Na busca por Bin Laden, vacinadores colheram DNA
Casa de Bin Laden Abbottabad |
No Paquistão, a decisão da CIA de usar uma equipe de vacinação para entrar no imóvel de Osama bin Laden e colher informações e amostras de DNA claramente afetou a campanha nacional contra a pólio. A questão é: quanto?
Depois que o ardil do médico Shakil Afridi foi revelado por um jornal britânico, há um ano, vacinadores legítimos foram expulsos de aldeias, acusados de serem espiões.
Em junho, comandantes do Taleban em dois distritos proibiram as equipes de vacinação até que os EUA parassem seus ataques com aviões teleguiados. Um deles citou Afridi, que cumpre pena de 33 anos imposta por um tribunal local, como exemplo de como a CIA poderia usar a campanha para acobertar espionagens.
"Foi um retrocesso, sem dúvida", admitiu Elias Durry, coordenador da Organização Mundial da Saúde para a poliomielite no Paquistão.
Mas ele e outros líderes da guerra global à pólio dizem que já se recuperaram de reveses piores. Nos dois distritos, os montanhosos Waziristão do Norte e do Sul, vivem apenas 278 mil crianças menores de 5 anos de idade -o público-alvo da vacinação. No norte da Nigéria, por outro lado, onde a pólio está sendo vencida após anos de resistência da opinião pública, há milhões e milhões de crianças.
Além disso, disse Durry, os vacinadores atingiram 225 mil crianças no Waziristão antes da proibição. Todas elas irão precisar de várias doses para ficarem protegidas, mas cada dose dada é um tempo ganho. A verdade provavelmente só se revelará após o pico de casos da pólio nos meses de verão.
Em julho de 2011, a indignação atingiu o auge, quando o jornal londrino "The Guardian" expôs a conexão da CIA. Ela foi confirmada em janeiro pelo secretário de Defesa dos EUA, Leon Panetta. Em maio, quando Afridi foi sentenciado, grupos humanitários protestaram junto a David Petraeus, diretor da CIA.
"Dificilmente poderia haver iniciativa mais estúpida e certamente haveria uma reação, especialmente no caso da pólio", disse Zulfiqar Bhutta, especialista em vacinas da Universidade Aga Khan, no Paquistão.
Bhutta, que também dirige o comitê de ética científica do governo, disse que Afridi e a CIA deveriam ser "processados ou algo pior". Para estabelecer sua credibilidade, as equipes vacinaram bairros inteiros em Abbottabad sem permissão.
Os casos de paralisia infantil no mundo todo despencaram de 350 mil, na década de 1980, para cerca de 600, atualmente. O Paquistão teve 198 casos, no ano passado. Para cada caso conhecido, há cerca de 200 portadores sem sintomas, acreditam os especialistas. Desde o começo do ano, foram detectados apenas 22 casos no Paquistão. Mas o vírus permanece nas amostras de esgoto, o que significa que as pessoas continuam a evacuá-lo.
Rumores sobre a vacina da pólio abundam: que é um complô ocidental para tornar as meninas estéreis, que não é considerada limpa perante a lei islâmica, que contém o vírus da Aids.
Há cinco anos, quando partidários do Taleban agrediram vacinadores no Afeganistão, a Unicef e a OMS convenceram o líder do Taleban, mulá Muhammad Omar, a expedir salvo-condutos para as equipes.
Agora as agências querem negociar com comandantes locais no Paquistão.
"Eles sabem que não temos nenhum controle sobre os ataques com aviões teleguiados", disse Bruce Aylward, chefe de erradicação da pólio da OMS. "E ainda não conheci um pai que prefira ter um filho paralisado."
Bhutta disse que ainda acredita que o Paquistão irá eliminar a pólio. "Por mais trágico que seja, estou confiante de que a resistência vai sumir", disse ele. "O 'establishment' religioso racional já está envolvido e a minoria lunática é apenas a minoria lunática."
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