Joseph Kabila é fotografado ao votar |
Colunas de fumaça preta de pneus incendiados cobriam partes desta capital dilapidada na última sexta-feira (9), enquanto Joseph Kabila, o atual presidente, era declarado o vencedor oficial da contestada eleição no Congo, derrotando seu rival mais próximo por mais de 15 pontos percentuais em um resultado que muitos aqui temem que provoque novas ondas de violência política.
A eleição foi considerada falha, talvez demais, por observadores internacionais, e Kabila não é popular em Kinshasa, uma cidade de quase 10 milhões de habitantes onde ele perdeu nos votos. Por toda a ampla metrópole na tarde de sexta-feira, as ruas eram margeadas por simpatizantes taciturnos e silenciosos do homem que ficou em segundo lugar na apuração nacional, o líder veterano da oposição, Etienne Tshisekedi.
Em entrevistas, muitos disseram sentir que a eleição foi roubada. O silêncio era pontuado por tiros, quando policiais, com as armas apontadas para fora de suas viaturas, disparavam no ar para dispersar as multidões.
Tshisekedi já rejeitou os resultados preliminares, dizendo que a eleição foi fraudulenta, e na tarde de sexta-feira um porta-voz disse que o líder de oposição se considerava o presidente-eleito por direito –um indício de possíveis problemas à frente.
“Ele disse que se considera o presidente-eleito da República Democrática do Congo”, disse Albert Moleka, o chefe de gabinete de Tshisekedi, na sexta-feira.
As multidões, fugindo das viaturas policiais, ocasionalmente tomavam inesperadamente as ruas sob a luz brumosa de fim de tarde.
“Você viu a tristeza?” disse Jean-Paul Mbuyi, um empresário, apontando para a fila de pessoas em silêncio do outro lado da rua de terra, no bairro Matonge. “Está claro. Ele trapaceou. Você vê como as pessoas estão quietas?”
Disparos da polícia ecoavam.
“Eles fazem isso no seu país?” perguntou Mbuyi. “Isso é democracia?”
O anúncio na sexta-feira, pela comissão eleitoral do Congo, não foi inesperado e foi saudado por buzinaço pelos partidários de Kabila, em um distrito do centro altamente protegido por guardas. A comissão apurou quase 49% dos votos para Kabila e 32% para Tshisekedi. Kabila está no poder desde 2001, quando assumiu o governo no lugar de seu pai assassinado, o líder rebelde Laurent, e foi eleito pela primeira vez em 2006.
Desde então tem crescido a insatisfação com seu governo, escreveu em maio o Grupo Internacional de Crises, enquanto o país permanece atolado no fundo do Índice de Desenvolvimento Humano da ONU e 50% da população no país do tamanho da Europa Ocidental são considerados desnutridos.
Mas bem antes da eleição de 28 de novembro, Kabila adotou medidas que o Grupo Internacional de Crises e outros observadores sugeriram que poderiam levar a suspeitas de que ele estava facilitando seu caminho para a reeleição –a eliminação do segundo turno eleitoral, em uma mudança na Constituição realizada neste ano, por exemplo, e por meio da nomeação por seu partido de maioria dos integrantes da comissão eleitoral, que também é comandada por um aliado do presidente.
Somada à descrição nesta semana pelo Grupo Internacional de Crises da votação como sendo “caótica”, “indisciplinada” e “opaca”, o cenário parecia preparado para maior desordem, particularmente em Kinshasa, onde Kabila estava 34% atrás até mesmo na contestada pesquisa da comissão eleitoral.
Tshisekedi fez alertas velados de que poderia convocar seus seguidores –ele os chama de “combatentes”– às ruas para contestar a eleição, que ocorreu há mais de uma semana. Pelo menos 18 pessoas já foram mortas em violência associada à votação calamitosa, vista pelos observadores estrangeiros como mal administrada pelas autoridades eleitorais do Congo, que dirigiram 63 mil locais de votação por todo o país.
Os observadores disseram que ocorreram sérias dificuldades, incluindo locais de votação que não abriram, falta de cédulas eleitorais, urnas que chegaram tarde, foram abandonadas na lama e podem ou não ter sido contadas. A maioria dos observadores não chegou a chamar a eleição de fraudulenta, apesar de alguns terem dito que as falhas em todo o processo eleitoral foram tamanhas que o resultado a favor de Kabila estava desacreditado.
“Ele pode ter vencido de um ponto de vista legal, mas certamente não foi uma vitória legítima”, disse Theodore Trefon, um especialista em Congo do Museu Real para a África Central, na Bélgica, o antigo poder colonial.
“A eleição não é crível”, disse Trefon, autor do livro recém-publicado “Congo Masquerade”. “Há evidência suficiente por parte dos observadores internacionais. Nós sabemos que Kabila trapaceou. Não é uma questão de percentuais.”
Perto da residência de Tshisekedi, um bando de partidários de Kabila tomou a estrada na tarde de sexta-feira, cantando slogans e erguendo um retrato do presidente reeleito. Em outros pontos da cidade o sentimento parecia mais melancólico.
“A cidade está inerte. É como se fosse um funeral nacional. As pessoas não estão felizes”, disse Dodi Miutshita, um estudante de 27 anos.
“É possível ver pessoalmente como estão as pessoas neste bairro”, disse Simon Mbaya, apontando para uma longa estrada árida margeada por cidadãos com rostos taciturnos.
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