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quinta-feira, 10 de abril de 2014

Crise na Ucrânia faz Alemanha rever sua política militar

Quando a Guerra Fria acabou, militares ocidentais passaram a dar menos atenção à dissuasão militar na Europa. Como consequência, a crise na Ucrânia pegou a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) de surpresa, num momento em que a organização se apressa para encontrar uma resposta adequada à Rússia. E a Alemanha tem se mostrado relutante em colaborar.

O ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, não perdeu tempo depois de retornar a Berlim após a reunião dos ministros das Relações Exteriores da Otan, realizada na semana passada em Bruxelas, na Bélgica.

Ele foi direto até o Parlamento alemão informar os legisladores alemães sobre as decisões tomadas durante o encontro.

E Steinmeier o fez da maneira como gostaria de ser percebido enquanto atua nas negociações de uma solução para a atual crise da Crimeia: de modo calmo, reservado e direto. Na verdade, a única vez que ele demonstrou alguma emoção durante a reunião do Comitê de Relações Exteriores, na última quarta-feira, foi ao falar sobre o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen.

Anteriormente, Rasmussen havia publicado um artigo na página de opinião do diário alemão Die Welt afirmando que o caminho para a adesão à Otan estava totalmente aberto para a Ucrânia.

"O direito dos estados soberanos de determinarem o caminho que desejam seguir é um dos fundamentos da Europa moderna", escreveu Rasmussen.

Essa declaração, porém, marcou um afastamento significativo do objetivo principal da Alemanha, que é reduzir a intensidade do crescente confronto com a Rússia. "A adesão da Ucrânia à Otan não está aguardando uma aprovação nem prestes a ocorrer", bufou Steinmeier.

Ele disse que a política externa corria o risco de se tornar militarizada e acrescentou que já era a hora de os líderes políticos recuperarem seu poder.

Steinmeier, porém, tem plena consciência de que o caminho Rasmussen está projetando não vai desaparecer tão cedo.

Os preparativos para o próximo encontro de cúpula da Otan, que ocorrerá em setembro e reunirá chefes de estado e de governo dos países membros da aliança, já começaram. Até o momento, há apenas um item na pauta: uma nova estratégia para a Otan. A Alemanha se mostra cética. E preocupada.

A cooperação entre a aliança e a Rússia – que levou anos para ser construída – está congelada desde a semana passada. E a Rússia não é mais tida como uma parceira, mas sim como uma adversária. O próximo passo lógico está claro: como colocar em prática a dissuasão militar em 2014?

Esse é um termo que não é ouvido na Europa Ocidental há algum tempo. Antes da queda do comunismo e da desintegração do Pacto de Varsóvia, a dissuasão se baseava no potencial destrutivo das armas atômicas, em centenas de milhares de soldados posicionados na Europa, nos armamentos pesados e nos tanques.

Apenas o exército da Alemanha Ocidental possuía aproximadamente 495 mil soldados, 4,1 mil tanques de combate Leopard e 600 aviões de guerra. Os soldados formavam o núcleo da força defensiva aliada que defendia a fronteira entre os dois blocos de poder – uma fronteira que cortava a Alemanha bem no meio.

Uma terceira via?
Desde então, o orçamento de defesa da Alemanha caiu de 3% do Produto Social Bruto (PSB, principal indicador macroeconômico utilizado para medir a riqueza dos países do antigo bloco soviético, semelhante ao Produto Interno Bruto) para apenas 1,2% do PSB.

Atualmente, a Bundeswehr, o sistema federal de defesa da Alemanha, que reúne as forças armadas e as autoridades civis responsáveis por sua administração e pela parte de compras, conta atualmente com 185 mil soldados – um número que deverá cair ainda mais – e está menos concentrada na defesa da Alemanha do que em participar de algumas poucas missões no exterior.

Em vez de tanques e morteiros estacionados no corredor de Fulda (área mais susceptível a invasões terrestes vindas do leste), a ênfase hoje em dia está nos paraquedistas e helicópteros que são enviados a lugares como Kosovo, Afeganistão e África.

Ninguém está interessado em reverter essa tendência. E se armar para ambos os cenários custaria bilhões de euros que não estão disponíveis. Mas será que há uma terceira via?

