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quinta-feira, 26 de julho de 2012

Aleppo, segunda maior cidade da Síria, se prepara para o contra-ataque do regime


Rebelde sírio volta seus olhos para os céus de Aleppo temendo a chegada dos helicópteros
das tropas do governo sírio

Nesta terça-feira (24), há ruas em Aleppo onde Abdallah, comandante do Exército Livre Sírio (ELS), bebe e come tudo que os vizinhos lhe oferecem. Não é grande coisa, pão molhado em extrato de tomate ou água gelada, mas cadeiras de plástico são trazidas até a soleira da porta e encontra-se tempo para fazer piadas entre um alerta e outro. De repente, um homem alto --até então conhecido como um mecânico respeitável do bairro-- decidiu se juntar aos insurgentes, naquele mesmo instante. Ele correu para sua casa e voltou rapidamente, ainda com os mesmos mocassins beges pontudos, mas também com dois cinturões de munição ensanguentados por cima de sua regata e, nas mãos, um fuzil de atirar em coelhos ao qual ele prendeu uma faca de cozinha em volta do cano.

Nesses bairros, os insurgentes foram recebidos como vencedores. Há também ruas de outra espécie. Na terça-feira (24), nas proximidades do prédio central da polícia, cercado por um grupo do ELS, o comandante Abdallah recusou a água que lhe ofereceram. Ele não confiava, alguém poderia ter colocado veneno dentro. Ele se mostrava muito sério: “Isso acontece aqui”. Em torno dele, formou-se uma multidão de rostos impassíveis. Em um suspiro de crítica, uma voz deixou escapar: “Antes tínhamos paz. Vivia-se tranquilamente”. Aos jornalistas, as perguntas eram feitas com precisão um tanto excessiva: “Vocês têm um visto oficial para circular?” Um gordinho entrou no meio da multidão, manejando um bastão com gestos seguros.

Mais além, em um cruzamento, os tiros são retomados. Enquanto todos procuram um abrigo, um homem de djellabah bate ostensivamente sua porta a todos os estrangeiros do bairro. Um vizinho faz um gesto pedindo perdão, tampouco abrindo sua casa: “É o medo”, ele explica. Em alguns blocos de casas, de repente estamos em outro mundo e a Síria volta a lembrar a imagem que se traçou dela, durante os mais de 40 quarenta anos que aproximaram o regime.

Na terça-feira de madrugada, o destino de Aleppo, a segunda maior cidade do país, ainda era incerto, ainda que os rebeldes estivessem fechando o cerco cada vez mais sobre o centro histórico, se apoderando das portas em torno das fortalezas, uma atrás da outra. É um desses momentos confusos, onde não se tem certeza de nada. O quartel-general da polícia está cercado, e carros belos e vistosos demais para pertencerem a simples cidadãos deixam a cidade às pressas. As administrações se esvaziam. Cidade rica, mantida por algumas grandes famílias, Aleppo era até então um dos lugares menos agitados da Síria.

Hoje, suas primeiras vacilações colocaram pela primeira vez o governo de Damasco em real dificuldade. Ao mesmo tempo, insistentes ruídos anunciavam uma contraofensiva de envergadura do exército regular e aviões de combate bombardearam a cidade na noite de terça-feira, o que nunca havia acontecido até então. Desde domingo, quando as forças rebeldes chegaram em peso a Aleppo, os combates vêm acontecendo da mesma maneira, por enquanto. Por um lado, os soldados do exército regular nunca colocam os pés em terra, onde eles não têm nenhuma posição real: eles combatem exclusivamente a bordo de tanques ou através de bombardeios aéreos. Logo, os rebeldes --que têm para se locomover somente suas pernas e algumas vans com as iniciais de grandes hotéis da cidade histórica-- vão ganhando terreno rapidamente, se alastrando pela cidade como água.

Os únicos a combatê-los rua por rua, atirando um dia inteiro pelo controle de uma rotatória, são os paus-mandados do regime, os shabihas. Eles, que surgiram com a “revolução” --como é chamada aqui por seus partidários--, deveriam ser a arma absoluta para combatê-la, mais assustadores do que a própria assustadora Síria. “Como os sírios não temiam mais sair às ruas, a missão deles era alimentar o medo”, explica um engenheiro. “Roubar, matar, eles podiam tudo, tinham ordem para tudo”. Em poucos meses, eles constituíram uma espécie de milícia, impondo uma malha fina nos bairros. Foram eles que atacaram as manifestações, atirando na multidão, espancando as pessoas, saqueando as lojas em plena luz do dia. Foram eles também que entraram nas casas, executando sem nenhum julgamento e com imensa crueldade os habitantes suspeitos de simpatizarem com as forças rebeldes.

No bairro de Bab al-Haddid, na terça-feira de manhã, um grupo rebelde acabava de assumir posição quando duas pessoas lhe apontaram discretamente uma janela em uma ruela. Elas disseram somente uma palavra, “shabiha”, sem mesmo chegar a pronunciá-la em voz alta, e de repente foi todo o terror da Síria que se escutou nesse sussurro. Completamente abandonado pelo regime, sozinho com seu estoque de munição, o shabiha da ruela não tinha mais nada a perder. Ele soltou sua primeira rajada. As pessoas tentavam se esconder, correndo, a ponto de se pisotearem. Em compensação, quando um helicóptero apareceu mais tarde atirando, foi sem impaciência que procuraram se proteger, demorando-se propositalmente para mostrar que não temiam nada, e respondendo às balas com “Allah akbar” [Deus é grande].

Ao redor do prédio da polícia, recomeçava o combate. O comandante Abdallah, do Exército Livre Sírio, acendeu um cigarro e tirou sua própria garrafa de água da bolsa, recusando o que lhe ofereceram. “Veneno”, ele pensou novamente. Dois novos atiradores foram detectados e ele voltou a sair, mantendo-se rente às casas para se manter protegido. Quinze minutos mais tarde, tocou um telefone. Abdallah acabava de ser ferido.

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