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quinta-feira, 2 de maio de 2013

O diálogo levará a Coreia do Norte a abrir mão de suas armas nucleares?


Eu desertei da Coreia do Norte em 2004. Eu decidi arriscar minha vida para deixar meu país natal –onde trabalhei como oficial de guerra psicológica para o governo– quando finalmente percebi que havia duas Coreias do Norte: uma real e a outra fictícia, criada pelo regime.

Apesar de meu trabalho me dar acesso à mídia estrangeira, livros com passagens contendo críticas ao nosso Querido Líder Kim Jong-il ou ao seu reverenciado pai, Kim Il-sung, tinham grandes trechos censurados. Certo dia, por profunda curiosidade, eu inventei uma desculpa para permanecer no trabalho e decifrar as palavras censuradas de um livro de história.

Eu tranquei a porta do escritório e coloquei as páginas contra uma janela. A luz de fora tornou as palavras sob a tinta perfeitamente visíveis. Eu li vorazmente. Eu novamente fiquei até tarde no trabalho repetidas vezes para saber a história real do meu país – ou pelo menos outra visão dela.

O mais chocante foi o que descobri sobre a Guerra da Coreia. Nos foi ensinado durante toda nossa vida como uma invasão pelo Sul provocou o conflito. Mas agora eu estava lendo que não apenas a Coreia do Sul, mas todo o restante do mundo acreditava que o Norte tinha iniciado o conflito. Quem estava certo?

Foi após minha aflitiva deserção – na qual eu subornei para chegar até a travessia de fronteira e escapei correndo sobre um rio congelado até a China– que eu reconheci a existência de uma terceira Coreia do Norte: uma teórica. Essa é a Coreia do Norte construída pelo mundo exterior, por uma análise de fragmentos do regime e de sua propaganda que ignora as realidades políticas e econômicas do país.

Todos nós no Departamento da Frente Unida – também conhecido como "a janela para dentro e fora da Coreia do Norte"– aprendemos três princípios da diplomacia de cor: 1. Não preste atenção na Coreia do Sul. 2. Explore as emoções do Japão. 3. Encha os Estados Unidos com mentiras, mas certifique-se de que tenham lógica.

Kim Jong-il destacava a importância desses três princípios como estrutura dentro da qual implantaríamos sua visão para as relações exteriores de Pyongyang. As relações com a Coreia do Sul, Japão e Estados Unidos sempre seguiam firmemente esses princípios.
A missão de nosso departamento era enganar nosso povo e o mundo, fazendo o que fosse necessário para manter nosso líder no poder. Nós nos referíamos abertamente às negociações com a Coreia do Sul como "plantio de ajuda", porque enquanto Seul buscava o diálogo por meio da chamada Política da Luz do Sol, nós a víamos como uma abertura não para discutir um progresso diplomático, mas para extrair o máximo de ajuda possível. Nós também tivemos sucesso em ganhar tempo para nosso programa nuclear por meio de uma maratona interminável de negociações entre seis partes.

Apesar dos modos enganadores de Pyongyang, muitas pessoas no mundo exterior continuam acreditando na Coreia do Norte teórica na qual o diálogo com o regime é visto como forma de promover mudanças. Mas eu sei devido aos meus anos no governo que o diálogo não fará Pyongyang mudar, nem mesmo com a atual líder do Norte, Kim Jong-un.

O diálogo nunca levará o regime a abrir mão de suas armas nucleares; o programa nuclear está firmemente ligado à sua sobrevivência. E negociações não levarão a uma mudança a longo prazo; o regime as vê apenas como uma ferramenta para extrair ajuda. Diplomacia de alto nível não é uma estratégia para fazer o regime promover reformas econômicas. A chave para a mudança se encontra fora da influência do regime – na crescente economia paralela.

Todos os norte-coreanos dependiam do sistema de racionamento do Estado para sua sobrevivência até seu colapso em meados dos anos 90. Seu fim ocorreu em parte devido ao investimento concentrado de fundos do regime em uma "economia de partido" que mantinha o culto aos Kims e derramava luxos para uma elite em vez de desenvolver uma economia normal, baseada na produção doméstica e no comércio. Pessoas desesperadas começaram trocar bens domésticos por arroz nas ruas – e nasceu a economia paralela. Com milhares de pessoas morrendo de fome, as autoridades não tinham opção a não ser fazer vista grossa para todos os mercados ilegais que começaram a surgir.

