Casa em que Bin Laden viveu mais de 5 anos no Paquistão |
Analistas de inteligência e policiais frequentemente encontram pornografia enquanto buscam evidências contra terroristas ou suspeitos de terrorismo. Especialistas no campo se veem em conferências discutindo seriamente se tais descobertas deveriam ser anunciadas publicamente. A ideia é que talvez a exposição desse duplo padrão poderia minar, por exemplo, as narrativas de extremistas islâmicos sobre a decadência do Ocidente.
Após invadirem o esconderijo de Osama Bin Laden em Abbhottabad, Paquistão, no domingo (01/5), os agentes da unidade de Navy Seals apreenderam grandes quantidades de dados e documentos. A mídia americana informou a descoberta de cinco computadores além de 10 discos rígidos e cerca de 100 objetos de armazenagem de dados como pen drives ou CD-roms. Ainda não está claro se Bin Laden pessoalmente usou esse material. Igualmente, não se sabe se de fato o material contem informações relevantes ou se os dados estão codificados ou protegidos de alguma forma.
A esperança, ao menos, é que a descoberta lance uma luz a cantos obscuros do mundo da Al Qaeda. De acordo com fontes em Washington, analistas da CIA e de outras agências já estão estudando o material em um local secreto para obterem uma visão geral de seu conteúdo o mais rápido possível. Partes das informações ali contidas podem ser urgentes, por exemplo, se estiverem relacionadas a ataques iminentes.
Há anos que a Al Qaeda é uma prioridade para os serviços de inteligência em torno do mundo. Contudo, muitas questões não foram respondidas, forçando analistas e os que têm que tomar decisões com base em suas recomendações a dependerem de conjecturas e especulações. O “Spiegel Online” fornece uma visão geral das questões mais prementes que o material de Bin Laden pode ajudar a responder.
O livro de endereços de Bin Laden
Com quem o fundador da Al Qaeda se comunicava nos últimos anos? A maior parte dos analistas presumia que Bin Laden e seu segundo no comando, Ayman Al Zawahiri, estivessem escondidos em locais diferentes e minimizando comunicações para diminuírem o risco de serem eliminados simultaneamente. A primeira parte desta conjectura agora foi confirmada.
Assim, os analistas querem descobrir rapidamente possíveis pistas de comunicação que possam levá-los ao esconderijo de Al Zawahiri, provável herdeiro da liderança da Al Qaeda. Esta informação, se existe, pode ser extremamente urgente –é provável que Al Zawahiri já esteja planejando se mudar por razões de segurança.
Os contatos de Bin Laden com outros membros do alto escalão da Al Qaeda também são de grande interesse. Será que os dados incluem informações sobre o paradeiro de Abu Yahya Al Libi, estrela ascendente da Al Qaeda que é o principal ideólogo da organização? E de Ilyas Kashmiri, que planeja ações terroristas, ou do treinador militar Saif Al Adel, que parece ter voltado do Irã ao Paquistão? É provável que Bin Laden tenha codificado ou protegido tais informações, mas os analistas talvez ainda assim possam reconstruir partes do quebra-cabeça.
Atuais planos de ataques terroristas
Especialistas em inteligência também procurarão urgentemente informações sobre possíveis ataques terroristas que estejam sendo planejados atualmente na região ou no exterior. Anteriormente pensava-se que Bin Laden não estava mais envolvido nas operações diárias da Al Qaeda para não ameaçar sua segurança. Mas após uma revisão preliminar de parte dos dados apreendidos no esconderijo, a inteligência americana descobriu que ele tinha consciência de pelo menos parte das operações da Al Qaeda.
Esta informação incluiu a revelação que a Al Qaeda havia pensado em atacar linhas de trem norte-americanas no ano passado. A mídia americana divulgou a existência de um caderno de notas que contém detalhes de um possível plano, envolvendo a mudança de trilhos para descarrilar um trem, possivelmente em uma data significativa como o aniversário dos ataques de 11 de setembro de 2001.
