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segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um golpe no Paquistão é uma "verdadeira possibilidade"

Uma forte explosão atingiu nesta quinta-feira (11) uma delegacia de Karachi,
a principal cidade do Paquistão, deixando mortos e feridos
Países ocidentais gostariam de negociar com o Taleban, mas o Paquistão preferiria que não. O especialista em terrorismo norte-americano Bruce Riedel conversou com o Spiegel Online sobre como a situação atual no Paquistão é explosiva e quanta influência a Al Qaeda ainda tem.

Spiegel: Senhor Riedel, cada vez mais se fala em negociações com o Taleban no Afeganistão para alcançar um acordo político. Como isso pode ser alcançado?

Riedel:
Estamos todos cansados da guerra, estamos todos procurando uma saída, todos gostaríamos de uma solução política. A questão é: será o Taleban capaz do tipo de processo de acordo e negociação que queremos? E será que ele pode ser separado da Al Qaeda? Há todas as razões para testar essas proposições e não temos nada a perder testando-as. Mas também temos que ser honestos. A chance é boa que a resposta seja não e que os laços entre as duas organizações sejam fortes demais no nível operacional e ideológico. Nos EUA no ano passado, tivemos uma tentativa de ataque ao sistema de metrô em Nova York que foi promovido pela Al Qaeda, mas no qual os terroristas foram cedidos à rede pelo Taleban afegão. Eles estavam envolvidos no recrutamento para um ataque terrorista nos EUA. Isso sugere que será muito, muito difícil romper essa conexão.

Spiegel: Oficialmente, o Taleban afegão insiste regularmente que não está interessados em terrorismo internacional e gostaria de estabelecer boas relações com os vizinhos do Afeganistão. Isso significa que o Taleban afegão não é tão monolítico quanto proclama ser?

Riedel:
O Taleban afegão é composto de várias redes e não está claro quão monolíticas essas redes são entre si. Mas há um fenômeno maior ocorrendo dentro de todos os grupos militantes com base no Paquistão, que é a radicalização. A ideia de uma jihad global está se tornando cada vez mais popular nas bases. O Taleban afegão e paquistanês, que tradicionalmente tinham uma agenda doméstica, está cada vez mais comprando a ideia de um terrorismo globalizado.

Spiegel: Um parceiro de negociação possível dentro do Taleban afegão seria o mulá Baradar, que deixou claro que estava disposto a discutir a ideia de negociações. Mas ele foi preso pelo Paquistão. Teria sido uma tentativa do Paquistão de impedir as negociações?

Riedel:
De fato esta é outra dimensão deste problema complicado. O Paquistão não quer negociações diretas entre o Taleban afegão e o governo do presidente afegão Hamid Karzai ou entre o Taleban afegão e o Ocidente. Ele quer controlar o processo para garantir o resultado que deseja, ou seja, um Estado satélite ao lado do Paquistão. Quando mulá Baradar começou a falar sobre negociações, o serviço de inteligência paquistanês (ISI) o prendeu. Pelo que sei, ele está sob algum tipo de prisão domiciliar amigável agora. Mas está sendo usado pelo ISI como um sinal para outros insurgentes para que não ajam de forma independente.

Spiegel: Os interesses do Paquistão no Afeganistão podem ser legítimos, mas se tornam menos importantes quando o próprio Paquistão está se tornando instável...

Riedel:
O Paquistão hoje já está no meio de uma guerra civil em pequena escala. No ano passado, 25.000 paquistaneses foram mortos ou feridos em atos relacionados ao terrorismo, e isso só de civis. São três vezes o número de civis mortos ou feridos no Afeganistão no mesmo ano. Atualmente, é um país muito frágil, muito volátil e muito inflamável. De muitas formas, é um preço estratégico em toda essa equação. O que acontece no Afeganistão terá enormes ramificações para o que acontece no Paquistão. Um triunfo jihadista no Afeganistão teria enormes reverberações e poderia até sinalizar uma tomada por forças jihadistas no Paquistão.

Spiegel: Algumas pessoas acreditam que a ascensão jihadista ao poder já é mais provável no Paquistão do que no Afeganistão.

