Enquanto o número de refugiados sírios em outros países não para de aumentar e François Hollande tem apoiado a necessidade de fazer uma intervenção militar na Síria, a França vem se mostrando, há vários meses, muito mais hesitante no que diz respeito ao acolhimento de eventuais refugiados em seu território.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) anunciou, na terça-feira (3), que a marca dos 2 milhões de refugiados havia sido ultrapassada, um aumento de dez vezes em um ano. Diante dessa tragédia humanitária, a agência das Nações Unidas vem tentando desde o início do mês de junho convencer os Estados-membros da União Europeia a abrirem suas portas aos refugiados. Sem grande sucesso, sobretudo na França.
A meta do Acnur é conseguir uma proteção excepcional para 10 mil sírios. Principalmente refugiados nos países limítrofes da Síria, como o Líbano, onde a situação é particularmente precária pois não existe nenhum acampamento oficial em estrutura permanente. O número de 10 mil pessoas é simbólico, comparado com os 5 mil sírios que, a cada dia, estariam fugindo do país, de acordo com o Acnur.
A Alemanha foi o país que prometeu o maior esforço. Cerca de 5.000 sírios serão recebidos ali a partir dos próximos dias. No dia 29 de agosto, a Áustria se comprometeu a prover proteção a 500 pessoas. A Suécia, a Noruega, a Holanda e a Suíça também prometeram receber sírios, em proporções menores --da ordem de 200 cada, no máximo.
Já a França ainda não respondeu ao pedido do Acnur. Desde janeiro ela concedeu asilo a 700 sírios, um número ligado aos pedidos feitos principalmente a partir da França por pessoas que conseguiram chegar ao território. Mas Paris se recusa a conceder qualquer proteção em outro contexto. "Responderam que o sistema de acolhimento a solicitantes de asilo estava saturado", explica William Spindler, encarregado da comunicação no Acnur. O Ministério do Interior, encarregado das questões de asilo, não atendeu as solicitações do "Le Monde" na segunda-feira (2).
O precedente da Bósnia
O Acnur propõe duas soluções. A primeira consiste em receber os imigrantes como parte de um programa de reinstalação. Os indivíduos e suas famílias são totalmente assistidos, desde o país onde eles encontraram refúgio até o país anfitrião. Eles recebem um status de refugiado definitivo, moradia e um acompanhamento na procura de emprego.
A segunda solução, menos generosa, consiste em conceder proteção temporária aos imigrantes. Um acompanhamento social pode ser oferecido, mas mais leve que nos casos de reinstalação. Ainda que os países anfitriões possam em seguida conceder um status de refugiado definitivo às pessoas acolhidas, a princípio elas devem voltar para seus países de origem, uma vez terminado o conflito.
Foi a solução escolhida pela Alemanha, como ela fez durante o conflito na Bósnia-Herzegovina (1992-1995). Dos 320 mil refugiados que ela recebeu então, 246 mil voltaram para suas casas entre 1996 e 2005. No entanto, muitos retornos foram complicados pela recomposição étnica do país durante a guerra, segundo um estudo publicado em julho pelo "Oxford Journal".
No caso da proteção temporária ou da reinstalação, os países anfitriões têm o direito de estabelecer critérios de seleção. As mulheres vítimas de torturas ou ainda "as pessoas que têm laços com a Alemanha" hoje são prioridade. O mesmo vale para os refugiados que têm um "potencial para participar da reconstrução". Em outras palavras, as pessoas que terão interesse em voltar para a Síria uma vez terminada a guerra, segundo o Acnur.
A proteção temporária tem "limites", admite Pierre Henry, diretor-geral do France Terre d'Asile, uma das principais associações encarregadas da recepção a solicitantes de asilo na França. "Mas 700 refugiados sírios acolhidos desde janeiro não é uma resposta política e humanitária à altura dos acontecimentos", ele acredita. "A saturação do sistema de asilo é um pretexto."
Na Alemanha, as questões de imigração são tão delicadas quanto na França. Em agosto, a abertura de um abrigo para solicitantes de asilo em um bairro popular de Berlim suscitou exaltados protestos dos locais, apoiados por pequenos partidos de extrema direita que estariam tentando aparecer antes das eleições legislativas do dia 22 de setembro.
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