A Otan se reinventa. Seus membros discutirão em Lisboa um novo conceito estratégico que será aprovado neste sábado e marcará a ação da aliança ocidental na próxima década. Durante mais de um ano e por encargo de seu secretário-geral, Anders Fogh Rasmussen, a ex-secretária de Estado americana Madeleine Albright debateu a nova estratégia com um grupo de 12 especialistas de diversos países (entre eles um embaixador espanhol em missão especial) e perfis (políticos, militares, analistas e membros de ONGs).
Neste sábado a Otan deixará definitivamente para trás o fantasma da guerra fria e proclamará a Rússia como sócio preferencial. A nova aliança também quer ser mais política e barata. Abaixo, algumas das linhas mestras dessa nova estratégia, à qual "El País" teve acesso.
- Rússia, novo sócio preferencial. "Os americanos dentro, os russos fora e os alemães sob controle." A frase, atribuída a lorde Ismay, o primeiro secretário-geral da Otan, descrevia os objetivos da aliança no momento de sua criação. A partir deste sábado, Moscou passará a ser um cooperante necessário. A Otan precisa da Rússia, sobretudo para desenvolver uma nova estratégia de dissuasão nuclear, mas também para lutar contra o terrorismo, o tráfico de drogas, o crime organizado, a pirataria no Índico e para a estabilidade do Afeganistão.
"Não podemos continuar vivendo em tom de guerra fria", indica uma fonte militar espanhola conhecedora do documento que será aprovado no sábado na cúpula de Lisboa. Países como Espanha, França, Alemanha e Itália tinham pedido uma relação "mais construtiva" com Moscou e, apesar dos receios de alguns membros, assim será.
- Menos defesa, mais segurança e mais política. As novas ameaças.
Os princípios clássicos de defesa do território da aliança ocidental ficaram sepultados embaixo das Torres Gêmeas de Nova York, derrubadas em 11 de setembro de 2001. O novo inimigo é capaz de atacar o território Otan de fora de suas fronteiras (guerra cibernética) ou com a determinação de morrer matando (terrorismo jihadista). A aliança definirá como novas ameaças e riscos emergentes os Estados falidos, o terrorismo internacional, os ataques cibernéticos, a proliferação de armas de destruição em massa, o crime organizado, o tráfico de pessoas, drogas e armas e a proteção das rotas energéticas. Isto é, sua estratégia se afasta do conceito de defesa e se aproxima do de segurança.
O documento também analisa o risco da pobreza como foco de insegurança, e a gestão de crises, incluindo as humanitárias. "Quando a Otan atua no Afeganistão ou quando interveio depois do terremoto na Caxemira em 2005 o fazia, na realidade, em um limbo doutrinário, porque seu conceito estratégico não o contemplava. A partir de agora, sim", explicam as mesmas fontes.
A Otan não quer se limitar à defesa, e sim contribuir para a resolução política de determinadas situações antes que se transformem em ameaça para a segurança aliada. No ano que vem, desenhará um guia político. Desaparecerão os antigos limites geográficos de atuação, mas ganham importância outros de legalidade e legitimidade ligados à ONU.
- Mais barata: redução drástica do pessoal. A Otan tem atualmente cerca de 13 mil funcionários, e o novo conceito estratégico pretende que sejam menos de 10 mil. Serão reduzidas as agências (de 14 para 3), centros e comitês em todos os países membros, que deverão enviar menos oficiais aos quartéis-generais internacionais.
- Uma organização militar com capacidade civil. A Otan percebeu que a defesa militar não é suficiente para enfrentar as novas ameaças. Por isso desenhou um conceito de segurança mais amplo, no qual se combina a ação militar com a diplomacia, a cooperação ao desenvolvimento e os trabalhos de inteligência. Isto é, a Otan terá uma pequena capacidade civil.
- Segurança cooperativa. A nova Otan buscará cooperação de atores não aliados para eventuais intervenções, assim como para a formulação de políticas aliadas. A aliança quer aprofundar a relação com a UE - 21 aliados são membros da UE - para ser mais prática e baratear os custos, por exemplo, de equipamento para operações, quando ambos tiverem missões no mesmo lugar, como ocorre no Índico ou no Afeganistão. A ideia é que para esses casos a Otan e a UE desenvolvam juntas as necessidades da operação em cada uma das fases, poupando dinheiro e evitando duplicidades.
Assim como na UE, a aliança também promoverá sua relação com o fórum político conhecido como Diálogo pelo Mediterrâneo, do qual participam Argélia, Egito, Israel, Jordânia, Marrocos, Mauritânia e Tunísia. Esse fórum favoreceu a participação de tropas desses países não aliados em operações dirigidas pela Otan, fundamentalmente nos Bálcãs. O reforço da relação da aliança com o Diálogo pelo Mediterrâneo foi uma das principais propostas da Espanha ao novo conceito estratégico. Também serão reforçados outros programas de cooperação com a União Africana (diante da ameaça do Sahel) e países como Nova Zelândia, Austrália e Japão, grandes contribuintes de tropas em operações.
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