Riedel:
Não acredito que seja iminente ou inevitável. Provavelmente nem é o desdobramento mais provável. Mas pela primeira vez é uma verdadeira possibilidade. Poderia acontecer de duas formas: a insurgência Taleban do Paquistão pode crescer sem parar ou, mais provavelmente poderia haver um golpe por simpatizantes jihadistas de dentro dos militares. Há muita inquietação no exército paquistanês por causa de suas operações constantes contra militantes. Poderíamos acordar um dia e ter outro Zia ul-Haqq no poder no Paquistão, um jihadista convicto, somente que desta vez sem a União Soviética como seu inimigo.

Spiegel: É interessante notar que a Al Qaeda não apenas tem relações com o Taleban afegão, mas também com o paquistanês, que quase parece estar agindo como um representante da Al Qaeda.

Riedel:
A razão é que a Al Qaeda aprendeu uma importante lição no Iraque: se você coloca estrangeiros na linha de frente, eles eventualmente vão fazer a população se voltar contra eles. Então no Paquistão, a linha de frente é o Taleban paquistanês, o Lashkar-e-Toiba e todas essas faces paquistanesas. Testemunhe por exemplo a ascensão do Ilyas Kashmiri, terrorista paquistanês de longa data lutando na Caxemira e no Afeganistão. Agora ele é o rosto da jihad no Paquistão. O mesmo é verdade para o Afeganistão. A Al Qaeda não lidera a luta no Afeganistão. Ela deixa o Taleban liderá-la. Mas por trás das cenas, fornece o apoio.

Spiegel: Dada a complexidade do problema, qual deve ser a primeira prioridade da comunidade internacional?

Riedel:
Temos que garantir que isso seja um processo totalmente afegão. Em segundo lugar, precisamos enviar uma mensagem clara para o Paquistão que pode ser parte do processo, mas não pode ser uma força dominante. O Afeganistão não pode ser um Estado satélite do Paquistão.

Spiegel: Qual é a relevância da liderança da Al Qaeda nisso tudo? O que aconteceria, por exemplo, se Osama Bin Laden fosse morto por um avião não tripulado norte-americano?

Riedel:
Teria um simbolismo tremendo. Ele ia se tornar um mártir instantâneo para a jihad. E teria consequências em terra também. Não devemos pensar em Bin Laden morando em uma caverna. Ele está ativamente engajado em controlar uma organização terrorista mundial. Não estou dizendo que dirige tudo. Mas fornece direção estratégica. A verdade é que não temos a menor ideia de onde ele esteja. Não vemos o Alvo Número Um desde 2002. Acreditamos que ele está no Paquistão, é uma boa aposta. Mas a maior caçada da história humana até agora não produziu evidências de onde ele está.

Spiegel: E os relatos recentes atribuídos à uma autoridade anônima da Otan, dizendo que Bin Laden está morando em uma casa confortável no Waziristão do Norte?

Riedel:
Acho que é um palpite razoável, mas apenas isso.

Spiegel: Há rumores em sites jihadistas e em outros lugares que a Al Qaeda já está transferindo quadros para o Iêmen, assumindo que não podem se esconder no Waziristão do Norte por muito tempo dados os aviões não tripulados norte-americanos e a perspectiva de invasão militar.

Riedel:
A julgar pela história da Al Qaeda, eles vão se preparar e planejar antes. Tenho certeza que estão colocando pessoa chaves em locais como Iêmen e Somália, mas também se movendo no Paquistão, onde é fácil se esconder –mesmo nas favelas adjacentes às grandes cidades, especialmente Karachi.

Spiegel: A Al Qaeda se provou bastante resistente.

Riedel:
Sim, a Al Qaeda de fato se provou muito ágil e resistente e está aprendendo a se organizar. Ela se adapta a novas circunstancias e aprende de seus erros. Também são muito pacientes. Eles investiram anos planejando suas operações mais espetaculares. Eles sabem esperar. Então ao todo, está longe de terminado. A Al Qaeda hoje continua um inimigo muito perigoso e não deve ser subestimado.

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