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terça-feira, 22 de novembro de 2011

Irmandade Muçulmana de olho nas eleições do Egito


Manifestante joga uma pedra contra policiais no terceiro dia dos protestos na praça Tahrir contra a Junta Militar. O ministro da Cultura do Egito apresentou sua renúncia nesta segunda-feira (21) em protesto contra a forma como a Junta Militar vem reprimido os protestos que começaram no sábado (19)

Em Zawiya Al-Hamra, um bairro populoso da periferia norte do Cairo, quatro candidatos da Irmandade Muçulmana às eleições do 28 de novembro discursam para os clientes de um café ao ar livre. Vindos a convite do dono do estabelecimento, eles se sentam enfileirados sobre um pequeno estrado montado sob os postes de luz. "Temos uma visão para o Egito, a médio e longo prazo", afirma um deles, o advogado Kamel Mahdy, em tom professoral. "Nossos dois eixos de trabalho serão as reformas e os projetos de desenvolvimento", diz ele diante de cerca de trinta moradores, que o escutam sem muita atenção.

Uma dezena de quilômetros mais ao sul, os "revoltados" da praça Tahrir contam seus mortos. Os ataques das tropas de choque não conseguiram despejá-los do santuário da revolução egípcia, que eles voltaram a ocupar depois da manifestação do dia 18 de novembro. Sua determinação em tomar a praça enquanto os generais no comando da transição não assinarem um cronograma para a transferência do poder para os civis é um presságio de um possível reinício das revoltas. Mas, ao contrário de certos partidos que suspenderam suas campanhas desde que começaram os confrontos, a Irmandade se recusa a considerar qualquer adiamento das eleições. Ela até se juntou à manifestação de sexta-feira, opondo-se aos princípios supraconstitucionais redigidos pelo Conselho militar e que, segundo eles, infringem as prerrogativas do futuro Parlamento. Mas ela não quis se manifestar nos dias seguintes, e se manteve distante dos slogans que exigiam a demissão do marechal Tantawi, chefe do Conselho militar. “O bom do Exército é que ele insiste em organizar as eleições,” garante um jovem membro da Irmandade Muçulmana em Zawiya Al-Hamra.

É preciso lembrar que na circunscrição da qual esse bairro faz parte, assim como em muitas outras, a vitória promete ser deles. Das quatorze cadeiras sendo disputadas, os islamitas esperam obter seis ou sete. Eles contam com sua rede de caridade, sobretudo no hospital de Sharabeya, que fornece tratamento gratuito para indigentes. Para não perder o voto dos coptas, uma comunidade bastante presente no bairro vizinho de Shubra, a confraria integrou à sua lista dois candidatos cristãos, membros de partidos centristas que assinaram um acordo de coalizão com ela, que inclui pelo menos uma figura com condições de ser eleita. Definitivamente, somente os agitadores do Al-Nour, um partido salafista perto de quem a Irmandade Muçulmana parece um grupo de gentis conservadores, parecem ter condições de competir com a confraria. “Nessas áreas muito pobres, o eleitorado dos salafistas é forte”, reconhece o radiologista Gamal Youssef, em quinto lugar na lista. “Mas temos mais experiência que eles em matéria de ação política. Temos militantes dedicados em todas as partes do país. Eles são como comandos que acionamos para fazer campanha.”

Rede de esgoto e pão
No café ao ar livre, depois do sermão dos candidatos, alguns erguem a mão. “Em Zawiya, nosso principal problema são os esgotos”, diz um morador. Um outro acrescenta: “A infraestrutura está em estado calamitoso. Não queremos pão, queremos rede de esgoto”.  “Queremos pão, sim”, retruca um terceiro habitante. “E um bom sistema de ensino. O futuro de nossos filhos nos preocupa”. Essas intervenções atraem os curiosos. Como resposta, Kamel Mahdy menciona “a corrupção” do antigo regime e Gamal Youssef discorre sobre os sucessos do AKP, o partido islamita que governa a Turquia.

Um terceiro candidato embarca em um monólogo sobre os malefícios do tabagismo, quando um homem de cabeça raspada salta de sua cadeira. “E o pessoal de Tahrir, você se importa com eles?”, grita ele, brandindo um saquinho repleto de cartuchos recolhidos na praça. “Passei a noite lá e estou surpreso que ninguém esteja falando a respeito”. Aplausos. “É bom falar de lixo, mas e com o sangue de nossos filhos, vocês se importam?”, emenda um outro. “Por que a Irmandade não está na praça?” O debate se anima. Um membro da plateia tenta pegar o microfone das mãos de Mahdy. “Nós denunciamos o ataque das forças de ordem, mas pedimos para que as pessoas tenham calma”, grita o candidato, repentinamente nervoso. “As eleições são a questão mais importante”, diz ele lembrando que, em março, a população havia aprovado por referendo o plano do Exército que previa a realização de eleições antes de se elaborar uma Constituição. Aos poucos os gritos de descontentamento foram diminuindo, e as discussões foram sendo retomadas.

Sentados no fundo, três homens jogam cartas, indiferentes. “Esse falatório me irrita”, diz Mustapha, um engenheiro químico. “Não sabemos mais em quem acreditar. Nos manifestantes? No Exército? Na Irmandade? As pessoas comuns estão totalmente perdidas”. Seu parceiro de jogo, Mohammed, um contador, escolheu seu lado. “Não é lógico organizar um comício quando jovens estão sendo mortos. A Irmandade vai vencer porque ela é mais bem organizada. Mas se eles fossem sinceros, estariam na Praça Tahrir.”

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