quinta-feira, 26 de julho de 2012
As armas do vazio mental
A conveniência militar alheia não é um problema a ser resolvido pelo Brasil
Diz um dos dois argumentos que já está em prática, na indústria bélica, a inscrição indelével, a laser e em cada arma e projétil, indicando sua procedência. Assim será possível saber, quando de violações das normas internacionais e transgressão dos direitos humanos, o país que forneceu as armas em uso.
Belo e carinhoso consolo, sem dúvida, para as crianças que perderem seus pais e para os pais que perderem seus filhos estilhaçados por armamentos, agora sim, de procedência inapagável. Para usufruir do consolo, porém, resta ainda um pequeno problema que a inventividade dos engenheiros da matança, por certo, vai resolver.
Fatos atuais ajudam a expor a questão pendente. Há 24 horas noticia-se, inclusive com fotos e vídeos, o recurso do ditador sírio Bashar Assad ao bombardeio aéreo de cidades do seu país. É um reforço mais drástico e preciso aos tiros de canhões, no entanto continuados. E às metralhas pesadas e também canhões dos tanques.
A população civil vê e ouve os aviões, e vê as bombas em direção a suas casas, suas famílias, à vizinhança. Não vê os canhões e não é certo que ouça os seus estrondos, mas ouve o silvo fino e feroz de suas balas cortando o ar. Todas essas peças assassinas com sua procedência devidamente identificada. Ainda a tinta ou talvez já a laser.
A população vê e ouve os sinais do sofrimento e da morte. Mas lerá a inscrição dos petardos em seu voo? E depois de bombas, balas e foguetes destruídos por sua própria explosão, onde estarão as inscrições para a comprometedora "identificação de quem os forneceu"? É provável que parte deles até ostentasse o nosso "made in Brazil". Impossível afirmar ou negar: sabemos estar entre os exportadores de bombas terríveis, mas estamos proibidos de saber para quem as exportamos.
Não se sabe se o outro argumento foi criado pelo mesmo vácuo mental que invocou a "inscrição identificadora", ou se foi um dos prodígios intelectuais que a adotam no Itamaraty, nas Forças Armadas, no jornalismo. A suposição de que os outros também padecemos de idiotia é a mesma, nos dois argumentos.
Eis o segundo: o sigilo das exportações de armas é necessário porque os compradores querem segredo do tipo e quantidade de seus armamentos.
Antes de tudo: nem sempre. Com a ideia fixa (da qual emanava certo cheiro de charuto cubano) de que os Estados Unidos usariam a Colômbia para atacar a Venezuela, Hugo Chávez tratou de alardear suas grandes compras militares. Se houve, o risco arrefeceu e foi silenciado pelo novo presidente colombiano, Juan Manuel Santos, mais lúcido do que o antecessor Uribe.
Acima de tudo, a conveniência militar alheia não é problema a ser resolvido pelo Brasil. Ainda mais se o pretendente a comprador é uma ameaça a relações normais com seus vizinhos ou à liberdade e aos direitos humanos em seu país.
Esta regra essencial no Estado de Direito é transgredida pelo Brasil, com suas exportações de bombas condenadas e outras armas para o Oriente Médio e para ditaduras africanas. E ainda em operações triangulares: a exportação para a ditadura de Robert Mugabe, do Zimbábue, no governo Fernando Henrique, foi tornar mais feroz a terrível guerra civil no Congo. Mas, nas organizações internacionais, e em casa mesmo, o governo brasileiro mostrava-se muito condoído com o genocídio congolês.
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