Nessa época, os locais de trabalho do país passaram a ser responsáveis pela alimentação de seus funcionários. A única forma de poderem fazer isso era criando "empresas de comércio", que vendiam matéria-prima para a China em troca de arroz. Essas empresas se tornaram a base da economia paralela, agindo como centros de importação-exportação que, com o tempo, passaram a importar bens de consumo da China como refrigeradores e rádios.

Igualmente, as autoridades do partido começaram a participar dos negócios, lucrando por meio da coleta de propina e de atividades proibidas de financiamento. Atualmente o partido está tão envolvido na economia de mercado que as "empresas de comércio" estão repletas de filhos de autoridades do partido e operam abertamente em prol do partido e dos militares. Resumindo, toda a Coreia do Norte passou a depender de uma economia de mercado e não há nenhum lugar no país não tocado por ela.

O efeito social da ascensão do mercado tem sido extraordinário. O cordão umbilical entre o indivíduo e o Estado foi cortado. Aos olhos das pessoas, a lealdade ao Estado foi substituída pelo valor do dinheiro. E o dólar americano é a moeda preferida.

Usando seus dólares americanos (muitos deles falsos) para compra de produtos chineses, os norte-coreanos passaram a reconhecer a existência de líderes maiores do que os Kims. Quem são esses homens presentes nas cédulas americanas? Os norte-coreanos agora veem que a lealdade ao líder supremo não trouxe benefícios tangíveis; mas as cédulas exibindo os rostos de homens americanos são trocadas por muitas coisas: arroz, carne, até mesmo uma promoção no trabalho.

Hoje, quando os norte-coreanos são ordenados por seus empregadores estatais a participarem de atividades políticas, eles sabem que o tempo deles está sendo desperdiçado. Poucos norte-coreanos comparecem aos seus empregos públicos. Essa crescente independência econômica e psicológica entre as pessoas comuns está se tornando o maior espinho nas costas do regime.

Também é a chave para a mudança. Em vez de nos concentrarmos no regime e em seus agentes como possíveis instigadores de reforma, nós devemos reconhecer a força do mercado florescente para transformar de modo lento, mas definitivo, a Coreia do Norte de baixo para cima. Esse empoderamento do povo norte-coreano é crucial não apenas para uma transformação positiva da nação, mas também para assegurar uma transição estável para uma nova era após uma eventual queda do regime.

O crescente comércio com a China deixou a fronteira norte-coreana porosa de muitas formas, facilitando o fluxo de informação para dentro e para fora do país. Muitos norte-coreanos agora podem assistir programas de televisão sul-coreanos que são contrabandeados em DVDs ou pen drives.

Uma forma de acelerar a mudança seria manter as transmissões para o país, para que os norte-coreanos possam acessar a programação de rádio externa mais facilmente em seus aparelhos ilegais. Outra é apoiar o trabalho dos exilados norte-coreanos, que são um canal de bens e ideias liberais pela fronteira.

As negociações com Pyongyang só podem oferecer soluções temporárias para crises fabricadas. E posso dizer com base na minha experiência de que elas encorajam apenas mais enganação por parte da Coreia do Norte. Olhar para a Coreia do Norte de baixo, explorando as realidades de mercado em solo, é a única forma de promover a reforma do regime – ou sua queda.

*Jang Jin-sung, uma ex-autoridade norte-coreana e poeta premiado, é editor-chefe do New Focus International, um site sobre assuntos norte-coreanos.

2 comentários:

  1. Eu duvido. A tática do regime norte coreano é muito clara e não é de hoje, a forma deles de se defenderem contra possíveis agressões externas desde de invasão terrestre, zona de exclusão aérea, apoio a guerrilha interna ou qualquer outra forma de ação contra a Coreia se baseia em dar uma doido ameaçando por coisas banais iniciar guerra nuclear como se viu recentemente. O regime norte coreano desde dos tempos de Kim Jong Il tem nada de doido, a questão que eles estão nem ai para economia, então para eles a única coisa que importa é a sobrevivência do poder, e eles possuindo armas nucleares ninguém vai ser doido de meter a cara, se os caras ameaçam guerra nuclear por simples manobra militar, imagina se alguém armar uma guerrilha anti-governo como estão fazendo na Síria, ou quiserem ir além como na Líbia, Iraque, Afeganistão,. Iugoslávia, Panamá, Granada e tantos mais em?



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  2. Ridículo, trocar autoritarismo pelos "ideias liberais" é essa reforma que ele quer para o seu pais, quase como querer "comprar a liberdade". É difícil acreditar tanto nos ideias Juche como no liberalismo imposto pelos americanos, é o mesmo que trocar o sujo pelo mal lavado

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