Narendra Modi, candidato ao cargo de primeiro-ministro do partido nacionalista hindu |
Pramod Pethkar está radiante de orgulho de seu rebanho, das crianças das tribos vizinhas. Trajando sua kurta (túnica larga sem gola) de linho azul, bigode e óculos redondos estilo anos 1920, Pramod Pethkar tem um lado vagamente antiquado nessa Índia mercantil atual, com o ar hierático daqueles que dedicam suas vidas a uma causa. Ele é um missionário laico do movimento nacionalista hindu. Com um sorriso contente nos lábios, ele conduz visitas pelo seu ashram de Randha, um vilarejo próximo às verdes colinas na saída de Silvassa, o centro administrativo do território de Dadra e Nagar Haveli, entre os Estados de Gujarat e de Maharashtra (Oeste).
Um campo de esportes lamacento cercado de casas com telhados de barro abrigando dormitórios, cozinha, altar e curral: o lugar é austero, mas ativo. O ashram faz as vezes de internato, acolhendo cerca de 25 alunos, que estudam fora em escolas públicas. Oficialmente, o estabelecimento fornece alojamento e apoio escolar. Na prática, ali se conduz uma experiência voluntarista de propagação dos ideais da "Índia hindu" junto a comunidades tribais tradicionalmente animistas --que compõem a maioria dos habitantes de Dadra e Nagar Haveli.
Esse trabalho de "hinduização" das margens aborígenes de Bharat (pátria), terras deserdadas até hoje, e entregues à influência das missões cristãs ou da extrema esquerda maoísta, é um dos objetivos apresentados pela organização Rashtriya Swayamsevak Sangh (Associação dos Voluntários Nacionais, RSS), a matriz do movimento nacionalista hindu. Os grupos tribais da Índia (104 milhões de pessoas, ou seja, 8,6% da população total) devem ser reconquistados para serem fundidos no caldeirão da "nação hindu".
Pramod Pethkar agora está sentado sob o toldo de sua moradia, um barraco rústico de paredes nuas. Ele sorve chá com leite, enquanto um vento quente que sopra vindo da costa --o mar da Arábia não fica tão longe-- agita as folhas da figueira do quintal, uma árvore de galhos túrgidos como raízes. Pramod Pethkar conta sobre sua vida, explica suas convicções, expõe sua visão de mundo. Com uma caneta enfiada no bolso, ele força um ar de professor delicado que contrasta com o clichê do capanga vociferante muitas vezes associado às tropas de choque da RSS.
Pramod Petkhar é o outro rosto --mais agradável-- de um movimento que, dependendo da ocasião, também sabe aderir a um extremismo violento, tais como os tumultos anti-muçulmanos que resultaram em quase 2.000 mortes por todo o Estado de Gujarat em 2002. O chefe do ashram de Randha é mais um semeador de ideias do que um agitador de multidões. Ele se define como um "assistente social" que trabalha sem descanso nos setores da educação, da saúde e da agricultura. No entanto, ele nega sem muita convicção a evidência de que também molda mentes. Ele prefere falar em "processo de sentimentos".
Neste momento em que Narendra Modi, a principal figura do Bharatiya Janata Party (BJP) --a vitrine política da RSS-- mostra sua ambição de governar a Índia após as eleições legislativas entre os dias 7 de abril e 12 de maio, uma imersão nesse ashram de Randha carrega muitos ensinamentos. Ela oferece um entendimento da ideologia que inspira a base do movimento, uma rede de estruturas militantes cujo moral promete ser revigorado por uma eventual vitória de Narendra Modi, ele mesmo formado na escola da RSS.
E essa confiança crescente dentro do campo nacionalista hindu terá grande influência sobre a maneira como a Índia se definirá nos próximos anos. Ater-se ao conceito original de uma nação plurirreligiosa, cara ao Partido do Congresso da dinastia Nehru-Gandhi e, para além disso, aos liberais adeptos do "secularismo"? Ou pelo contrário, promover a ideia de que a Índia é antes de tudo uma "nação hindu", ou seja, o longo projeto ideológico no qual vêm trabalhando a RSS e seu grupo de shakas (galhos) de agentes recrutadores disseminados em todos os cantos do país?
