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quarta-feira, 7 de maio de 2014

Como a Alemanha poderia acabar com dependência de gás russo

À beira das charnecas ao leste de Bremen, uma torre de petróleo se projeta no céu. O local, conhecido como Völkersen-Nord 24a, pertence à companhia de produção de petróleo e gás natural RWE Dea e explora reservas de gás natural localizadas a 5 mil metros abaixo da superfície. Na ponta da torre de aço, uma bandeira alemã tremula ao vento. Mas a bandeira preta, vermelha e dourada parece fora de lugar.

A RWE Dea acabou de ser vendida há cinco semanas ao oligarca russo Mikhail Fridman por 5,1 bilhões de euros. Com a compra, o multibilionário de 50 anos agora controla um quinto da produção alemã de gás natural e um quarto da produção de petróleo do país. Entre suas propriedades também está a plataforma de petróleo Mittelplate no Parque Nacional Wattenmeer, na costa do Mar do Norte. É um "portfólio atraente", disse Friedman sobre sua compra, quando assinou o contrato em Hamburgo no final de março.

Alexey Miller, o presidente-executivo da gigante de energia russa Gazprom, igualmente considera a Alemanha um mercado atraente. Nos próximos meses, a compra pela Gazprom da Wingas –uma empresa distribuidora de gás com sede em Kassel, que controla um quinto do mercado de gás natural alemão– deverá ser finalizada. A aquisição concederá à Gazprom autoridade sobre uma rede de gasodutos de 2 mil quilômetros, além de várias instalações de armazenamento de gás natural, incluindo a maior na Europa Ocidental, localizada em Rehden. Ela é grande o bastante para fornecer para cerca de 2 milhões de lares por todo um ano.

Momento inoportuno
O momento das aquisições é inoportuno. Enquanto toda a Europa está olhando nervosamente para a escalada da crise na Ucrânia, uma porção significativa da infraestrutura de energia da Alemanha está sendo vendida para compradores russos –enquanto Moscou já exerce um papel crítico em suprir as necessidades de energia do país.

Quase 39% do gás natural da Alemanha vêm da Rússia por gasoduto. Até o momento, ao menos. Mas o que aconteceria se Moscou fechasse o registro? É uma preocupação que atormenta muitos políticos em Berlim, e a retórica se intensificou nos últimos dias.

Andreas Mattfeldt, um parlamentar da União Democrata Cristã da chanceler Angela Merkel e que nasceu em Völkersen, diz que a venda da RWE Dea para um oligarca russo o deixa "mais que incomodado". Ele diz que a venda "preocupa extremamente" os alemães em seu eleitorado na Baixa Saxônia, acrescentando que, dada a atual dependência alemã de gás natural russo, ele considera a transação "muito alarmante". A segurança de energia do país, ele diz, está "enormemente em risco".

O cenário do fluxo de gás natural sendo intencionalmente reduzido por Moscou há muito é considerado improvável. Mesmo nos dias mais frios da Guerra Fria, a União Soviética provou ser uma fornecedora confiável. Nos anos imediatamente anteriores à queda do Muro de Berlim, a Alemanha Ocidental recebia metade de seu gás natural da Rússia, por gasodutos otimistamente chamados de "Irmandade" e "União".

Um quarto de século depois, o mundo se tornou mais complicado e a política externa menos previsível. O conflito no leste da Ucrânia parece que pode explodir a qualquer momento, injetando ainda mais incerteza à situação. E a Rússia alertou sobre interrupções potenciais de fornecimento, uma reação às ameaças europeias de sanções econômicas adicionais.

A questão se transformou em um grande foco de diplomacia internacional, com negociadores de Moscou, Kiev e de Bruxelas se reunindo na última sexta-feira para discutir o fornecimento de gás russo para a Ucrânia. Nesta semana, os ministros de energia do G-7 se reunirão em Roma para discutir formas de se livrarem da dependência do gás natural russo.

Entre as propostas na agenda está uma ideia polonesa de integrar as grades de fornecimento de gás dos países membros da União Europeia, como forma de impedir escassez. Varsóvia prevê a criação de um único órgão europeu que poderia coordenar ou direcionar o fluxo de gás de entrada e saída de grandes instalações de armazenamento no continente, assim como fazer compras. A proposta também pede pela disponibilização de bilhões de euros para exploração de gás natural no continente.

A Alemanha também voltou a discutir a política de energia. Em 2011, Merkel afastou o país da energia nuclear e acelerou o desenvolvimento de fontes de energia renováveis, em uma política conhecida como "Energiewende". Agora, fatores geopolíticos repentinamente se tornaram fundamentais no debate sobre o futuro da oferta de energia do país. Berlim deveria aumentar seu foco na exploração de fontes domésticas de energia? Como a Alemanha pode expandir sua rede de oferta? E o que tudo isso representa para o meio ambiente?

