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segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Der Spiegel: China reprime Zhao Zhao, o protegido do artista dissidente Ai Weiwei

Zhao Zhao

A vida dos artistas modernos na China não é fácil. Prisão, multas pesadas e proibição de viagens são apenas algumas das táticas usadas pela polícia estatal para silenciar aqueles que ousam criticar o regime. Mas Zhao Zhao, um artista de Pequim, que já foi assistente do artista Ai Weiwei, recusa-se a ceder diante dessa pressão.

Embora uma entrevista com a mídia ocidental seja algo meio arriscado, Zhao Zhao não hesita nem um segundo sequer em concordar em falar com a reportagem. São 40 minutos de viagem do seu estúdio, em um subúrbio de Pequim, até a galeria do centro da cidade que está expondo o seu trabalho, e ele chega pontualmente.

Passando pela porta moderna de madeira que dá para um pátio idílico em frente à galeria, ele aponta em silêncio para a entrada, e segue na frente com passos rápidos. Zhao não dá a impressão de ser medroso, mas, por ser jovem, ele está com pressa e parece saber bem o que está fazendo. É possível que seja essa autoconfiança que irrite tanto a polícia estatal chinesa.

Zhao, 30, é um dos jovens artistas mais promissores da China. As suas pinturas e esculturas e os seus vídeos dizem respeito às realidades do seu país, além de documentarem a vida dele e dos seus amigos.

Um desses amigos é Ai Weiwei, o artista de fama mundial que no ano passado ficou preso durante dois meses e meio. Zhao trabalhou como assistente dele durante sete anos. Ai, 54, pertence a uma geração de artistas diferente da de Zhao, mas, mesmo assim, os dois têm muita coisa em comum. Ambos cresceram longe de Pequim, já que gerações anteriores das suas famílias foram exiladas nos desertos do noroeste da China. E ambos possuem talento e coragem.

Há muitas indicações de que um dia Zhao será tão famoso quanto o seu mentor. Mas o governo chinês não quer o surgimento de um novo Ai, mais um artista rebelde admirado em todo o mundo. O governo preferiria que o jovem artista Zhao simplesmente desaparecesse e caísse no esquecimento. Zhao não tem medo daqueles que estão no poder, mas aqueles que estão no poder temem Zhao.

Não era arte
Zhao deveria ter feito uma grande exposição no ano passado em Nova York, na galeria de Christophe Mao, um marchand que atua em Pequim e em Nova York. Para Zhao, a mostra teria sido um passo importante para projetar o seu nome internacionalmente. Ele embalou uma grande quantidade dos seus trabalhos para que estes fossem despachados de navio. Porém, a carga jamais deixou o porto de Tianjin, no norte do país. A poderosa polícia alfandegária da China confiscou os trabalhos.

Um dos trabalhos confiscados foi uma escultura feita por Zhao que consiste de uma estátua de concreto fragmentada, uma figura de um enorme policial. O número esculpido no uniforme do policial é a data na qual Ai Weiwei foi preso em 2011. Zhao fez a escultura durante o período em que Ai esteve na prisão, e a construiu desde o início como uma ruína.

Zhao exibiu o seu trabalho publicamente pela primeira vez em outubro de 2011, na galeria de Mao, em Pequim. Na época, as autoridades ainda não pareciam interessadas nele. Foi só em uma exposição posterior que a polícia surgiu na galeria de Mao, poucos dias antes da abertura, e ordenou que a escultura de Zhao fosse removida do grupo de peças à mostra. As autoridades alegaram que aquilo não era arte.

Trabalhando com medo
De pé no pátio da sua galeria, Christophe Mao arranca algumas folhas de uma arvorezinha e dá um sorriso amargo. Mao nasceu na China, mas ele tem cidadania estadunidense. Ele abriu uma galeria de arte chinesa em Nova York em 2000. Mao foi um pioneiro nessa área, e tem tido sucesso. A sua filial em Pequim foi aberta sete anos depois. Mao dá a impressão de ser norte-americano sob diversos aspectos, como por exemplo a roupa esportiva que ele está usando neste dia. Além disso, há o seu jeito autoconfiante meio barulhento e caracterizado por risadas, um certo ar de indiferença e um talento empresarial inquestionável. Entretanto, percebe-se rapidamente que aqui, na China, o país natal dele, Mao não está livre do medo.

