Mohamed El Baradei |
Ele se plantou em Tahrir e pronunciou um discurso, mas só as câmeras da imprensa o enfocavam. Sua voz foi afogada pelo clamor que troava em outra direção. Nos dias de inverno da rebelião contra Mubarak, o Ocidente descobriu que Mohamed El Baradei não só não era um líder de massas como muitos manifestantes o consideravam um forasteiro que nada sabia da realidade egípcia.
Nove meses depois, o ex-diretor da Agência Internacional de Energia Atômica e prêmio Nobel da paz está ressurgindo, lentamente, mas com força, como o líder que poderá tirar o Egito do labirinto. Seu nome soa para se transformar no primeiro-ministro de um governo de unidade nacional tutele a transição e, sobretudo, atue como muro de contenção diante do enorme poder do exército. Sua melhor credencial é que sempre foi muito crítico com o papel do exército, inclusive nestes dias em que o Egito aclamava os tanques como protetores da revolução.
El Baradei foi tachado de pouco menos que pessimista quando alertou que os militares eram a coluna vertebral do regime e não deixariam de sê-lo. Essa atitude tão crítica o faz duvidar de que o exército o aceite para o cargo. Outra dificuldade: tampouco é bem visto pela Fraternidade Muçulmana. Sem negar seu direito a ser um partido a mais, não calou sobre os perigos do islamismo.
Mesmo que conseguisse o consenso, aceitar o cargo de primeiro-ministro de um governo de união não é uma decisão fácil. Implica desistir de sua candidatura às eleições presidenciais, para as quais se havia candidatado, mas também o risco de se transformar em outro fantoche do exército e ser visto como um traidor pela Praça Tharir. "É o homem necessário para este momento", afirma Salama Ahmed Salama, veterano articulista de 79 anos respeitado por sua imparcialidade mesmo em tempos de Mubarak.
Tem uma personalidade forte e só aceitará o cargo se tiver garantias de que ninguém interferirá em seu trabalho, nem o exército nem a Fraternidade Muçulmana. Sabe resistir às pressões, como demonstrou na AIEA." Em fevereiro de 2010, depois de 12 anos à frente da AIEA, El Baradei voltou ao Cairo e foi recebido triunfalmente pelos ativistas democráticos, que viram nele a figura que acabaria com Mubarak. Diante do desafio, o regime lançou uma demolidora campanha de desprestígio.
El Baradei acabou deixando o país após alguns meses. Não voltou até janeiro de 2011, uma vez que já haviam eclodido os protestos. Muitos ativistas não o perdoam por isso. "Dedicava-se a nos mandar ânimo pelo Twitter quando precisávamos dele aqui", diziam muitos no inverno. Seus seguidores reconheciam que havia muito o que fazer. "É preciso restaurar sua imagem", dizia Abdel Rahman Semir, um jovem revolucionário da Coalizão em Apoio a El Baradei. Parece que o conseguiu.
"Nesses nove meses foi muito mais discreto que o resto dos candidatos. Se manteve à margem das sujas guerras políticas e se limitou a dar entrevistas e expressar seus pontos de vista de uma forma muito clara e concisa. Ganhou a confiança não só das elites como da classe média, que neste país é muito importante", diz Salama. A grande pergunta agora é se o doutor El Baradei, como é chamado, será capaz de conquistar nesta ocasião a Praça Tahrir, que nunca teve líder.
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