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sexta-feira, 28 de junho de 2013

Táticas ambíguas do Talibã geram dúvidas sobre diálogo de paz com EUA

Na semana passada, quando o Talibã abriu seu escritório político no Qatar e se colocou diante do brilho halógeno das câmeras de TV, foi a primeira vez em mais de uma década que o mundo via os membros do círculo íntimo dos insurgentes – e eles pareciam diferentes. Corteses e educados, eles concederam entrevistas em inglês, árabe, francês e alemão com fluência. Também distribuíram e receberam números de telefone e, o mais incrível, falaram sobre paz.

No Afeganistão, no entanto, eles têm se comportado como o mesmo velho Talibã de sempre: seus combatentes têm realizado ataques suicidas que vem matando um número cada vez maior de civis e, na terça-feira passada, os militantes promoveram um ataque fatal bem no coração do distrito onde estão situados os prédios do governo, em Cabul, local que é fortemente protegido.

Para as autoridades que estão assistindo as conversações, essas contradições expõem duas táticas diferentes que estão sendo utilizadas pela alta liderança do Talibã: por um lado, o grupo continua orquestrando combates e ataques e, por outro, cria um novo ponto de apoio diplomático internacional em Doha, no Qatar. Isso complica os esforços para determinar os verdadeiros objetivos dos insurgentes.

No escritório do Talibã, ficou claro muito rapidamente que os membros do grupo que estavam sendo entrevistados haviam sido cuidadosamente selecionados devido a suas credenciais diplomáticas. Embora muitos sejam autoridades que atuaram no antigo governo do Talibã e já tenham sido enviados muitas vezes ao exterior, nenhum deles é conhecido como combatente. E todos eles são considerados leais ao recluso líder do Talibã, o mulá Muhammad Omar, que atualmente vive no exílio.

Além disso, apesar de os delegados afirmarem que estavam ali para falar sobre paz com o governo afegão e as autoridades norte-americanas, em uma análise mais aprofundada o que eles fizeram – que consistiu, basicamente, na criação de uma embaixada virtual aberta para o mundo – foi, na opinião de muitas pessoas, emitir a mensagem oposta a esse suposto pacifismo, levantando, antes de tudo, sérias dúvidas sobre os motivos reais que levaram os membros do movimento insurgente a irem até o Qatar.

Trato?
"Desde o primeiro minuto, o Talibã não está seguindo as regras", disse uma autoridade ocidental que tem monitorado as ações do Talibã há vários anos. "Eles passaram por cima de diretrizes muito bem acordadas".

As identidades e origens dos principais membros da delegação – e, portanto, alguns dos objetivos que levaram a liderança Talibã a selecioná-los – agora podem ser detalhadas com base em entrevistas realizadas com quatro autoridades diferentes e por meio de apresentações públicas realizadas pelo grupo no Qatar. As fontes dessas informações incluem um membro do Quetta Shura, conselho da liderança do Talibã no Paquistão, um comandante militar do Talibã do leste do Afeganistão, uma ex-autoridade do Talibã e um funcionário ocidental que atua em Cabul e está familiarizado com as negociações em Doha e que falou sobre a abordagem geral da delegação. Todos mencionaram os mesmos nove nomes-chave, embora as listas de cada um difiram ligeiramente de outras maneiras.

"Cada membro da delegação foi escolhido pelo conselho de liderança depois de uma longa série de discussões prolongadas e conversações que se mostraram, por vezes, tensas", disse o comandante militar do Talibã oriental. "Havia alguns critérios que eles precisavam satisfazer. O primeiro era a lealdade ao mulá Muhammad Omar. Em segundo lugar, eles tinham que ter experiência em diplomacia. Em terceiro lugar, eles precisavam falar pelo menos uma língua estrangeira, como inglês ou árabe".

Acompanham essa delegação seis ex-diplomatas, cinco ex-ministros ou vice-ministros e quatro pregadores religiosos – um deles tão admirado por sua habilidade oratória que o ministro da Defesa do Qatar supostamente comparece à congregação quando ele faz aparições em sua mesquita.

Todos eles são vistos como aliados próximos do mulá Omar. Um deles, Tayeb Agha, que aparentemente é o líder da delegação, foi secretário e chefe de gabinete de Omar. Outro, Hafiz Aziz Rahman Ahadi, é filho do professor do mulá Omar. Esse professor leciona na madraça de Omar em Quetta, no Paquistão.

"Todos os representantes que foram selecionados e enviados ao Qatar para participar das negociações de paz pertencem à ala política (do Talibã)", disse o membro do Quetta Shura. "Nenhum deles tem backgroud militar. Nós não precisamos enviar comandantes para cá: não estamos lutando no Qatar. Estamos lutando no Afeganistão".

Embora existam cerca de duas dezenas de autoridades do Talibã aqui no Qatar – juntamente com suas famílias, somando cerca de 200 pessoas no total –, a maioria faz parte de equipes administrativas e de apoio.

Os emissários são, de acordo com os padrões da liderança do Talibã, relativamente jovens, e se encontram principalmente na faixa dos 40 anos. Tayeb Agha é aparentemente o mais jovem deles, com 37 ou 38 anos.

Embora digam que Agha é fluente em inglês, ele não estava falando pelo grupo na semana passada. Esse papel foi preenchido por Sohail Shaheen, ex-segundo secretário da embaixada do Talibã em Islamabad, no Paquistão. Ele deu várias entrevistas à rede de TV Al Jazeera, a agências de notícias japonesas e a outros meios de comunicação árabes depois que o escritório do Talibã foi aberto no Qatar. Mas quando o governo afegão ameaçou colocar um ponto final em seu falatório, ele ficou em silêncio.

