Usina nuclear de Bushehr, primeira do Irã, construída por engenheiros russos às margens do Golfo Pérsico |
Por várias semanas, o governo Obama vinha argumentando que as sanções estavam começando a se fazer sentir, cortando o acesso do Irã ao capital estrangeiro, suspendendo investimentos em seu setor de energia e impedindo a entrada e saída de seus navios em portos estrangeiros.
Mas apesar dos fortes indícios de que o Irã está começando a sentir dor –em grande parte pelas sanções adicionais impostas pelos Estados Unidos e pelos países europeus e asiáticos nos últimos meses– o relatório de segunda-feira da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) indica que, até o momento, elas fracassaram em forçar o Irã a atender os antigos pedidos.
A agência protestou que o Irã impediu a entrada no país de dois de seus inspetores mais experientes. Eles foram barrados apenas dois dias após o Conselho de Segurança ter aprovado suas sanções mais recentes, parte de um antigo padrão de redução do acesso em retaliação à ação da ONU. Mas o Irã permitiu a entrada de outros inspetores.
O relatório também reitera que, desde agosto de 2008, o Irã se recusa a responder perguntas “a respeito da possível existência no Irã de atividades nucleares não reveladas, passadas ou atuais, envolvendo organizações ligadas às forças armadas, incluindo atividades relacionadas ao desenvolvimento de uma ogiva nuclear para míssil”. O relatório disse que era “essencial um engajamento do Irã com a agência a respeito dessas questões”, porque as evidências podem se degradar com “a passagem do tempo”.
O Irã argumenta que tem o direito de expulsar inspetores em que não confia e disse em diversos casos que a agência, uma unidade da ONU, “não tem base legal” para fazer seus pedidos.
O governo Obama disse que o relatório demonstrou que o Irã “mantém seu esforço para expandir seu programa nuclear e se aproximar de capacidade de armas nucleares”, um reconhecimento de que, pelo menos até agora, as sanções não forçaram o Irã a mudar de direção.
Um porta-voz da Casa Branca, Tommy Vietor, acrescentou que “os Estados Unidos estão aplicando uma pressão internacional crescente e sem precedente sobre o governo iraniano” e que “enquanto o Irã permanecer no caminho atual, seus líderes aprofundarão o isolamento do Irã e o preço que claramente o país está pagando”.
Nas últimas semanas, altos funcionários no governo Obama disseram que eles acreditam que levaria pelo menos um ano para o Irã converter seus estoques de combustível nuclear em armas, dando aos Estados Unidos, Israel e outros um tempo considerável para reagir a qualquer esforço de “breakout” –a conversão dos estoques de urânio pouco enriquecido em material para armas.
Essa estimativa, como reconhecem as autoridades, presume que o Irã não tenha qualquer instalação de produção oculta. Pouco trabalho ocorreu em uma instalação dessas, próxima de Qom, desde que sua existência foi revelada no ano passado, indicou o relatório. Mas o Irã ainda se recusa a levantar o véu sobre as origens dessa instalação, se recusando a dar aos inspetores as plantas da instalação, que eles exigiram para entender seu verdadeiro propósito.“A informação requisitada é essencial”, disse o relatório.
Nas áreas em que foi concedido acesso aos inspetores, o relatório indica um progresso lento, mas constante, na produção de urânio pouco enriquecido. Os inspetores disseram que o Irã já produziu 2.770 quilos de urânio pouco enriquecido em sua instalação principal, em Natanz. Isso representa um aumento de 15% nos estoques do país nos últimos três meses. Com conversão adicional, isso seria suficiente para a produção de aproximadamente duas armas.
O novo relatório citou vários casos de desobediência por parte do Irã em fornecer informação, material e acesso aos inspetores, assim como seu fracasso em suspender seu programa cada vez mais agressivo de enriquecimento de urânio.
O relatório também apontou a recusa do Irã em fornecer detalhes de seus projetos para desenvolvimento de uma usina para produção de água pesada, assim como um novo reator. O Irã argumenta que renunciou qualquer obrigação legal de fornecer esses detalhes à agência.
Na segunda-feira, o Instituto para Ciência e Segurança Internacional, um grupo privado em Washington, destacou o risco militar. Ele disse que a crescente opacidade aumenta o risco de que “o Irã possa buscar aumentar sua capacidade desviando material nuclear em segredo e produzindo urânio para armas em uma instalação desconhecida para os inspetores ou agências de inteligência ocidentais”.
Em uma linguagem surpreendentemente dura, o relatório criticou fortemente a proibição pelo Irã, em junho, de entrada de dois inspetores da agência no país. O governo disse que o fez por causa da ligação deles com “declarações falsas e erradas”.
Mas a agência insistiu que os inspetores não fizeram nada errado.“A agência tem plena confiança no profissionalismo e imparcialidade dos inspetores envolvidos”, ela disse.
O relatório também criticou um impedimento anterior de entrada de inspetores, em 2007, dizendo que a agência precisa de “inspetores com experiência no ciclo de combustível e instalações do Irã”. As repetidas proibições de entrada, acusou o relatório, “impedem o processo de inspeção”.
O relatório notou que o Irã tem se recusado a revelar informação sobre suas operações para fabricação de centrífugas, que são utilizadas no enriquecimento, e para outro caminho para produção de combustível nuclear, chamado enriquecimento a laser.
O Irã também não forneceu informação sobre sua extração e moagem de urânio, disse a agência. Segundo o relatório, o Irã, ao tratar dessas questões no final do mês passado, “não forneceu à agência a informação requisitada, mas reiterou que ‘continua cooperando’.”
Um diplomata europeu chamou a linguagem do relatório a respeito do impedimento de entrada dos inspetores de “bem forte”. As ações do Irã, ele acrescentou sob a condição de anonimato, citando as regras diplomáticas, estão lentamente cegando a agência e minando sua capacidade de conduzir inspeções com o tipo de liberdade necessária para enxergar além das negações e repúdios oficiais.
O relatório, em sua conclusão, declarou que Teerã “não forneceu a cooperação necessária para permitir à agência confirmar que todo o material nuclear no Irã é para fins pacíficos”.
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