O novo debate no âmbito da Otan, sem dúvida, é música para os ouvidos dos velhos combatentes da época da Guerra Fria, que sempre sentiram que a integração de Moscou às estruturas da aliança militar ocidental era uma estratégia perigosamente ingênua.

Mas esse debate também é a consequência lógica de uma revisão relacionada às metas de longo prazo do presidente russo Vladimir Putin.

Se atualmente a Rússia está planejando seu futuro contra o Ocidente, em vez de ao lado dele, então a questão referente à "dissuasão moderna" deve ser levantada, disse à Spiegel um alto funcionário do Ministério da Defesa da Alemanha.

Antes da crise na Ucrânia, muitos se perguntavam a que objetivo a Otan serviria quando as tropas da aliança se retirassem do Afeganistão. Mas agora que Putin anexou a Crimeia – os principais países membros da aliança militar ocidental localizados na fronteira leste do bloco estão se sentindo ameaçados – o clima na sede da Otan em Bruxelas mudou drasticamente.

Segundo uma fonte da Otan, o secretário-geral Rasmussen "está mais confiante, e de um modo positivo". E os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a maioria dos países membros da aliança que ficam no Leste Europeu o apoiam.

Oficiais seniores da Otan estão exigindo internamente que a disponibilidade e o estado de prontidão das tropas terrestres e das forças aéreas ocidentais sejam ampliadas. Atualmente, demoraria 180 dias para que as forças necessárias fossem enviadas ao front antes de qualquer operação.

Esse intervalo de tempo, argumentam os líderes militares, deve ser reduzido, proposta que também afetaria até 10 mil soldados alemães. Além disso, segundo os líderes militares, as unidades de tanques devem ser reforçadas e os depósitos de munições, abastecidos.

O ministro das Relações Exteriores da Polônia, Radoslaw Sikorski, até chegou a propor que duas brigadas da Otan (formadas por até 10 mil homens) ficassem estacionadas em seu país. Isso, no entanto, exigiria a construção de instalações para o armazenamento de equipamentos, garagens e quartéis que abrigariam essas brigadas e seus homens.

A chancelaria de Berlim está cautelosa em relação a tais propostas. "Nós não devemos dar aos russos nenhum motivo para que eles nos acusem de violar quaisquer tratados", dizem funcionários do órgão.

Em 1997, a Otan assumiu o compromisso de não estacionar um grande número de soldados nos antigos países membros do Pacto de Varsóvia. Fazê-lo agora seria uma provocação de uma nova dimensão.

Um aspecto militar
Por isso, Steinmeier, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, está se concentrando exclusivamente na diplomacia. Atualmente, o ministério que ele comanda está desenvolvendo um "Plano de Ação para a Ucrânia", que deverá elucidar o tipo de apoio que Berlim concederá ao novo governo ucraniano.

Todos os ministérios alemães envolvidos nessa operação de apoio estão participando da criação do plano de ação, segundo o Ministério das Relações Exteriores do país. Mas o Ministério da Defesa não é um deles.

Steinmeier também estimulou a viagem de vários secretários de estado à Ucrânia na semana passada – o total de secretários de estado que visitaram o país equivale ao total ministérios alemães envolvidos no apoio concedido por Berlim a Kiev. Mais uma vez, o Ministério da Defesa não esteve representado nessa empreitada.

No entanto, essa questão certamente tem um aspecto militar. A Ucrânia já enviou uma solicitação à sede da Otan para receber rádios, armas e munições dos estoques da aliança. Ao mesmo tempo, a ministra da Defesa da Alemanha, Ursula von der Leyen, pediu que os generais sêniores alemães analisassem o que a aliança poderia fazer para prestar apoio adicional aos países membros da Otan na Europa Oriental.

A Otan pediu que os membros da aliança fizessem contribuições adicionais além daquelas já acordadas para aumentar as missões de policiamento aéreo e os voos de vigilância AWACS (Airborne Warning and Control System).

As propostas deverão ser submetidas à sede da Otan em meados de abril. Von der Leyen provavelmente proporá a realização de manobras militares conjuntas envolvendo a Alemanha, a Polônia e os países Bálticos.