Apesar de não haver evidências de um plano concreto, esta informação mostra que Bin Laden não se aposentou e adotou apenas um papel de figura de liderança, como alguns pensavam.
Elos com a agência de inteligência paquistanesa ISI
O esconderijo de Bin Laden fica ao lado de uma cidade que abriga um quartel do exército paquistanês e é cercada por propriedades supostamente de ex-generais paquistaneses. Isso aumenta as suspeitas que membros da agência de inteligência paquistanesa ISI talvez soubessem onde estava o cabeça da Al Qaeda. A ISI há muito tem uma reputação duvidosa, e com razão. Alguns de seus membros abertamente apoiam o Taleban do Afeganistão e outros grupos terroristas. Se as posses apreendidas de Bin Laden revelarem uma farsa, as relações entre os EUA e o Paquistão podem ser significativamente modificadas, inspirando os EUA a exercerem enorme pressão sobre Islamabad.
A trilha do dinheiro
Documentos do Departamento de Estado dos EUA publicados pelo WikiLeaks mostram, entre outras coisas, como os EUA estavam desesperados na última década para identificar fontes de patrocínio da Al Qaeda. Empresários ricos de países da península árabe, assim como organizações de caridade duvidosas eram suspeitos.
Uma das razões por que Bin Laden era importante para a Al Qaeda era que, como figura simbólica, estava em posição de gerar doações. Informações apontando para tais patrocinadores da Al Qaeda poderiam ser usadas para secar as fontes de verbas da rede terrorista.
Os tentáculos da Al Qaeda e o sucessor de Bin Laden
Parceiros em cooperação
A Al Qaeda não é mais uma única organização e sim uma rede transnacional. Existem ramos com permissão de usar o nome da Al Qaeda no Iraque, na península árabe, e no Norte da África. Há também redes militantes independentes que cooperam com a Al Qaeda no Sul da Ásia e na Somália, por exemplo, assim como na região do Hindu Kush, inclusive o Taleban do Paquistão (TTP) e o Movimento Islâmico do Uzbequistão (IMU). Por um longo tempo, as agências de inteligência ocidentais suspeitaram que Bin Laden ajudava a decidir as nomeações nos ramos da Al Qaeda. Será que também teria tido um papel em negociar acordos de cooperação?
Em janeiro, autoridades de segurança paquistanesas prenderam um suspeito nos ataques de Bali. Ele foi preso perto da casa de Bin Laden, e hoje acredita-se que era seu destino quando foi pego. Talvez os dados de Bin Laden tenham outras pistas sobre as trilhas levando a outros terroristas? Poder-se-ia tirar conclusões dos dados relativas às visões de Bin Laden para o Iêmen, Arábia Saudita e Somália? Quais regiões o chefe da Al Qaeda considerava mais significativas estrategicamente?
Bin Laden deixou um legado?
Bin Laden com certeza esperava que seria descoberto ou traído, cedo ou tarde. É claro que imaginava que seria venerado como mártir pelo movimento, independentemente de ser morto ou preso. Mas Bin Laden também era vaidoso: ele gostava de estar nos holofotes e escrevia poesia. Talvez tenha deixado para trás um livro ou uma coleção de notas que serviriam como legado político ou ideológico para seus seguidores e futuros jihadistas? Em caso afirmativo, os EUA provavelmente os manteriam secretos por algum tempo, mas ainda poderiam servir como fonte valiosa de informações.
Esclarecimento dos ataques
Nos últimos anos, certos ataques terroristas claramente pareciam inspirados pela Al Qaeda ou Osama Bin Laden, mas nunca foram atribuídos definitivamente à rede terrorista ou ao seu líder. Um exemplo foram as explosões em Madri em abril de 2004, que se acredita terem sido conduzidas por um grupo extremista islâmico agindo em nome da Al Qaeda. Os dados apreendidos podem ajudar os analistas a estabelecerem conexões concretas pela primeira vez.
O que Bin Laden sabia?
