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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Elevam-se as tensões entre a Rússia e a Ucrânia

Rixa comercial, embargo, disputas em torno da base naval de Sébastopol: entre a Rússia e a Ucrânia, nada mais dá certo. Nunca as duas primas eslavas estiveram tão furiosas uma com a outra desde que em 2009 o Partido das Regiões, que aliás é descrito como pró-Rússia, chegou ao poder em Kiev.

Ainda que o presidente ucraniano, Viktor Yanukovitch, domine a língua de Púshkin muito melhor que a do poeta ucraniano Taras Chevtchenko (1814-1861), ele não tem vontade nenhuma de ver seu país abraçar a união alfandegária – Rússia, Belarus, Cazaquistão – que o Kremlin vem tentando lhe impor há alguns anos. Essa associação deve servir de base para a futura União Eurasiana, o principal projeto de Vladimir Putin. Sem a Ucrânia, país industrial de 52 milhões de habitantes prestes a se associar à União Europeia, o projeto se torna manco.

Para trazer a Ucrânia de volta para seu lado, o Kremlin fez diversas ameaças e golpes baixos nos últimos meses, entre eles a proibição por parte das autoridades sanitárias russas do chocolate ucraniano, que de repente se tornou "cancerígeno", além do bloqueio de mercadorias vindas da Ucrânia por parte da alfândega russa em agosto. Assim, a elite militar-securitária no poder na Rússia ajudou muito a empurrar Kiev para os braços da União Europeia.

Os industriais do Partido das Regiões, pouco afeitos a verem oligarcas russos se apoderando de seu feudo (minas, metalurgia, construções mecânicas), preferem olhar mais na direção de Bruxelas em vez de Moscou. Se tudo ocorrer como o previsto, no final de novembro, em Vilnus (Lituânia), a Ucrânia assinará o acordo de associação e de livre-comércio proposto pela União Europeia, um passo que a afastará um pouco mais da tutela da irmã maior russa. O grupo estatal de energia ucraniano Naftogaz já reduziu em 30% suas importações de gás russo em 2013, ao passo que as importações de gás vindo da Europa dobraram.

Visto a partir de Moscou, o flerte de Kiev com Bruxelas é uma traição. Ao se associar com os 28 países-membros, a Ucrânia, esposa frívola e infiel, estaria cometendo uma "ação suicida", alertou Sergei Glaziev, conselheiro econômico pouquíssimo liberal de Putin. O Kremlin está urdindo sua revanche. As medidas de retaliação estão prontas, particularmente o reforço das fiscalizações sobre as mercadorias ucranianas, bem como o fim das tarifas preferenciais concedidas a elas pela Rússia.

Impregnado de nostalgia soviética, Putin ainda não aceita o fato de que a Ucrânia, que conquistou sua independência com o colapso da URSS em 1991, é um Estado soberano. "Somos uma única nação (…) Nós temos em comum a religião, a fé, culturas, línguas, mentalidades similares. É claro, temos especificidades étnicas. Aliás, adoro a cultura ucraniana", contou o número um da Rússia a jornalistas da televisão Pervy Kanal e da agência americana Associated Press que foram entrevistá-lo no dia 4 de setembro.

A "rede Odessa"
Os ucranianos – que os russos chamavam antigamente de "os pequenos russos" – têm direito ao folclore, mas não à soberania. "A Ucrânia é um território. Não se deve perder de vista a lembrança de que nós nascemos do batismo de Kiev, a Rússia e os russos vêm de lá", disse Putin, que se tornou um militante fervoroso da causa ortodoxa desde que ele se projetou como czar, decidido a permanecer 18 anos ou mais no trono.

Putin provavelmente queria que a cooperação russo-ucraniana funcionasse como em Oktiabrsk. Esse porto do sul da Ucrânia é a plataforma de carregamento das armas vendidas, em total legalidade, pela Rússia (2ª maior exportadora do mundo) e pela Ucrânia (10ª exportadora) aos regimes autoritários da África, da Ásia e do Oriente Médio. Em 1962, foi a partir de Oktiabrsk, na desembocadura do Mar Negro, que foram lançados os mísseis da famosa crise cubana que quase virou guerra entre a URSS e os Estados Unidos.

Ainda se tem um pouco de União Soviética em Oktiabrsk, onde ucranianos e russos vivem um amor idílico. "Moscou exerce um controle incontestável sobre Oktiabrsk, apesar de este se situar na Ucrânia. O proprietário do porto e seus operadores têm laços estreitos com os militares russos e com o Kremlin", explicam Tom Wallace e Farly Mesko em um relatório publicado em setembro na internet.

Esse texto incrivelmente documentado descreve as ramificações da "rede Odessa", ou seja, as poucas empresas envolvidas no transporte de armas, uma esfera de atividade normalmente mais obscura. Durante meses, os dois pesquisadores americanos da ONG c4ads registraram as saídas de navios a partir de Oktiabrsk.

Entre 2012 e 2013, eles constataram que a Síria se tornou a destinação principal para as companhias de frete marítimo da "rede Odessa". Essas companhias, em número restrito, têm laços estreitos com as agências de exportação de armamentos, a russa Rosoboronexport e a ucraniana Spetstechnoexport, e com os governos desses países. Partidários da Europa ou da Eurásia trabalham ali de mãos dadas, sem peso na consciência. E o mesmo vale para a UE, uma vez que os serviços financeiros da "rede Odessa" costumam se estabelecer na Letônia.

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