Buscando gás natural liquefeito
Uma solução potencial para a questão difícil da política de energia da Europa pode ser vista à beira do Porto de Roterdã, bem onde os navios partem para o mar aberto. Lá, um consórcio construiu o GATE, um terminal que ocupa vários acres de aterro equipado para receber navios transportando gás natural liquefeito (GNL). O navios chegam da Noruega, Qatar e Nigéria e são descarregados ali. Alguns navios carregam gás natural suficiente para abastecer 60 mil lares por um ano.

O GNL é resfriado a uma temperatura de 162ºC negativos, o que reduz seu volume para 1/600 do original. O gás é bombeado dos navios no terminal em Roterdã para vastos tanques de 55 metros de altura, com paredes de concreto e aço de dois metros de espessura. O calor excedente de uma usina elétrica a carvão vizinha é então usado para reverter o gás natural ao estado gasoso antes de seguir para a rede de gasodutos.

A construção da instalação em Roterdã custou cerca de 900 milhões de euros e pode receber 200 navios por ano. Mas até o momento neste ano, apenas sete chegaram. De fato, desde que a rainha Beatrix da Holanda cortou a fita vermelha na inauguração da instalação em 2011, apenas 40 navios transportando GNL atracaram no porto.

O início lento do porto de GNL de Roterdã se deve principalmente à falta de instalações suficientes de liquefação nos países produtores de gás natural. Com várias dessas instalações atualmente em construção, parece provável que a situação melhore até o final da década.

Mas não há escassez de terminais para recebimento de GNL. Na Europa, já existem 22 portos de GNL, com mais em construção. De fato, teoricamente a UE conta com infraestrutura para cobrir dois terços de suas necessidades de gás natural com GNL.

Entretanto, há outro fator que impede o gás natural liquefeito de exercer um maior papel no atendimento das necessidades europeias de energia: o preço. Para grandes exportadores como o Qatar, é muito mais lucrativo vender o GNL para o Extremo Oriente do que enviá-lo para a Europa. Os fornecedores podem cobrar mais de US$ 15 por milhão de unidades térmicas britânicas (MBtu) na Ásia, enquanto o preço na Europa é de cerca de US$ 10. Desde o acidente nuclear em Fukushima em 2011, a diferença de preço se tornou ainda maior em consequência da maior necessidade de gás natural pelo Japão.

Assim, apesar de ser concebível que o GNL possa se tornar uma parte maior do mix na Europa, isso significaria preços mais altos de energia. E a construção de terminais adicionais de GNL, como o que está sendo planejado para Wilhelmshaven, Alemanha, parece desnecessária no momento.

Explorando o gás de xisto
No canto noroeste da Baixa Saxônia, na Rodovia Nacional 75, pode ser encontrado o local de prospecção Bötersen Z 11, pertencente à gigante americana de energia Exxon Mobil. "Z" significa "Zechstein", um termo que descreve a camada sedimentar encontrada na Bacia Permiana europeia, que está por baixo de grande parte do norte da Europa. O local foi construído há quase três anos.

Na época, tudo estava preparado, com técnicos planejando injetar um líquido nas profundezas do solo a 450 bar. O procedimento duraria cerca de uma hora. Mas não aconteceu. Os protestos públicos contra o procedimento se tornaram tão intensos que impediram a continuidade do projeto. Hoje, uma válvula do tamanho de uma pessoa sela o local de perfuração.

Além da tecnologia nuclear, nenhuma outra tecnologia é tão controversa na Alemanha como a fratura hidráulica (fracking). Os críticos temem danos ambientais incalculáveis, particularmente aos aquíferos. Os produtores rebatem alegando que o procedimento é bem testado. De fato, a fratura hidráulica é empregada na Alemanha desde 1961, mas apenas em depósitos convencionais em arenito poroso, que são relativamente fáceis de explorar.

O conflito em torno da fratura hidráulica é mais rancoroso quando se trata do xisto. Os depósitos nessas rochas sedimentares são de acesso muito mais difícil e o procedimento é considerado mais arriscado. Apesar dos especialistas acreditarem que o potencial da tecnologia é excelente na Alemanha, a fratura hidráulica do xisto ainda não foi realizada aqui.

Daniel Yergin, um especialista em energia americano, estima que até 2040, a Alemanha poderia atender cerca de 35% de suas próprias necessidades de gás natural caso explorasse agressivamente o gás de xisto. Essa quantia equivale aproximadamente ao que a Alemanha importa atualmente da Rússia.

Mas o otimismo de Yergin não é amplamente compartilhado. O Instituto Federal de Geociências e Recursos Naturais alemão concluiu recentemente em um estudo que "não pode-se esperar que o gás de xisto na Alemanha seja capaz de 'mudar o jogo' como ocorreu nos Estados Unidos". O gás de xisto alemão, notou o estudo, "não tem um papel central" em relação a outros depósitos no mundo.

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