Uma manobra da Otan prevista para 2015 e que seria realizada no sul da Europa também poderá ser deslocada mais para o norte e o leste do continente. Mas a ministra alemã se recusou a enviar equipamentos pesados ou tropas por um período de tempo muito prolongado.

A Polônia, por sua vez, gostaria de ver ainda mais demonstrações de solidariedade por parte da Otan. Ou, falando mais claramente: a Polônia tem medo da Rússia, assim como os seus vizinhos bálticos.

E parte desse medo decorre da era soviética. Mas a recente demonstração de poder por parte da Rússia na fronteira oriental da Ucrânia – e a recusa evidente de Putin em retirar suas forças, como ele prometeu recentemente – também gerou preocupação em Varsóvia.

O Ocidente vem, há muito tempo, rindo baixinho do mau estado das forças armadas da Rússia. Mas, desde então, o poderio militar do país tem sido drasticamente modernizado, e analistas de exércitos ocidentais e dos serviços de inteligência estão preocupados com a capacidade que a Rússia exibiu em manobras recentes.

A Operação Sapad 2013 é um exemplo particularmente gritante disso. Sapad é a palavra russa para Ocidente, e esse exercício poderia certamente ser entendido como uma ameaça apontada na direção dos países membros da Otan.

Oficialmente, menos de 13 mil soldados participaram desse exercício, total inferior ao limite que exigiria observação por parte da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE). Mas parte do exercício ocorreu em Kaliningrado, o enclave russo localizado no Mar Báltico e que faz fronteira com a Polônia e a Lituânia.

Além disso, as forças especiais russas foram envolvidas nessa operação, assim como oficiais da FSB, a agência de inteligência interna da Rússia. No total, os líderes militares ocidentais estimam que cerca de 60 mil pessoas participaram da manobra – que até chegou a interferir em uma instalação de radares da Otan, localizada no Báltico.

Os militares russos também dispararam um míssil "Iskander" de curto alcance. Ele estava armado apenas com uma ogiva de testes, mas, aparentemente, exercícios para armar esse tipo de míssil com ogivas nucleares também foram realizados.

"Está claro o que os russos queriam nos mostrar com essa manobra", disse um líder militar ocidental que tem informações sobre o exercício. "Eles podem intensificar um conflito em sua fronteira ocidental e, em seguida, contê-lo novamente".

Hoje ninguém duvida que a Rússia seria capaz de invadir e ocupar o leste da Ucrânia. O governo alemão acredita que prevenir uma eventualidade dessas é tarefa da diplomacia. De qualquer maneira, a dissuasão militar ocidental de outrora está consideravelmente enfraquecida, pois se pensava que ela seria supérflua.

Ajustada para a paz
O número de aviões de guerra das forças armadas da Alemanha foi reduzido a menos da metade desde a queda do comunismo, e centenas de tanques de batalha também foram desativados ou vendidos.

Em vez disso, a Bundeswehr criou uma força muito elogiada que é capaz de ser rapidamente enviada para o exterior – e que atualmente encontra-se em atividade em três continentes. Agora, alguns estão vendo essa estratégia sob uma nova luz.

"A política de Defesa foi ajustada para missões de paz realizadas sob condições relativamente favoráveis, mas a crise atual mostra veementemente que essa estratégia pode ter sido muito unidirecional e ingênua", diz Joachim Krause, diretor do Instituto de Política de Segurança da Universidade de Kiel.

"O Ministério da Defesa (da Alemanha) tem que realizar uma revisão total em seus planos de aquisição". Rainer Arnold, coordenador das políticas de defesa dos Social Democratas (partido alemão de centro-esquerda), que compartilham o poder no grande governo de coalizão da chanceler Angela Merkel, vê a situação da mesma maneira.

"Nós precisamos refletir e tentar definir se a redução descontrolada da frota de tanques da Otan foi a coisa certa a se fazer", disse ele. "Nós deveríamos desenvolver um sistema conjunto de drones na Europa o mais rápido possível. A decisão sobre os drones 'EuroHawk' também deveria ser reconsiderada", argumenta ele.

"Todas as alternativas parecem ser muito mais caras do que se nós apenas realizássemos um novo esforço concentrado para aprovar o uso dos drones EuroHawk", diz ele.