Isso é compreensível. Recentemente têm circulado várias histórias sobre a rejeição de pedidos de visto. Mao só viaja a Pequim seis vezes por ano, mas essas viagens são importantes, e ele não deseja correr o risco de perder o seu negócio aqui.

Mao tem se beneficiado da enorme demanda internacional pela arte chinesa nos últimos anos. Em Nova York, ele fica no meio do distrito de artes de Manhattan, e ele ampliou consideravelmente o seu espaço para exposições há três anos. A sua galeria em Pequim é um amplo complexo projetado por Ai Weiwei, e ele é amigo de colecionadores conhecidos como Uli Sigg, ex-embaixador da Suíça na China.

Mao vende trabalhos feitos por artistas que representam a China moderna, que é sem dúvida um país artisticamente exigente. Entre esses artistas há mestres da arte de multimídia. Ele também trabalha com diversos artistas que são estimados pelo Estado. O próprio Mao procura manter um bom relacionamento com o governo chinês. Em 2005, a sua galeria patrocinou o primeiro pavilhão da China na Bienal de Veneza.

Seguindo em frente
Zhao é o artista mais polêmico representado por Mao. O artista é bom para o prestígio de Mao no Ocidente, mas ele poderia também vir a gerar dificuldades para o galerista na China, devido ao atual clima político no país. Mao parece estar nitidamente confuso. O otimismo da época imediatamente anterior à virada do milênio deu lugar ao medo. Ninguém parece saber em que direção o mercado, ou o país como um todo, irá se movimentar.

Zhao diz que, depois que a sua carga de obras de arte foi confiscada, ele foi informado de que teria que pagar uma multa de 300 mil yuans, o equivalente a 38 mil euros (US$ 48 mil). A medida não foi uma punição por crime algum, já que as autoridades simplesmente se recusaram a exportar os trabalhos do artista. É possível que Zhao acabe sendo também acusado de cometer evasão fiscal. As falsas acusações de evasão fiscal são umas das táticas favoritas utilizadas pelas autoridades chinesas, e Ai Weiwei foi acusado de ter cometido esse crime.

Zhao afirma que mais tarde foi informado de que, mesmo após pagar a multa, ele não poderia recuperar as sua obras. Mas ele teria permissão para vê-las uma última vez antes que elas fossem destruídas.

Se Zhao conseguisse fazer aquilo que desejava, ele teria aceitado a oferta e tentado documentar esse encontro com o seu trabalho, com a sua vida artística até o momento. O único problema é que ele não possui os 300 mil yuans para pagar a multa.

Zhao, com o seu cabelo curto e a sua face sincera, diz que está esperando um telefonema das autoridades. Essa não seria a primeira vez. Mas, será que ele tem medo? Não, diz ele, medo não. “Eles não poderiam fazer nada de pior comigo”, explica ele, como se o desejo de que ele desaparecesse não fosse suficientemente ruim. Zhao tem todos os motivos para estar amargurado e nervoso, assim como o galerista Mao, mas ele preferiu seguir em frente com a sua vida.

Situação crítica
Em julho, ele fez uma exposição em uma galeria de Pequim que pertence ao marchand alemão Alexander Ochs. Segundo Ochs, Zhao é tão irredutível quanto Ai Weiwei, “e isso faz dele uma das pessoas que mais correm risco no país”.

Zhao exibiu seis pequenos quadros – pinturas sombrias, melancólicas, quase abstratas, feitas em tonalidades de marrom e preto. Antes da exposição, ele removeu a pintura de todas as paredes internas da sala de exibição e a escureceu completamente. Os visitantes que desejam ver as pinturas de Zhao têm que usar uma lanterna, um isqueiro ou um smartphone para iluminá-las.

Ninguém sabe por que Zhao ainda consegue exibir os seus novos trabalhos de maneira tão oficial, nem mesmo o galerista Ochs. Talvez isso tenha algo a ver com o fato de, ao mesmo tempo, Ochs estar organizando uma exposição sobre o construtivismo europeu para o Museu Nacional de Arte da China, uma exibição politicamente inofensiva que agradou ao governo chinês.

