François Hollande recebe no Palácio do Eliseu (Palais de l'Élysée) Saad Hariri, líder da Corrente do Futuro, o principal partido de oposição libanês |
Helicópteros zunindo acima do cortejo da delegação francesa, soldados posicionados sobre telhados, tanques destacados para cruzamentos, vias bloqueadas para circulação... Se François Hollande tinha alguma dúvida sobre o nível de tensão presente no Líbano desde o atentado do dia 19 de outubro que custou a vida do chefe da inteligência, Wissam al-Hassan, as medidas de segurança empregadas na ocasião de sua visita a Beirute, no domingo (4), definitivamente a dissiparam.
Para essa primeira viagem em terras árabes desde que foi eleito, Hollande tinha uma dupla mensagem de urgência: um apelo por diálogo entre libaneses e a promessa para que se faça de tudo para impedir que a guerra na Síria transborde e agrave as fissuras na terra do Cedro, da qual a França se sente protetora histórica. “A França não poupará esforços para garantir ao Líbano sua independência, sua segurança, sua unidade”, ressaltou o chefe do Estado francês, ao lado de seu colega libanês Michel Suleiman.
Jacques Chirac foi obcecado pelo Líbano até os últimos dias de seu mandato presidencial: ele queria se certificar que seria criado um tribunal especial destinado a julgar os assassinos de seu amigo, o ex-premiê libanês Rafik Hariri, morto em 2005 em um atentado atribuído por sua comitiva ao governo sírio. Nicolas Sarkozy manteve essa linha, ao mesmo tempo em que se lançava na arriscada ambição de procurar desassociar o regime sírio de sua aliança com o Irã, um esforço que foi interrompido bruscamente, mas que deu lugar a contatos obscuros entre serviços secretos franceses e redes do governo sírio, como observou Hollande.
François Hollande está dando continuidade à “responsabilidade” incumbente à França no Oriente, num momento em que os riscos se acumulam na região. Síria, Irã, Líbano, questão palestina... O presidente francês quer convencer que a França está tomando a “iniciativa” nesses temas, ele que foi criticado por sua passividade. O relativo apagamento dos Estados Unidos, monopolizados por sua sucessão presidencial, parece propício a elevar o perfil francês no Oriente Médio.
A França está “disponível” para facilitar o diálogo interlibanês, afirmou Hollande, que se diz disposto a receber em breve em Paris o premiê Najib Mikati. O gesto não agrada a todos no Líbano porque a oposição libanesa – o movimento do 14 de Março liderado por Saad Hariri, filho de Rafik Hariri – exige a renúncia do dirigente. O assassinato de Wissam al-Hassan não somente reavivou o temor de um novo ciclo de atentados no Líbano, como provocou mais uma crise política. Os adversários do primeiro-ministro o acusam de fazer o jogo do presidente sírio Bashar al-Assad, e lembram a velha amizade que liga suas famílias.
Os dirigentes franceses gostariam que surgisse no Líbano um governo de “tecnocratas” aberto a elementos da oposição, uma vez que o Executivo é dominado hoje pelo Hezbollah e seus aliados. O movimento xiita preocupa ainda mais por ter reconhecido que enviou combatentes à Síria, além de ter enviado um avião não-tripulado para sobrevoar Israel. Até o dia 30 de outubro, seis de seus membros foram mortos em condições não esclarecidas em Rankous, no subúrbio de Damasco.
Mas os franceses acreditam que o Hezbollah se encontra “dividido” e obrigado a antecipar o pós-Assad. Eleições legislativas no Líbano estão previstas para a primavera de 2013, e as tentativas francesas de manter Mikati, mesmo com um governo remanejado, dificilmente serão aceitas pela ala de Saad Hariri.
Consequentemente, a influência da Arábia Saudita sobre a ala do 14 de Março tem sido buscada. Como previsto, após sua breve passagem por Beirute, Hollande foi até Djedda, às margens do Mar Vermelho, para conversar com o rei Abdullah em um de seus palácios. Saad Hariri foi convidado para o jantar oficial.
Sentado em um banquete, num salão decorado com um aquário gigante e estátuas de cavalos dourados colocadas na borda de um laguinho ornado de mosaicos, Hollande pôde se deleitar com uma “convergência de opiniões” com seu anfitrião. Junto com o rei Abdullah, o presidente francês pretende criar uma relação “política” mais fácil do que aconteceu com Nicolas Sarkozy, muito voltado para o Qatar e um dia descrito pelo soberano saudita como um “cavalo fogoso”. O rei Abdullah, curvado sobre sua bengala, de barba e bigode tingidos de preto ébano, conversou demoradamente com Hollande sobre a situação na Síria. A Arábia Saudita defende que se enviem armas à oposição, ao passo que a França milita por uma política de reconhecimento de um “governo de transição”.
Não se sabe se o presidente francês falou diante do rei esta surpreendente frase pronunciada alguns dias antes, em Paris, pelo ministro russo das Relações Exteriores, Sergey Lavrov: “Assad não sairá nunca, ele acabará morto no local.” De qualquer maneira, em Djedda, Hollande mostrou sinais virulentos a respeito do destino do Líbano: “juntamente com o rei Abdullah, estamos alertando todos aqueles que querem desestabilizar este país”.
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