"Nós realmente queremos falar", disse ele durante uma breve conversa por telefone, falando um inglês fluente e com um leve sotaque paquistanês, "mas até que decidamos qual será a nossa resposta, eu não posso dizer nada".

Em outra entrevista, concedida à Al Jazeera, ele deixou claro, no entanto, que qualquer negociação em Doha seria realizada de forma concomitante à luta travada pelo Talibã no Afeganistão. Ele disse que o Talibã "segue simultaneamente opções políticas e militares. Pois não há nenhum cessar-fogo agora. Eles estão nos atacando e nós também os estamos atacando".

Outro porta-voz do grupo, Mohammad Naim Wardak, tem cerca de 40 anos, também é fluente em inglês e ainda fala árabe e alemão. Quando o Talibã estava no poder, ele foi enviado a embaixadas e consulados no Paquistão e nos Emirados Árabes Unidos.

Procedimentos
Dos nove delegados do Talibã que estão sabidamente no Qatar, pelo menos três estão na lista negra da Organização das Nações Unidas (ONU), que autoriza a apreensão de bens e impede a realização de viagens internacionais. No entanto, parece que preparativos especiais foram feitos para que eles pudessem ir a Doha. Os homens que estão na lista negra são Shahbuddin Delawar, que, segundo as Nações Unidas tem entre 56 e 60 anos, é um diplomata veterano e vice-presidente do Supremo Tribunal do governo do Talibã, Sher Mohammad Abbas Stanekzai, que teria cerca de 50 anos e é ex-ministro da Saúde Pública, e Qari Din Mohammad Hanif, que tem aproximadamente 58 anos, é um tadjique da região do Badakhchão (localizada entre o Afeganistão e o Tadjiquistão) e o único membro não-pashtun da delegação. Shaheen, o ex-segundo secretário da embaixada do Talibã em Islamabad, também fazia parte dessa lista, mas teve seu nome retirado dela antes de assumir sua função em Doha, disse uma autoridade ocidental.

Os outros delegados confirmados incluem Mualavi Nik Mohammad, idade desconhecida, do distrito de Panjwai, em Kandahar, um ex-ministro da Agricultura e do Comércio, e Khalifa Sayid Rasul Nangarhari, um ex-diplomata de baixa patente sobre quem há poucas informações disponíveis.

O Qatar e outros países estão fornecendo ampla ajuda monetária para apoiar a abertura e a manutenção do novo escritório do Talibã em Doha, é já investiram um total de US$ 100 milhões no empreendimento, de acordo com Mualavi Shahzada Shahid, porta-voz do Alto Conselho de Paz do governo afegão. Não foi possível obter confirmação sobre o valor investido de nenhuma fonte independente, apesar de ser sabido que Estados Unidos, Japão e outros aliados já investiram US$ 250 milhões nos esforços de paz e de reconciliação com o Afeganistão.

Quando a tentativa anterior de abrir um escritório do Talibã no Qatar fracassou, em março de 2012, muitos analistas viram esse insucesso como resultado da divisão existente entre as autoridades do Talibã que atuam na liderança política e seus chefes militares. Mas algumas autoridades ocidentais também observaram que, quando o mulá Omar e seus assessores mais próximos tomam uma decisão, ela é cumprida.

"Nós compreendemos que existem divisões entre os talibãs – algumas pessoas querem continuar com a campanha militar, outras preferem o meio termo e outras ainda concluíram que só pode haver um caminho político daqui para frente, e que esse caminho deve ser adotado já", disse uma autoridade ocidental que está em Cabul e está familiarizada com as negociações. "Eu não sei em que ponto esse equilíbrio se encontra atualmente".

Seja qual for o estado de harmonia dentro do Talibã, ainda existem contradições óbvias entre suas declarações e suas ações.

O mulá Omar, por exemplo, promulgou um código de conduta que, entre outras coisas, alerta os combatentes para não colocarem civis em perigo. No entanto, as armas preferidas do grupo – homens-bomba e artefatos explosivos improvisados – são armamentos que matam indiscriminadamente devido a sua própria natureza. De acordo com dados das Nações Unidas, mais de 75% de todas as mortes de civis registradas na região são causadas por insurgentes, e essa proporção tem aumentado constantemente nos últimos anos.

Ainda assim, Sayid Akbar Agha, uma ex-autoridade do Talibã que continua próxima do grupo, insistiu que as tensões anteriores existentes entre as alas política e militar foram resolvidas – pelo menos no que diz respeito à criação da missão em Doha.

"Algumas pessoas pensavam que as negociações de paz talvez constituíssem uma conspiração arquitetada pelo governo afegão", disse ele. "Mas, desta vez, há um acordo amplo entre as comissões políticas e militares do Talibã sobre a criação desse escritório político".

A verdadeira intenção do Talibã ao criar esse escritório no Qatar, no entanto, ainda é contestada por autoridades ocidentais e afegãs.

Uma autoridade ocidental que há muito tempo acompanha o Talibã acredita que é difícil dar crédito à ideia de que os insurgentes estão verdadeiramente interessados em alcançar a paz.

"O próximo passo será, então, dizer que existe o 'bom Talibã' no Qatar e existe o 'mau Talibã', que são os caras que estão lutando contra nós", disse essa autoridade. "Se eles são os bons talibãs e não falam pelos outros, os maus talibãs, então eles não são realmente do Talibã. Ou esses caras que estão no Qatar não têm nada a oferecer e são irrelevantes, ou eles estão mentindo sobre seus objetivos".

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