram criminosos ao seu próprio modo”, disse Ahmed Amer, 40 anos. “Que o povo veja o destino desses tiranos. Eles o levaram a julgamento por ter destruído o povo egípcio.” Salam Ali, 48 anos, um ex-professor em Bagdá, disse que muitos de seus amigos e parentes assistiram a abertura do julgamento de Mubarak. “É justo que seja exibido pela TV, porque ele tem sido um servo de Israel e da América”, ele disse. “Eles devem executá-lo.”

No Iêmen, o país mais pobre e mais instável do Oriente Médio, onde um movimento para derrubar o presidente autocrático, Ali Abdullah Saleh, já dura meses, os manifestantes acamparam em uma manifestação antigoverno em Sanaa, a capital, se reuniram em torno de grandes telões que exibiam a cobertura do julgamento pela “Al-Jazeera”. Muitos disseram que também desejam ver Saleh e sua família sendo julgados.

“Os iemenitas aprenderão muitas lições com o julgamento de Mubarak”, disse Nabil al Hubaishi, que dirige uma pequena loja na periferia no sul de Sanaa. “Eles aprenderão que todos devem prestar contas, até mesmo o presidente.”

Nem todos no Iêmen compartilham esse ponto de vista. Alguns criticaram o julgamento como sendo uma farsa política.

“Eu não o apoio”, disse Suad Mohamed, uma dona de casa de classe média, cujo marido faz parte das forças armadas iemenitas. “Mubarak foi o líder do Egito. Agora ele será julgado quando está doente. Por quê?” Os egípcios, ela disse, deveriam “aplicar o Estado de direito em seu novo Estado. Para Mubarak, basta já ter sido derrubado”.

Não se sabe quantas pessoas assistiram ao julgamento na Síria, onde as forças de segurança tentam esmagar um levante de 5 meses contra o presidente Bashar Assad. Há especulação de que Assad usou a distração do julgamento de Mubarak para ordenar às suas forças de segurança que tomassem a cidade rebelde de Hama, onde dezenas de pessoas foram mortas desde que colunas blindadas sírias começaram a atacar a cidade no domingo.

Em grande parte do Egito, o julgamento fez parar a rotina diária. Os moradores do Cairo lotaram cafés ou qualquer lugar com uma TV. A agência de notícias “Reuters” informou que o famoso trânsito congestionado da cidade diminuiu durante a transmissão.

O julgamento também contou com grande audiência em Israel, onde muitos viram as imagens de Mubarak com uma sensação de desconforto. Apesar de ter sido um ditador, disseram vários comentaristas israelenses, Mubarak também foi um aliado confiável, que manteve o tratado de paz do Egito com Israel por 30 anos. Também foi notado que as acusações de corrupção contra Mubarak incluem um acordo de gás natural que seu regime acertou com Israel.

Nos territórios palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, os sentimentos eram mais conflitantes. Muitos dos que assistiram as transmissões ao vivo do tribunal, pela televisão e pela Internet, expressaram satisfação com o fato de Mubarak ter sido levado à Justiça. Alguns disseram que isso aumenta a credibilidade do governo militar interino do Egito. Outros disseram que sentiam que a humilhação ao ex-presidente enfermo foi longe demais.

Havia alguma compaixão entre alguns moradores de Gaza. A maioria, entretanto, culpa Mubarak por ter ajudado Israel a impor o rígido bloqueio a Gaza nos últimos anos, mantendo a travessia de Rafah, na fronteira com o Egito, na maior parte do tempo fechada.

Abeer Ayyoub, uma jornalista em Gaza e uma pesquisadora para um grupo de direitos humanos, disse que Mubarak merece ser julgado pelo que fez a Gaza e contra seu próprio povo. Ao mesmo tempo, ela disse, o julgamento precisa ser justo, acrescentando: “Este julgamento parece ser mais uma vingança”.

Na fortaleza rebelde líbia de Benghazi, as imagens do ex-presidente egípcio no tribunal causaram principalmente expressões de satisfação, assim como inveja, por pessoas que até agora fracassaram em sua própria revolução para derrubada de Muammar Gaddafi, que governa a Líbia há quatro décadas.

Rafiq el Fellah, o líder de uma milícia rebelde com a tarefa de encontrar agentes pró-Gaddafi e sabotadores em Benghazi, disse que estava ocupado demais trabalhando para poder assistir televisão, mas que tem lido as notícias sobre Mubarak: “Ele foi levado à jaula em uma maca. Eu gosto muito disso. Quando a Justiça é assim, nós temos um futuro promissor”, disse Fellah.

Mohammed Ali, um frentista de posto de gasolina, disse que ficou impressionado com o sistema judiciário egípcio, um sinal esperançoso para sua democracia.

“Não é fácil para nós árabes levarmos um presidente à Justiça”, ele disse. “É bastante impressionante. Nós esperamos que seja um exemplo.”

Michael S. Schmidt, em Bagdá (Iraque), Heba Afify, no Cairo (Egito), Nada Bakri, em Beirute (Líbano), Isabel Kershner, em Jerusalém (Israel), Fares Akram, na Cidade de Gaza (Faixa de Gaza), Laura Kasinof, em Washington (EUA), Nasser Arrabyee, em Sanaa, (Iêmen), Ranya Kadri, em Amã (Jordânia), e Kareem Fahim, em Benghazi (Líbia), contribuíram com reportagem.

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