Muçulmanos oram na cidade francesa de Toulouse |
Diante da histeria e da demagogia, humor. Há alguns dias as associações contra a islamofobia distribuíram 2 mil unidades de "pain au chocolat" (quase tão apreciado na França quanto o croissant) nas portas da Grande Mesquita de Paris e na estação Saint-Lazare. Os doces tinham a forma de croissant: uma criação chamada Copé. A comunidade islâmica respondia assim ao ataque de Jean-François Copé, líder do partido conservador União por um Movimento Popular (UMP), que afirmou que durante o Ramadã as crianças muçulmanas roubam o pão ao chocolate das crianças francesas nos recreios.
Depois de denunciar o político por difamação, o Conselho do Culto Muçulmano convocou os fiéis para a distribuição de pães na saída da oração de Aid el Kebir, a grande festa islâmica que comemora o sacrifício de Abraão. "Encanta-me esta forma de responder a esse Copé que faz campanha nas costas dos muçulmanos e só banaliza um certo racismo", disse Kamel Cheklat, um universitário que participou da iniciativa. "A ideia foi um grande êxito contra o racismo", acrescentou Abderrahmane Dahmane, um ex-assessor de Nicolas Sarkozy que se demitiu do Eliseu em março de 2011 para criticar a tendência islamofóbica que, na sua opinião, a presidência adotava.
Aquela virada xenófoba se confirmou na campanha eleitoral, quando Sarkozy tomou emprestadas ideias próximas ao fundamentalismo católico do setor mais duro da UMP, e inclusive da Frente Nacional, para radicalizar seu discurso e tentar encurtar a distância com François Hollande.
Copé, que segundo as pesquisas está muito longe de seu adversário e ex-primeiro-ministro François Fillon na campanha das primárias da UMP, lançou a debate a expressão "racismo antibranco" para tentar conquistar os franceses mais assustados pela presença de muçulmanos (e em menor medida de ciganos). E a revista conservadora "Le Point" contribuiu para esquentar um pouco mais as coisas com uma capa que afirma: "Esse Islã descarado".
Os muçulmanos franceses, longe de sair à rua e queimar fotos de Copé ou revistas, responderam com novas doses de imaginação e humor, e acabam de apresentar uma campanha publicitária com cartazes, slogans, mensagens de rádio, uma página na web e um lema chamativo: "nós (também) somos a nação".
A imagem mais chocante é uma versão do Juramento do Jeu de Paume em 1789, célebre quadro de Jacques-Louis David. Essa nação multicolorida, que mostra véus e túnicas, faz ondular várias bandeiras francesas. Outro cartaz também é provocador, mostrando um retrato de "família francesa de toda a vida": pai de origem magrebina, mãe de ar normando e duas meninas loiras, todos convertidos ao islamismo.
A mensagem que se tenta transmitir, segundo afirmam os criadores da campanha, o Coletivo contra a Islamofobia na França, é que a islamofobia nem esconde nem resolve os problemas da França, como parece acreditar uma direita cada vez mais extremista e partidária do choque de civilizações. Uma recente pesquisa do jornal "Le Figaro" revela que Hollande precisará fazer muita pedagogia: 68% dos franceses acreditam que a principal causa da falta de integração dos muçulmanos é sua "recusa a integrar-se", e 43% consideram que a presença de muçulmanos é uma "ameaça para a identidade do país".
Depois dos atentados do jovem jihadista francês Mohamed Merah, que deixaram sete mortos - quatro deles membros de uma família judia -, a direita continuou manifestando seus preconceitos contra a comunidade muçulmana. Os gritos serviram para que a maioria dos 6 milhões de franceses muçulmanos votassem em Hollande nas presidenciais, e de passagem para desviar a atenção da atuação dos serviços secretos de Sarkozy, que, apesar de terem fichado Merah e conhecer suas viagens ao Paquistão e Afeganistão, não souberam evitar os atentados.
Tentando pôr um pouco de senso nesta situação explosiva e ao mesmo tempo surrealista, Hollande participou na quinta-feira de uma homenagem às vítimas de Merah, realizada no colégio judeu Ozar Hatorah de Toulouse, junto do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. Hollande proclamou que a luta contra o antissemitismo é "uma causa nacional" e acrescentou que a República defenderá os direitos das minorias porque essa é a essência do sistema político francês.
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