Mas Ochs também passou a questionar se será capaz de reduzir o seu envolvimento com a China. Ele diz ter sido um dos primeiros europeus a investir no cenário de arte contemporânea do país. “E agora, quase 30 anos depois, eu sou obrigado a reconhecer que nós não fomos capazes de criar sequer os menores espaços possíveis de liberdade para os nossos artistas”.

Ele diz que essa situação tornou-se mais crítica nos últimos meses. Ai Weiwei, por exemplo, recebeu a promessa de que o seu passaporte lhe seria devolvido no final de junho, depois de o documento ter sido apreendido pelas autoridades no ano passado. Mas essa promessa não foi cumprida, e Ai está impossibilitado de viajar ao exterior. Esse episódio foi visto no universo artístico de Pequim como um aviso a todos os artistas que criticam o regime. Além disso, existe a multa que está sendo cobrada de Zhao pela destruição dos seus trabalhos. “Esses são métodos que nós conhecemos do fascismo, e eu não concordo com eles”, afirma Ochs.

Intimidação constante
Apesar da queda das vendas, o mercado de obras de arte na China continua sendo enorme. Embora esse mercado pareça estar novamente florescendo, o governo toma todas as precauções para que sob nenhuma circunstância o universo artístico produza vozes críticas.

A legislação tributária da China há muito tempo é opaca, uma zona deliberadamente cinzenta, e atualmente isso está sendo usado como um instrumento para punições arbitrárias e intimidações constantes. Segundo boatos correntes, os membros da polícia estatal chinesa chegam a comparecer às recepções de abertura de exposições de artistas chineses que exibem as suas obras em galerias de Nova York – ou pelo menos, diz Ochs, são esses os rumores que são ouvidos em Pequim.

O setor de comércio de obras de arte sempre foi arriscado. Um transportador alemão de peças de arte está atualmente proibido de deixar a China, e foi informado de que deve se manter disponível para um chamado “questionamento”. Antes disso, ele ficou preso durante quatro meses, também por supostas violações da legislação tributária. Ninguém sabe qual foi o motivo real da prisão.

Zhao Zhao jamais se deixou intimidar. Em 2007, ele fez um vídeo que o mostra caminhando por volta da meia-noite com uma câmera nas mãos. As pessoas o confundem com um agente da polícia secreta e atiram pedras nele. Ele entra em uma delegacia de polícia e, não encontrando ninguém lá, coloca um quepe de policial sobre a cabeça, dizendo, à sua maneira, ao governo chinês como este cria pressões. Ele filmou tudo isso e deu ao trabalho o título “Happening”, embora tudo seja simplesmente a realidade existente no país.

Evitando a cautela
Um dos trabalhos recentes de Zhao é uma pintura fotorrealista inspirada em uma fotografia que Zhao fez para Ai Weiwei dois anos atrás, que mostra o artista com quatro mulheres, todas nuas. O quadro é inofensivo, mas o governo o confiscou por considerá-lo uma provocação, e atualmente Ai está sendo investigado como suspeito de fazer trabalhos pornográficos.

Zhao transformou essa imagem em uma pintura em tela grande. Quando Ochs ofereceu o trabalho para venda em uma feira de arte em Cingapura, nem um só jornal chinês publicou notícias sobre o quadro e a sua história. “No entanto, nós fomos bastante questionados anteriormente”, diz Ochs. “Isso não pode ser coincidência”. Atualmente o quadro pertence a um colecionador europeu.

No momento, Zhao está se preparando para uma exposição em Hong Kong. Ele diz que gostaria de morar lá durante alguns meses, mas que teme não ter permissão para retornar depois a Pequim. “Não sei se eles me deixariam voltar à minha cidade”, afirma o artista.

Na abertura da exposição na galeria de Ochs, Zhao distribuiu CDs no qual ele próprio canta músicas folclóricas chinesas de entonação triste. Mais uma vez, isso consiste em um símbolo. O fato de ser ouvido pode ajudar a protegê-lo. E ele sem dúvida necessitará de tal proteção.

“Eu não quero me tornar cauteloso”, explica Zhao Zhao.

Um comentário:

  1. Na China não é liberdade de expressão e há falta de direitos humanos e não só, tb animais. Sabe o que muitos deles fazem aos cães e gatos?

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