O ex-ministro da Defesa da Alemanha foi duramente criticado no ano passado após ter decidido cancelar um contrato relacionado a esses drones de vigilância, após uma quantia superior a 500 milhões de euros já ter sido gasta na tecnologia.

Volker Kauder, chefe dos democratas-cristãos conservadores de Merkel no Parlamento, se opõe a essas ideias. "A situação atual com a crise da Crimeia não tem absolutamente nenhuma influência sobre os projetos de defesa da Bundeswehr", afirma Kauder. Até o momento, essa é uma opinião que tem sido compartilhada por von der Leyen, a ministra da Defesa da Alemanha.

Otimismo recente
No entanto, as empresas do setor de defesa já estão se preparando para a possibilidade de receberem novas encomendas. Elas pressentem a oportunidade de ressuscitar alguns projetos de defesa que tinham sido arquivados. Três planos de aquisição têm despertado um interesse especial por parte delas.

O Eurofighter, por exemplo, foi durante muito tempo considerado supérfluo pela nova Bundeswehr, que é, em grande parte, um exército de intervenção destinado a realizar missões no exterior. A força aérea alemã já possui cerca de 100 desses caças – no total, a aeronáutica do país pretende comprar 143 dessas aeronaves, ao custo de aproximadamente 17 bilhões de euros (ou US$ 23,3 bilhões).

No entanto, a entrega do último lote foi cancelada em 2013. Na época, a fabricante Airbus Defense enviou imediatamente uma cobrança no valor de 874,53 milhões de euros exigindo que o governo alemão pagasse pelo cancelamento da encomenda. Mas hoje a fabricante tem parecido menos inflexível em relação ao recebimento desse dinheiro.

Em vez disso, as autoridades alemãs acreditam que o Ministério da Defesa do país poderá canalizar esse dinheiro para outros projetos de desenvolvimento que poderão vir a ser firmados com a empresa. "Perder a capacidade de desenvolver aviões militares em nosso próprio país", dizem fontes da Airbus, "seria um revés estratégico sério para a Alemanha".

Outro projeto de defesa que os executivos da Airbus estão promovendo em conjunto com seu principal executivo, Tom Enders – que é paraquedista da reserva do exército alemão –, é o helicóptero de combate "Tiger".

Originalmente, o exército alemão encomendou 80 dessas aeronaves. Em seguida, a encomenda foi reduzida porque o Tiger foi tecnicamente projetado para enfrentar cenários obsoletos idealizados durante a época da Guerra Fria.

O helicóptero inclui, por exemplo, um dispositivo montado no teto, semelhante ao periscópio de um submarino, que permite que os pilotos mirem e disparem contra tanques inimigos que estejam se aproximando mesmo que a aeronave esteja camuflada.

Executivos da empresa de defesa MBDA, da Baviera, também estão otimistas. A empresa faz parte de um consórcio internacional que vem desenvolvendo nos últimos anos o sistema de defesa com mísseis MEADS. Apenas a Alemanha já gastou 1 bilhão de euros nesse projeto.

O sistema foi projetado para substituir os antigos mísseis antibalísticos Patriot da Bundeswehr, mas o ministério tem se mostrado hesitante em apresentar uma ordem de compra final.

"Se o Ministério da Defesa não fechar um contrato nos próximos meses, os nossos engenheiros pedirão demissão", disseram em "off" fontes da direção da MBDA. Muitos argumentam que o MEADS seria ideal para defender os países bálticos contra um possível ataque russo.

Apesar de seu otimismo recente, os executivos da indústria de defesa têm o cuidado de não falar muito abertamente na hora de promover seus projetos. Ainda assim, definitivamente há propostas sendo feitas.

"Em termos de política de segurança, a Alemanha se tornou um país de imitadores", disse uma fonte da indústria. "Nós nos esquecemos da linguagem da dissuasão". Palavras como essas quase soam como se viessem diretamente do período da época da Guerra Fria – ou, pelo menos, de uma das recentes reuniões do Conselho da Otan.

3 comentários:

  1. Texto interessante de onde o traduziu?

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  2. A Alemanha ficará quieta enquanto a Rússia não interferir nos antigos estados balticos alemães. a para ela, Ucrania é mais um problema doméstico russo, está longe demais para a Alemanha.

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