Regime de vida monástica
Portanto, Pramod Pethkar é um deles. Ele é o arquétipo do militante da organização, inclusive --e sobretudo-- em sua fala astuta e milimetricamente calibrada. Oriundo de uma família brâmane de Gujarat, ele entrou para a RSS aos 5 anos de idade, atraído pelas brincadeiras e outras atividades esportivas, organizadas por um movimento fortemente inspirado nos escoteiros do ex-colonizador britânico. Assim, Pramod Pethkar se tornou um pracharak, um permanente da RSS, levando uma vida dura e que beira um regime de vida monástica. E desde muito cedo ele recitou, assim como hoje ele ensina os jovens tribais, o Namaste Sada Vatsale e suas passagens sobre "o heroísmo rígido" e o "mais alto pináculo da glória". Em seguida, no início de sua vida adulta, ele jurou o celibato porque "o casamento atrapalha o trabalho", segundo ele. Entre a causa e a família, ele escolheu a causa.
Depois de obter seu diploma em administração na Universidade de Baroda (Gujarat), Pramod Pethkar foi enviado em 2000 a Vanvasi Kalyan Ashram, a filial da RSS encarregada de hinduizar as populações tribais por toda a Índia. É claro, a expressão "hinduizar" os grupos indígenas o intriga. "Não se trata de hinduizá-los", ele protesta, "uma vez que eles já são hindus". É esse o cerne do pensamento da RSS veiculado por Pramod Petkhar: "A Índia é hindu, todos os indianos são hindus". E se hoje existem muçulmanos e cristãos na Índia, é porque eles não passam de "convertidos", uma aparente mudança de fé, associada a invasões estrangeiras, e que não deve ocultar em nada suas raízes hindus.
E é verdade que os tribais se dedicam aos cultos animistas do Sol, da árvore, da rocha ou do rio, mas "eles são hindus sem saber", explica Pramod Pethkar. "A teoria segundo a qual tribos indígenas existiam antes da chegada à Índia de arianos vindos do Irã ou da Ásia Central é uma invenção dos britânicos para dividir os indianos", ele afirma. "Os tribais não são diferentes dos outros indianos." E seu ashram está aí para fazer com que eles compreendam isso, levando em conta que "indiano" para ele significa "hindu", dois termos que ele usa sem fazer distinção.
Dois adolescentes vindos de vilarejos tribais vizinhos, chamados Bhavesh e Shrikant, acompanham Pramod Pethkar na visita ao ashram. Eles percorrem o terreno vazio, onde a cada noite é içada a bandeira cor de açafrão da RSS antes da sessão de ginástica. Eles espiam a cozinha onde alunos cortam batatas em rodelas, passam um momento em um quarto do alojamento, um cômodo inóspito com camas de ferro, inspecionam a sala de computação, onde cada um é convidado a revisar suas lições de matemática ou de híndi. E concluem a vistoria pelo curral, onde ficam dispostos em círculo os bovinos, deitados na palha.
Essa etapa é importante, na opinião de Pramod Pethkar. "A vaca não é somente a fonte do leite", ele alega. "Ela é também nossa mãe, é uma deusa". E para lhe homenagear, Bhavesh e Shrikant, com uma bandeja nas mãos, passam um pó vermelho na testa dos animais sagrados. E lhe jogam pétalas de flores para demonstrar todo seu respeito afetuoso. Educadas na veneração à "vaca mãe", as crianças do ashram não demoram a abandonar os pratos com carne de suas famílias para se converterem à alimentação vegetariana.
Ao longo dos anos, a pequena missão hindu de Randha e suas diversas emanações meio que traçaram uma nova linha de frente nesse universo das colinas em torno de Silvassa. "Eles estão aqui para instilar a ideologia do hindutva na mente das crianças das tribos e obrigá-las a renunciarem às crenças ancestrais das famílias", critica Jugal Patel, secretário-geral da Adivasi Vikas Sangathan, um movimento militante pelos direitos indígenas. Nessa briga de influências, a rivalidade com as igrejas cristãs há muito tempo enraizadas --Dadra e Nagar Haveli foi um enclave português-- é evidente. Além disso, a RSS nunca escondeu a hostilidade que a cristianização das tribos lhe inspirava. "As conversões ao cristianismo são vistas como forçadas pelas tribos", critica Pramod Pethkar. "Os padres ou os pastores lhes prometem vantagens materiais."
E é só o que ele dirá. Os cristãos dos vilarejos vizinhos são mais explícitos quanto às tensões religiosas recorrentes na região. "As organizações hindus passam pelos vilarejos denegrindo as igrejas cristãs, apresentadas como importações vindas da Europa e da América", conta Vijay Kura, um protestante de um vilarejo vizinho, preocupado com as consequências da nova confiança exibida pelos nacionalistas hindus graças à campanha eleitoral. Estaria ameaçada a harmonia nas colinas.
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