Supostamente, não havia nem telefone nem conexão de Internet no esconderijo de Bin Laden –presumivelmente por razões de segurança. Mas quanto o líder terrorista sabia sobre o que estava acontecendo pelo mundo? O que ele lia? Quais eram seus interesses? Teria ideia de quanto os EUA sabiam sobre ele? Como recebia informações? Em suas mensagens de áudio, Bin Laden ocasionalmente citou autores ocidentais. Onde ele adquiriu este conhecimento?
Vídeo e áudio
Mesmo escondido, a influência de Osama Bin Laden no cenário jihadista continuava significativa, graças às mensagens de áudio que enviava a cada dois meses. Seria interessante se os materiais apreendidos em sua casa fornecessem informações sobre como essas mensagens eram criadas. Ele as fazia sozinho? Elas foram editadas ou gravadas em colaboração com outros líderes? Que forma era a cooperação com Al Sahab, o departamento de propaganda da Al Qaeda? Por que não houve a divulgação de vídeos por anos? Ao menos uma mensagem de áudio foi encontrada na casa. Sua divulgação próxima já foi anunciada por sites jihadistas.
Indicações de conflito
Entre as armas que os EUA empregaram em sua luta contra a Al Qaeda estava a chamada “comunicação estratégica”. Possíveis pontos de conflito dentro da rede terroristas eram rapidamente publicados, por exemplo. No passado, a rede terrorista ficou dividida, por exemplo, em torno de questões sobre o grande número de muçulmanos entre as vítimas dos ataques. Se os dados de Bin Laden derem informações sobre cisões antes desconhecidas dentro da Al Qaeda, as autoridades norte-americanas podem usá-las como munição.
A mídia e o público em geral devem exigir que a divulgação dos documentos originais. É improvável que as autoridades norte-americanas divulguem informações que possam ser relevantes à segurança americana. Mas em outras descobertas similares, no Iraque por exemplo, grandes partes foram disponibilizadas posteriormente. Dada a enorme quantidade de mídia de armazenagem confiscada, os pesquisadores podem encontrar material para ocupá-los por anos –desde que os documentos sejam legíveis e relevantes. E no momento, apenas meia dúzia de pessoas sabem se este é o caso.
A solução para o problema da al-Qaeda e do jihad global passa por dois caminhos:
ResponderExcluir-- O enfrentamento às organizações terroristas
-- E a deslegitimação da ideologia jihadista.
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Enquanto não se conseguir isolar o seu discurso, o Ocidente pode até destruir a al-Qaeda, mas dificilmente acabará com o terrorismo jihadista global.
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O desaparecimento repentino de um líder carismático como Bin Laden pode causar dificuldades para qualquer organização terrorista, quem sabe até deflagrando uma luta interna pelo controle.
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Contudo, isto não deve ocorrer no caso daquela organização.
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A morte do líder e fundador da al-Qaeda não deve trazer transtornos, pois Bin Laden já havia nomeado como seu sucessor o seu segundo em comando, o médico egípcio Ayman al-Zawahiri, que de fato já vinha comandando a organização desde 2009.
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Zawahiri, apesar de não ter o mesmo carisma de Bin Laden, é o ideólogo da organização e um excelente estrategista.
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A médio e logo prazo, outros membros - como o americano de ascendência iemenita Anwar al-Awlaki, da al-Qaeda da Península Arábica - podem vir suprir a falta que o carisma de Bin Laden possa fazer sentir.
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Quanto a um eventual afastamento, ele não deve ocorrer porque a al-Qaeda sempre deu aos grupos locais e às suas afiliadas a liberdade de perseguirem seus objetivos locais sem interferência.
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A eliminação de Bin Laden foi resultado da modificação da política antiterrorista dos Estados Unidos em 2009, que passou a dar mais ênfase à inteligência e à eliminação física dos líderes mas, apesar deste sucesso, a política de decapitação é historicamente falha na desarticulação de organizações terroristas.
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Saudações,
konner.